Sem ilusões não há desilusões. Sem metas traçadas não há caminhos fracassados. Sem ilusões e sem metas o Coriscos chegou ao fim. Ao fim de quase 500 posts e mais de 15 mil visitantes - a maior parte por engano, obviamente. Houve dias que superaram as cem visitas - preciosas para massajar a fragilidade do ego - e nunca dias de visita nenhuma. Mesmo quando a vida estava em pause. E o que existia era tão inócuo que não merecia sequer a abertura da janela. Os números, apesar de tudo, revelam pouco, quase nada deste ano e meio.
Os blogues são como as histórias de amor - quase sempre acabam, quase sempre quando há juras de eternidade. E como no amor, é bom enquanto dura. No início, a dependência intelectual encontra prazer no corpo inteiro. Depois, vai esmorecendo, obedecendo a intermitências. Por fim, a liberdade que antes se sentira transforma-se numa prisão. A liberdade de tudo poder dizer, sem condições e sem condicionantes, a vida que se sabe ou que julga saber-se, as opiniões que dispensam sustentabilidade, que podem só atirar-se para uma plataforma sem juíz como quem atira o coração do topo de um precipício. A liberdade de ceder à tentação, que só se percebe irresistível quando se experimenta, de escrever sobre o que antes se criticara: as declarações de amor, de amizade, os episódios que não interessam a ninguém senão a quem os protagoniza, os momentos de fraqueza, os nossos, os dos outros, a vampirização da vida alheia que se reconstrói com bacoco pretensiosismo literário, as saudades do passado e de quase tudo, os medos, os fracassos, as paixões efémeras, as obsessões, as dúvidas, as inquiteções, as férias, as boas, as menos boas. As viagens, o país. O mundo. A política da paróquia; a política da nação. As embirrações. A efervescência. E a partilha do que se lê, do que se ouve, em casa, em concertos memoráveis, em festivais, do que se vê no cinema, no teatro - os dramaturgos que nos enchem, os encenadores que nos desarmam -, nas galerias de arte, na rua, do que nos rende, dói, comove, exalta, exaspera, desespera, prende, o que achamos que podemos antecipar ou salvar, sempre com a secreta de esperança de inspirar alguém ou alguma coisa que não se sabe muito bem quem ou o que é. Nem sequer se sabe se o motor da motivação é o outro ou simplesmente o umbigo.
O Coriscos foi essa plataforma alternativa, livre, apaixonada para uma dessas muitas criaturas que não imagina a vida sem escrever. Foi laboratório de escrita, espécie de work in progress numa tentativa desesperada de escrever mais, de escrever melhor, de testar registos, de acelerar a escrita. De perpetuar o momento que não volta. Mas sempre ao sabor do vento. Um espaço de anarquia. Onde era possível nascer e morrer todos os dias. Até ser tão alternativo e livre e apaixonado que o prazer do corpo deixou de acompanhar o desejo intelectual. Transformou-se num espaço irreal, autista, num repositório de verdades dúbias, de vida que não existia senão para ser debitada. E da liberdade ficou só essa dependência vagamente insana. Como se fosse possível cumprir aqui o que não se cumpre, e devia, noutras paragens.
"Somos todos pretensiosos porque todos fingimos ser aquilo que tentamos cumprir". Não é axioma, mas vale a pensar nisto. O Coriscos nasceu em segredo e cresceu à vista de toda a gente. Ganhou amigos, insuspeitos e improváveis. E foi bom enquanto durou. Mas agora o vento sopra para parte incerta. E exige silêncio. Obrigada pela viagem.
Eu não visitava o "Coriscos" por engano. Cheguei aqui via "Delírios de um comboio Amarelo" e fui parando porque gostava do que lia. E nem sou grande fã de blogues. É uma pena ter terminado!
ResponderEliminarRetracta-te imediatamente. Não acabes com isto. Venho cá todos os dias para a minha dose diária de coriscos e temo seriamente que, sem eles, entre em overload de raios. Vá lá, continua a bem da sanidade dos teus amigos.
ResponderEliminarinjusto! (birra!)
ResponderEliminarGo real slow
ResponderEliminarYou like it more and more
Take it as it comes
Specialize in havin' fun.
Boa sorte, ate à proxima
Foi mentirinha de 1 de Abril...
ResponderEliminarfico muito muito muito triste
ResponderEliminarEu era um leitor assíduo dos textos e espero continuar a ser!
ResponderEliminarGosta do teu saudosismo, da forma implacável como enfrentas políticos (nem sempre concordei!), da forma simples como escreves.
Continuação de boas escritas, aqui ou noutro sitio...
As decisões são sempre assim. Fortes, Seguras, Tristes, Saudosas. Perco, também AQUI, um pouco de MIM.
ResponderEliminarDeixo-te Eugénio, para (re)pensares em TI:
Levar-te à boca,
beber a água
mais funda do teu ser -
se a luz é tanta,
como se pode morrer?
Gosto de te conhecer, também e muito, aqui.
A ressaca já dura a demasiado tempo. Espero nova dose, aqui ou noutro sítio. Avisa (não é pedido, é intimição, que os leitores também têm direitos)
ResponderEliminarFechado?, curioso ... cheguei cá hoje. Demasiado tarde. Mas ainda tenho tempo para descobrir alguns textos.
ResponderEliminarEu visito o Coriscos e não é por engano é mesmo assertivamente!
ResponderEliminarAté breve!
Aldina
saudades de até sempre...
ResponderEliminar