Em Junho de 2003, Pedro Burmester, mais visionário do que o próprio haveria de ter imaginado, afirmou ao JN que a Câmara Municipal do Porto estava "mais preocupada com questões, que também têm que ser resolvidas, mas que reduzem o Porto a uma aldeia". Três anos e meio depois, o resultado está amplamente à vista. Impera o deserto e o silêncio. E pior: a total ausência de luz ao fundo do túnel. Existe uma Oposição, porventura demasiado civilizada e decente, mas cujo resultado prático é tragicamente ineficaz. E um bando imenso de pessoas e estruturas que não cessam de pedir desculpa por existir. O resto da população não faz a mais pequena ideia das coisas a que tem direito. Vai ficando para trás e não percebe. E, infelizmente, também não parece haver alguém disposto a acordá-la.
Na sequência da entrevista, o pianista e director artístico da Casa da Música foi insultado por Rui Rio, que o acusou de não ter respeito pela autarquia, exigindo a sua demissão. Alguém, nos piores pesadelos, imaginou que a falta de tacto e de tudo do autarca, quando confrontado com críticas, pudesse verter sobre todos os quadrantes da esfera cultural da cidade? Que pudesse realmente comportar-se como o rapaz da escola que agarra a bola e grita: "Se eu não brinco ninguém brinca!" quando não o deixam jogar na posição pretendida?! Na altura, Jorge Sampaio, então Presidente da República, saiu, e muitíssimo bem, em defesa de Burmester. Por que raio agora não há ninguém de Belém ou do gabinete do primeiro-Ministro ou do Ministério da Cultura capaz de erguer-se e dizer "BASTA"?! Agora somos todos um bocadinho "burmesters", todos inimigos do rei Rio.
Pedro Burmester, que inicialmente parecia personificar o único ódio de estimação do homem do PSD, saiu da Casa da Música, hibernou durante dois anos e voltou. Rui Rio acabou o primeiro mandato, que iniciou na ressaca do Porto 2001, e foi eleito há um ano para um segundo round com maioria absoluta. Pelo caminho teve três vereadores da Cultura: Marcelo Mendes Pinto, António Sousa Lemos e agora Fernando Almeida - e sim, sinto que cumpro uma espécie de serviço público ao divulgar o nome dos dois últimos senhores. Aliás, aproveito a boleia para dizer que o actual vereador, que nunca ninguém ouviu falar, tem um assessor de imprensa (vá lá saber-se para quê): Rui Gonçalves.
Vale a pena reparar na espiral de Rui Rio: Em 2002 impôs um corte no pelouro da Cultura de 40% - a Rádio Festival nunca foi beliscada; no ano seguinte subiu a fasquia para 60%. O então vereador, Marcelo Mendes Pinto (CDS-PP), foi obrigado a cortar a direito nas colectividades, associações recreativas, desportivas, de solidariedade social e outras, nos grupos de dança e teatro; poupou apenas cinco festivais da cidade. A vida poderia até ter-lhe corrido menos mal, não fosse ter-se dado o caso de ter decidido defender publicamente Pedro Burmester. Ainda conseguiu resistir às ameaças de que no caso de não aceitar retratar-se seria afastado do Executivo, mas na primeira oportunidade saiu, pelo próprio pé, para a Assembleia da República. (Dois pontos para a loucura de Rio: Não aceita críticas de fora - Burmester; nem de dentro - Mendes Pinto).
Ninguém imaginava que pudesse piorar. E, no entanto, piorou mais do que é possível traduzir em palavras. Rui Rio que no calor da vitória das últimas eleições autárquicas prometeu redimir-se da reconhecida falta de atenção prestada à cultura fez tudo ao contrário: primeiro, desfez-se das preocupações que alegadamente lhe daria o Teatro Rivoli; depois inventou uma cláusula, segundo a qual as entidades que o criticassem não teriam direito a subsídio; finalmente, quando percebeu que os "subsídiodependentes" têm mais dignidade do que ele cortou os subsídios a toda a gente. É o rapaz da escola: "Se eu não brinco ninguém brinca!"
(Não sou do Porto; não voto no Porto. Estacionei na cidade há menos de seis anos e, provavelmente, vou embora antes de ter o prazer de ver Rui Rio sair da Câmara. Mas nunca uma situação pública me deixou tão envergonhada. Tão verdadeiramente envergonhada!!! E com tanta pena de todos quantos, na sua imensa ignorância, elegeram para presidente um homem das cavernas, não percebendo que estavam a suicidar-se. Porque não há mesmo nada pior - fica mais uma vez provado - do que o acesso condicionado ao conhecimento.)
Cara Helena
ResponderEliminarParabéns por este texto
No seu site, o RR (ou o cão que ladra por ele) torna a atirar aos jornais e jornalistas...
Já agora porém, muito gostaria de saber, qual a relação entre uma reunião (não muito) discreta aqui há meses, no Porto, de um ministro chamado Costa, com um autarca chamado Rio, ede um túnel chamado "Ceuta", um pianista chamado pedro e um problema com o metro, frente a um hospital e do qual ninguém mais ouviu falar...
A Helena sabe algo?
Será que pode investigar?
AM
Através da leitura de alguns blogues cheguei até ti. Há umas semanas vi-te na televisão, de passagem, de bloco em punho, junto do Rivoli. Sobressaltadas as sobrancelhas, pensei: "no Porto? E nunca nos cruzámos?". No dia seguinte, desconfiado, fui ver ao site do dito e lá estava a tua assinatura. Não fazia ideia. Às vezes noto com muita acuidade o quão distraído sou.
ResponderEliminarBeijinho.
Ah! Gosto mt do q escreves.
Guilherme