terça-feira, março 14, 2006

Na solidão dos campos de algodão

Raras vezes uma criação do Teatro Plástico é perra. Privilegiando acima de tudo a palavra, Francisco Alves é imbatível na escolha dos dramaturgos: Harold Pinter, Nobel político; Eric-Emmanuel Schmitt, conceituado autor francês contemporâneo; Denis Lachaud, outro francês alvoroçado; Paul Selig, norte-americano avesso ao politicamente correcto; Neil Labute, dono de retratos sombrios sobre a modernidade. E agora, pela segunda vez, Bernard-Marie Koltès, autor por excelência do teatro de ver. Mas sobretudo ouvir.
“Na solidão dos campos de algodão” é a batalha verbal entre dois vultos. Dois homens iguais a esgrimir argumentos para afirmar as suas diferenças, contradições, desejos, a sua prisão, ali materializada em paredes de betão e sem adornos. O cenário é um parque de estacionamento, só. A encenação repete a estratégia de fugir aos palcos convencionais e eleva-a, desmultiplicando soluções criativas. O espectador é um voyeur que assiste de forma excepcionalmente consentida a uma transacção que não conhece. Ouve a conversa através do rádio do carro – um diálogo filosófico, poético – entre o dealer e o cliente, ambos de expressão corporal quase imóvel. Os figurinos acompanham a escuridão das personagens. A luz, esquálida, é perfeita na denúncia do que parece proibido. O fim sente-se; não é anunciado. De repente, tudo ali parece óbvio. Mas, definitivamente, não é.

2 comentários:

  1. Tenho uma amiga que diz que só o título é bom, quanto ao resto...
    Como não conheço, não opino.

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  2. sua amiga nao gosta de teatro contemporaneo e nao entende a diferença entre a questao do gosto e o belo. indique a ela ler Kant, primeiro, Ryngaert depois,

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