Uma entrevista pode não ser suficiente para denunciar a qualidade de um autarca, mas é sempre reveladora do seu carácter, da sua forma de estar e encarar a vida. Sobretudo em televisão, porque o meio em causa, além das palavras, mostra os silêncios, as expressões faciais, o encolher de ombros...
Rui Rio afirmou hoje perante as câmaras do Porto Canal, numa conversa conduzida por Rui Baptista, que perguntas sobre o que está a ler, qual a última vez que foi ao teatro ou ao cinema são "difamatórias"!!! Tão difamatórias que o presidente da Câmara do Porto entendeu que não devia responder. E quando o jornalista lhe recordou que no mandato anterior o havia visto numa ópera, ele encolheu os ombros e torceu os lábios. Sublinhou: "Eu não sou uma presença constante em lado nenhum".
Confrontado com a cláusula - que já não está em vigor porque, pela via das dúvidas, os subsídios acabaram para toda a gente -, segundo a qual qualquer entidade subsidiada pela autarquia estaria inibida de a criticar, esclareceu: "Se eu tivesse feito isso devia ser tolinho da cabeça". Fica no ar a questão: será Rui Rio tolinho da cabeça?! É que a seguir, e depois de condenar os jornalistas, essas malévolas criaturas sempre dispostas a distorcer o teor das suas afirmações - e que, ainda por cima, parecem ter capacidade de influenciar as pessoas do seu próprio partido, uma vez que quase todos os elementos da concelhia manifestaram a sua renitência relativamente à dita cláusula -, sustentou que "quem recebe [recebia, no caso] subsídios pode criticar a Câmara e o seu presidente; não pode é assinar um protocolo e depois virar costas e dizer mal dele ou da instituição". Em que ficamos?
Revelação que Rui Rio se terá esquecido de partilhar durante a campanha eleitoral: "Já tinha germinado na minha cabeça, muito antes de ser presidente da Câmara, que haveria de acabar com os subsídios à cultura. Porque sempre me fez muita confusão essa coisa de toda a gente ir à autarquia pedir um subsídio. Pedem e acham que isso é um direito!", indignou-se. Por isso, a partir de agora, a cultura municipal tem, apenas, preocupações com três estruturas da cidade: Casa da Música (curiosa escolha, por conhecidíssimas razões, mas também porque a Câmara detém, apenas, 13% das acções); Fundação de Serralves (talvez a instituição mais subsidiada a nível nacional); e o Coliseu. E desabafou: "Ó Rui Baptista, não vamos falar só de cultura, pois não?"
Não. Mas antes de mudar de assunto, ainda ficámos a saber que a queixa-crime contra o grupo de pessoas que ocupou, em Outubro, e durante quatro dias, o Teatro Rivoli, foi apresentada pela maioria PSD/CDS-PP em nome de TODO o Executivo, ou seja, também em nome dos elementos da Oposição, porque, explicou "não estava à espera que fosse ligar aos 13 vereadores, pois não? Já viu, se uns gatunos forem assaltar os Paços do Concelho e eu os apanhar, não posso perder tempo a ligar a toda a gente para saber se posso chamar a polícia, não é?"
Ficámos ainda a saber que Eduardo Prado Coelho é uma das "doze pessoas" - assim mesmo, bem contadinhas -, que escreve mal dele nos jornais. No caso do cronista do Público, justificou, "porque deixou de lhe dar dinheiro". O professor e ensaísta foi comissário, a convite de Isabel Alves Costa, do ciclo Capicua, uma iniciativa promovida pela Culturporto, que abordava várias vertentes culturais: teatro, conferências, novo circo, etc. E, tanto quanto me lembro, levou o Porto para os jornais. Lembro-me concretamente da crítica à peça "Valparaíso” de Don DeLillo, encenada por Nuno Cardoso em 2002, sobre quem disse ser o mais promissor encenador da contemporaneidade.
A conversa entre os Ruis, Baptista e Rio, galopou ainda pela empresa do Metro, pela requalificação da Baixa e pelos bairros sociais. Aliás, reforçou o presidente da Câmara, "a poupança brutal da Cultura será canalizada para o que eu sempre disse que seria a minha prioridade: a coesão social". Fiquei a pensar nisto: fiquei a pensar no Bairro do Leal, onde vou de vez em quando, e nas condições em que vivem aquelas pessoas; fiquei a pensar no que sempre me dizem os taxistas quando recusam terminantemente ir ao Bairro S. João de Deus... fiquei a pensar no que quer dizer coesão social.... talvez, baralhar e voltar a dar. Mas sempre de olhos fechados.
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