Nunca chorei numa peça de teatro. Nunca achei que a dor, mesmo enquanto pura obra de arte, pudesse parecer tão bela. Até ontem. "Plasticina", escrita pelo dramaturgo russo Vassili Sigarev e encenada por Nuno Cardoso (em cena no Teatro Carlos Alberto, no Porto, até 2 de Abril) entra nas veias como um soro letal. Nem vale a pena dizer que é um murro gélido no estômago, porque as peças do Nuno são sempre assim: infinitamente maiores do que texto, mesmo quando o texto é bom. São criações que provocam ressaca. E deixam sempre aquela sensação de que desta vez, sim, desta vez é que ele não irá superar-se. E ele, o encenador, supera-se sempre. Sempre.
Plasticina é o pior do mundo inteiro dentro de cinco metros quadrados. E, no entanto, parece estar dentro de uma caixinha de música. Só que dentro da caixinha parece existir um elevador que nos transporta para vários andares onde todos os botões têm a mesma sigla: DOR. A dor de quem não tem direito a manifestá-la. A dor de quem já se habituou a sofrer sem reclamar. A dor de quem parece imune à dor física, tal é a dor, a outra, mais funda, que não se explica por palavras. A dor de quem apara as dores todas dos outros. A dor de já ter nascido excluído.
Maksim, o protagonista, é isso. Um rapaz desenhado para ter nascido na era pós-comunista, mas que visto daqui, do ano 2006, é só um rapaz igual a todos os rapazes de qualquer bairro social desgraçado. Um rapaz que fica sempre sozinho, no fim, quando todos vão dormir. Um rapaz que já nasceu sozinho. Um rapaz que a dor cegou.
Não é só a melhor peça de teatro que vi nos últimos meses; é das melhores que vi na vida toda. E para isso contribui também a extraordinária sintonia de sempre de Fernando Ribeiro, o cenógrago, com o encenador. E a música de Sérgio Delgado, uma agulha afiada apontada ao coração.
Olá Helena, fico mesmo contente por teres gostado. Tinha lá o meu dedo, a apontado a meias com o Fernando, não sei se reparaste...
ResponderEliminarbeijinho, miguel.