Vital Moreira acaba de ser anunciado como cabeça de lista do PS às eleições europeias de 7 de Junho. Luís Amado acaba de anunciar que sempre recusou ser cabeça de lista do PS às eleições europeias de 7 de Junho. Hmmmm... Ah, pois, foi "só uma hipótese dos jornalistas."
sábado, fevereiro 28, 2009
Lello não disse, mas pensou
O ex-secretário de Estado José Lello disse que o PS é um partido plural e que "não realiza purgas como a do BE ao seu vereador na Câmara de Lisboa". Eu podia apostar que o senhor Lello tinha as pernas da Joana Amaral Dias na cabeça.
Vitorino pergunta, mas nunca responde à chamada
"A pergunta que se coloca aos portugueses nas próximas eleições legislativas é saber se querem a estabilidade política governativa e uma maioria absoluta do PS", disse António Vitorino. Que moral poderá ter para perguntar o que quer que seja aos portugueses um homem que nunca respondeu à chamada quando foi preciso?
Vieira da Silva em "Quem quer ser milionário?"
O ministro da Segurança Social perguntou: "Quem está melhor preparado para responder a uma crise tão severa"? E respondeu: "José Sócrates". Esqueceu-se foi de dizer porquê. Mas também ninguém perguntou.
Jaime topo de Gama
Num discurso topo de gama (teve direito a mais sete minutos do que os outros delegados), o presidente da Assembleia da República disse que "a crise é um desafio", mas que não faz mal porque Sócrates "não vergará perante nenhuma dificuldade". Ele talvez não, os portugueses é que... enfim, coitados. Ou será que podemos dizer a um casal em ambos ficaram no desemprego: "Ó amigo, não se preocupe! Encare isto como um desafio!"
António José Inseguro
Primeiro António José Seguro diz: "Este congresso acontece num momento muito difícil para o país, com muitos portugueses em situação difícil, principalmente os de mais fracos recursos. Espera-se que do PS que saia deste congresso com uma prioridade comum, a de resolver esses problemas". E depois diz: "Muitas vezes os políticos caem na tentação de acreditar que só falando se resolvem os problemas. É preciso ter a humildade de saber ouvir as pessoas". Não é bonito?
Quem não dá ponto sem nó?
Ana Gomes disse que "o ataque político e pessoal" que tem sido feito a José Sócrates mostra que é "urgente retomar" o pacote de medidas proposto por João Cravinho para combater a corrupção. Lembram-se? É o pacote que o próprio Sócrates deixou cair! Genial! Os ataques a José Sócrates! Não, ela não o está a atacar! Ela é só inteligente!
Correia de Campos em campo
O ex-ministro da Saúde disse as medidas mais complicadas que o Governo de José Sócrates tomou nos primeiros dois anos do seu mandato já foram "absorvidas pelos portugueses". Será que se referia às suas próprias medidas? Ou à sua destituição?
Espinho sem Alegre
Manuel Alegre não está nem vai estar em Espinho.
Acho bem. Os socialistas medricas nem por isso.
Se Manuel Alegre não tivesse vergonha na cara iria ao Congresso.
Se o PS tivesse vergonha na cara não o teria convidado.
Acho bem. Os socialistas medricas nem por isso.
Se Manuel Alegre não tivesse vergonha na cara iria ao Congresso.
Se o PS tivesse vergonha na cara não o teria convidado.
Soundbyte do dia na categoria Cronemberg
"O retrato do país são as ratices. Nós sabemos quem são os parasitas, as ratices e as ratazanas", avisa Louçã.
E Louçã incha, incha....
Francisco Louçã agradeceu a "honra" de estar transformado no principal adversário do PS durante o congresso "do partido espojoso dos interesses dos mais poderosos". E, cheio de si, perguntou: "Quem imaginaria há 10 anos que este movimento teria força para se tornar no tema central do congresso do partido mais poderoso?". Ninguém para o Louçã, ninguém para o Louçã, lá lá lá! O pior é se de tanto inchar um dia rebenta!
Sound byte do dia na categoria Laranja Mecânica
"O primeiro-ministro tem uma personalidade política bipolar, que oscila entre o calimero e o pequeno tirano", disse Luís Campos Ferreira do PSD, à Lusa, a propósito do discurso de Sócrates na abertura do Congresso do PS.
Augusto Santos Silva em "The Wrestler"
"Temos de combater e vencer democraticamente todos aqueles que querem substituir o debate das ideias e o confronto entre propostas por operações de perseguição política pessoal, de calúnia e difamação", disse Santos Silva, o Mickey Rourke do PS.
Narciso em "Away from her"
"Talvez José Sócrates, estivesse apenas mal informado quando disse sábado, na abertura do congresso, que no PS não há excluídos, perseguidos e silenciados. Mas, e afirmo-o com pena, isso não corresponde à verdade. Obviamente eles existem no partido, e não são um ou dois nem 50 ou cem", disse Narciso Miranda, ausente da coisa.
sexta-feira, fevereiro 27, 2009
Pode haver jornalismo sem respeito pelos jornalistas?
O Público de ontem contava a história de Alfredo Mendes, jornalista do DN há mais de 30 anos despedido "num minuto e meio, vá lá, dois". O Público de hoje, tal como todos os jornais, dá conta do aumento de vendas dos cinco diários generalistas em 2008. No entanto, o Público é o único jornal que faz esta pertinente leitura: "A subida de vendas do JN, quase 10 mil exemplares, não impediu o processo de despedimento colectivo de 123 trabalhadores..."
Em nenhum jornal saiu a história de Denisa Sousa, jornalista do JN, em Braga, também ela dispensada nesta vaga. Não a conheço, mas não resisto a partilhar o mail que, por portas travessas, chegou à minha caixa de correio. Partilho-o porque vale mesmo-mesmo-mesmo a pena ler. E espero com isto não estar a cometer nenhuma inconfidência.
"O JN é um senhor de idade. Respeitável. Pode não ser iluminado, mas não é burro. Pode não ser cosmopolita, mas não é parolo. Mas querem eutanasiá-lo. Pô-lo num lar, primeiro. Depois entubá-lo. Dar-lhe a sopa à boca. E ele cheio de vida, grita que ainda é activo. Tem o seu lugar num País que será sempre rural, por menos que lhes reneguem as origens.
O velhote, idóneo e sábio, é um vínculo vivo à comunidade, num mundo onde a globalização faz (já) as suas vítimas. O JN tem um filho bastardo. É o Jninho. Tem a mania que as edições em papel vão acabar. Que é o multimédia, o multimédia, o multimédia. E as gentes do campo, que somos (quase, quase) nós todos, não querem saber de internetes. Contas feitas pelos médicos mais ilustres, apontam ainda ao JN uma longevidade de mais ou menos 50 anos. Na pior das hipóteses. O tempo em que as gentes do campo dispensarão o cheiro do papel, as notícias frescas, os dedos sujos de tinta, o fio de terra que os liga ao que é seu. Meio século até que esta geração morra.
Depois desta, não se sabe o que virá. "Olha o Zé apareceu nas notícias. Compra lá o JN ou vamos ao café lê-lo entre um copo de tinto e uma enguia de escabeche". Ou o velhote do Porto, de Viseu, de Coimbra, de Aveiro, de qualquer parte de Portugal, parcimonioso, que pega no seu companheiro das manhãs e ali fica a esfregá-lo. Os dois unidos, um todo papel, o outro todo olhos, enquanto o café se esconde garaganta abaixo. Há amor naquela união. Cumplicidade.
Mas o Jninho pensa-se mais visionário. Quer dinheiro fácil. Ele que até dança na discoteca de meias brancas. Escreve sms com muitos kapas e xis. Ele que se recusa a admitir que também é povo. "Português, eu não! Tenho uma mentalidade europeia".
Vai daí, o filho do JN, contrata uma equipa de enfermeiros e médicos para cuidar do cota. E, todos os dias, faz questão de lhe relembrar que não é grande equipa. Cuidar deste velho é privilégio, senhores. Conseguia arranjar melhor. Há mais quem queira. Não há insubstituíveis. Quem está mal, mude-se. E o velhote, contorcido, esconde a vitalidade, o nome, o orgulho de ser quem é do carinho que aquela equipa lhe empresta, a medo, já com pudor e vergonha.
O JN ainda quer voltar ao Norte. Às pessoas que o lêem e respeitam. Quer ser legado do Norte. Património, alma. De novos e velhos. Sedem o gajo, eu é que mando. Desde quando é que o velhote manda? Shiu, estás ultrapassado, pai! O Jninho, implacável, diz que as terras pequenas não interessam a ninguém. Nem o Zé, nem a Maria, nem a Serafina. Que se lixe Penedono, Freixo de Espada à Cinta e Póvoa de Lanhoso. Interessam os universitários e os adolescentes. Esses que nem lêem ainda. Que não honram nem sabem o Português. E os doutores, políticos, chefias, instituições. As grandes metrópoles, a massa crítica. O velho esvazia-se de desgosto, já não sabe o que é. Ele que não é visionário, mas é libertador. Que não ordena, mas opina. Ele que é um grande senhor do Norte.
O Jninho caga nisso. O futuro é o caminho. Quem rima sem saber, trai lai lai lai. Agarra-se ao monstro dos tempos, fica adicto dos recibos verdes. "Eu quero é letras, senhores. Produzam em série. Um dia, hei-de montar uma fábrica de letras, vocês vão ver. Uma pessoa atira-as para um contentor e sai tudo escrito. E depois rua, com todos vocês. Rua, que vocês são chatos, exigentes, querem sempre mais, falam em direitos. Estou farto, farto de vos aturar. Contentem-se! Trabalhem! Ainda vos baixo o preço da linha!".
Aquele ali na prateleira? Deitem-no fora. Está velho. Aquele ali, na gaveta? Quantas peças escreveu esta temporada? Arrumem com ele, se for para Tribunal desiste. E o fotógrafo que não atende telefones? Tirem-mo da frente, quero lá saber que tenha 20 filhos e três mulheres para sustentar. A equipa, quase em hipnose colectiva, questiona o próprio talento. Não deixa o JN morrer, mas cuida dele, já automaticamente. Sem paixão. Mudar fralda, pôr garrafa de oxigénio, pomada para as chagas, dar colherinhas de Cérelac, um beijinho perdido e tal.
Um dia, o Jninho caiu da cadeira. Ele e todos os Jninhos parecidos. A equipa, no mesmo silêncio do costume, abre portadas e janelas à volta do moribundo. Vai-se o cheiro a éter, a mofo, a caruncho das paredes. Alguém diz, ainda a medo : Deixem o Homem respirar, deixem o Homem respirar, deixem o Homem respirar".
O velhote, idóneo e sábio, é um vínculo vivo à comunidade, num mundo onde a globalização faz (já) as suas vítimas. O JN tem um filho bastardo. É o Jninho. Tem a mania que as edições em papel vão acabar. Que é o multimédia, o multimédia, o multimédia. E as gentes do campo, que somos (quase, quase) nós todos, não querem saber de internetes. Contas feitas pelos médicos mais ilustres, apontam ainda ao JN uma longevidade de mais ou menos 50 anos. Na pior das hipóteses. O tempo em que as gentes do campo dispensarão o cheiro do papel, as notícias frescas, os dedos sujos de tinta, o fio de terra que os liga ao que é seu. Meio século até que esta geração morra.
Depois desta, não se sabe o que virá. "Olha o Zé apareceu nas notícias. Compra lá o JN ou vamos ao café lê-lo entre um copo de tinto e uma enguia de escabeche". Ou o velhote do Porto, de Viseu, de Coimbra, de Aveiro, de qualquer parte de Portugal, parcimonioso, que pega no seu companheiro das manhãs e ali fica a esfregá-lo. Os dois unidos, um todo papel, o outro todo olhos, enquanto o café se esconde garaganta abaixo. Há amor naquela união. Cumplicidade.
Mas o Jninho pensa-se mais visionário. Quer dinheiro fácil. Ele que até dança na discoteca de meias brancas. Escreve sms com muitos kapas e xis. Ele que se recusa a admitir que também é povo. "Português, eu não! Tenho uma mentalidade europeia".
Vai daí, o filho do JN, contrata uma equipa de enfermeiros e médicos para cuidar do cota. E, todos os dias, faz questão de lhe relembrar que não é grande equipa. Cuidar deste velho é privilégio, senhores. Conseguia arranjar melhor. Há mais quem queira. Não há insubstituíveis. Quem está mal, mude-se. E o velhote, contorcido, esconde a vitalidade, o nome, o orgulho de ser quem é do carinho que aquela equipa lhe empresta, a medo, já com pudor e vergonha.
O JN ainda quer voltar ao Norte. Às pessoas que o lêem e respeitam. Quer ser legado do Norte. Património, alma. De novos e velhos. Sedem o gajo, eu é que mando. Desde quando é que o velhote manda? Shiu, estás ultrapassado, pai! O Jninho, implacável, diz que as terras pequenas não interessam a ninguém. Nem o Zé, nem a Maria, nem a Serafina. Que se lixe Penedono, Freixo de Espada à Cinta e Póvoa de Lanhoso. Interessam os universitários e os adolescentes. Esses que nem lêem ainda. Que não honram nem sabem o Português. E os doutores, políticos, chefias, instituições. As grandes metrópoles, a massa crítica. O velho esvazia-se de desgosto, já não sabe o que é. Ele que não é visionário, mas é libertador. Que não ordena, mas opina. Ele que é um grande senhor do Norte.
O Jninho caga nisso. O futuro é o caminho. Quem rima sem saber, trai lai lai lai. Agarra-se ao monstro dos tempos, fica adicto dos recibos verdes. "Eu quero é letras, senhores. Produzam em série. Um dia, hei-de montar uma fábrica de letras, vocês vão ver. Uma pessoa atira-as para um contentor e sai tudo escrito. E depois rua, com todos vocês. Rua, que vocês são chatos, exigentes, querem sempre mais, falam em direitos. Estou farto, farto de vos aturar. Contentem-se! Trabalhem! Ainda vos baixo o preço da linha!".
Aquele ali na prateleira? Deitem-no fora. Está velho. Aquele ali, na gaveta? Quantas peças escreveu esta temporada? Arrumem com ele, se for para Tribunal desiste. E o fotógrafo que não atende telefones? Tirem-mo da frente, quero lá saber que tenha 20 filhos e três mulheres para sustentar. A equipa, quase em hipnose colectiva, questiona o próprio talento. Não deixa o JN morrer, mas cuida dele, já automaticamente. Sem paixão. Mudar fralda, pôr garrafa de oxigénio, pomada para as chagas, dar colherinhas de Cérelac, um beijinho perdido e tal.
Um dia, o Jninho caiu da cadeira. Ele e todos os Jninhos parecidos. A equipa, no mesmo silêncio do costume, abre portadas e janelas à volta do moribundo. Vai-se o cheiro a éter, a mofo, a caruncho das paredes. Alguém diz, ainda a medo : Deixem o Homem respirar, deixem o Homem respirar, deixem o Homem respirar".
Denisa Sousa
26/02/2009
Adeus a todos, foi verdadeiramente uma honra.
26/02/2009
Adeus a todos, foi verdadeiramente uma honra.
Santuários poéticos
O movimento começou em São Francisco e depressa se propagou por todos os Estados da América e pelo resto do mundo: de Viena, na Áustria, a Toronto, no Canadá. Hoje, quando vir uma bicicleta branca, fantasma branco, estacionada no centro de uma cidade qualquer, saiba que é uma homenagem a alguém, um ciclista, que morreu naquele local. São santuários poéticos. No Guardian.
'Life is not measured by the number of breaths we take, but by the moments that take our breath away'.
[Luís, meu querido amigo, obrigada.]
quinta-feira, fevereiro 26, 2009
Antony: versão artista plástico
Antony, esse extraordinário senhor que virá a Portugal em Maio, tem patente, neste momento, na Galeria Isis, em Londres, uma exposição auto-retrato. 13 obras - fotografias, pinturas, colagens - que serão a transposição para as artes plásticas - obsessão que diz ser "anterior à música" - daquela música única que nos dá. A fotografia (em cima) é a fotografia do próprio senhor Hegarty projectada em cima de uma fotografia da bisavó, que morreu com tuberculose. Depois, há ainda imagens de transsexuais, como ele, e de paisagens, tema de que se ocupa no último álbum, the crying light. A exposição segue, em Abril, para Paris. No El Pais.
Casamento perfeito
Tim Burton manifestou, na cerimónia de entrega de prémios do jornal inglês New Musical Express, o desejo de trabalhar com os Cure, de quem é fã "há muitos anos". "Vejo-me facilmente a colaborar com eles um destes dias", disse o cineasta à BBC. A música da banda de Robert Smith sempre foi, disse o cineasta, "uma grande inspiração" na sua carreira.
quarta-feira, fevereiro 25, 2009
Pós-modernices
Tenho três endereços de email: o da empresa, o gmail e o hotmail. Tenho um blogue e um microblogue (em branco, é certo, à espera de ver a sua real utilidade) chamado Twitter, uma conta no Hi5 e outra no Myspace. E tenho uma página A5 cheia de passwords. É suposto sentir-me feliz?
terça-feira, fevereiro 24, 2009
segunda-feira, fevereiro 23, 2009
Oscars
Slumdog Millionaire não era o meu preferido, mas de vez em quando, para variar um bocadinho, sabe bem ver um happy end ser reconhecido pela academia. Não venceu o Milk, o meu declaradíssimo eleito, mas venceu Sean Penn na pele política de Harvey. Justíssimo. Tão justo como Heath Ledger, inesquecível joker. Injusto foi o Oscar para Kate Winslet... mas quem me conhece sabe que eu iria sempre dizer isto. Como iria sempre dizer que a Penélope Cruz merece cada miligrama daquele prémio.
domingo, fevereiro 22, 2009
Gisberta: para os que não esqueceram
Simples tributo à vida de Gisberta
Sessão de Poesia
Leitura de " Indulgência Plenária", de Alberto Pimenta
Hoje, às 18h
tira-me daqui
tira-me daqui
tira-me daqui
não sei se foste tu que disseste
não mexeste os lábios
nem sei se poderás continuar
as tuas trocas os teus desejos
entre os habitantes dos mundos invisíveis
se assim fornem o Diabo impedirá
que o teu aroma nostálgico
continue a manifestar
a deusa
em todas as suas faces
humanas
(...)
sábado, fevereiro 21, 2009
Padre Mário de Oliveira
"Homossexualidade e incesto são conceitos tão incomparáveis, que só podiam mesmo surgir na cabeça de um eclesiástico celibatário".
Padre Mário de Oliveira, Aqui.
[Comentário sobre afirmação do padre Vaz Pinto, nos Prós e Contras, na RTP]
sexta-feira, fevereiro 20, 2009
Razões para dar o benefício da dúvida a Elisa Ferreira I
Deus sabe como acreditei em Francisco Assis quando ele apareceu, em 2005, vindo da Europa, a querer salvar o Porto, estava a cidade ainda longe de estar como está hoje: em coma profundo. Como repudiei as acusações que lhe faziam: a falta de imagem, como se um autarca devesse ter figura de top model; o excesso de bagagem cultural vertido numa entrevista à Visão, como se um autarca devesse ter berço de palha; a timidez, como se um autarca se medisse pelos beijos que dá. Como acreditei nas boas intenções, na boa vontade, nas ideias que prometiam, nos ideais sustentados, nos projectos que apresentou em campanha. Como acreditei naquela equipa escolhida, aparentemente, a dedo.
Francisco Assis é educado, honesto, genuíno, culto, inteligente, bondoso, arguto... e preguiçoso. É impossível não o prezar, não respeitar tudo o que o define como pessoa. Mas Deus sabe a desilusão que, como político, me causou. Os dossiers pouco estudados, as vitórias (o Bolhão, o Rivoli...) pouco potenciadas. A desistência. O regresso ao dourado exílio europeu que nunca teve coragem de abandonar, sequer no início da via sacra na Oposição. Assis não perdeu quando perdeu as eleições; perdeu quando prometeu ficar e não cumpriu. E como, apesar disso, lamento pela cidade que não lhe deu a oportunidade.
E agora, 2009, Elisa Ferreira, outra deputada vinda da Europa. Mulher de imagem polida, eventualmente mais ao gosto de quem gosta tanto de imagens, menos tímida, mais aguerrida. Para quem está a borrifar-se para esses parâmetros dados pelo embrulho ou pela forma, a candidatura dela, ainda que previsível, causa alguma hesitação. Estive indecisa, nos últimos meses, entre estar por ela ou contra ela. E aquela entrevista dada ao JN, em Janeiro, não acelerou a minha decisão. Fraquinha, fraquinha. Que o Porto é um grande desafio, que a vitória da Câmara é a coisa mais importante da vida dela (mas não ao ponto de largar o parlamento europeu se a não ganhar!), que faltam actores no Norte, blá blá blá, balelas!
O problema é que a vida de uma cidade é como a nossa vida pessoal: habituamo-nos à rotina e esquecemo-nos que podemos ser infinitamente mais felizes do que aquilo que somos. Que podemos fazer mais, ter mais, ser melhores. Que a vida não é uma coisa para se salvar; é coisa para se viver! Que a vida não é um happening sazonal com direito a tenda na praça e a passadeira vermelha. Autêntico circo de aldeia. É coisa para se viver todos os dias.
Com Rui Rio não estamos deitados numa maca num corredor de hospital a receber soro à espera da nossa vez; com Rui Rio temos uma doença terminal, vamos vivendo na sombra dos dias, com a lentidão dos condenados, inscritos numa lista de espera onde a nossa vez chegará, se chegar, quando já for tarde demais. E essa espera já nem dói porque andamos medicados, dopados, esquecidos de nós...
quinta-feira, fevereiro 19, 2009
Transa Atlântica
O título é muito bom, porque altamente sugestivo; a campanha melhor ainda, porque todo o séquito de Francisco José Viegas – e não é séquito pequeno – fala da coisa. E o texto da badana funciona na perfeição: “Esta é a história de uma mulher entre os 30 e os 40 anos com uma tendência natural para o abismo e para o pecado”. Homem de qualquer idade fica a babar-se na antecipação do exercício voyeurista; mulher de 31 pensa: “Ora aqui deve estar um livro desempoeirado”. Ainda por cima, a autora, Mónica Marques, jornalista (acho) portuguesa a viver no Brasil há uns anos, já tinha um blogue, Sushi Leblon, com alguma piada. A cereja aparece quando, por engano, alguém diz que o livro tem prefácio de Miguel Esteves Cardoso. O MEC será sempre selo de qualidade, mas não escreveu prefácio nenhum. Afinal, ele é só o único português que ela gostava que lesse Transa Atlântica. Como só descobri isso depois, um dia entrei na Fnac à maluca e lá gastei, de olhos fechados, 14.40 euros no livro. Dinheirinho que hei-de chorar enquanto me lembrar.
Não me lixem, este livro não é bom aqui nem na China. Nem, vá lá, no Brasil. E é pena, porque Mónica Marques, 39 anos, parece tão genuinamente humilde nas explicações que insiste em dar no desenrolar das quase 200 páginas (as conversas com o editor, os cortes do editor...), que quase se fica a gostar dela e com vontade de gostar da sua estreia literária. O que, no meu caso, foi completamente impossível. Numa entrevista à Ler, em Dezembro, ela explicou que “não ia conseguir ficcionar o tempo todo” e que “um primeiro livro tem muito de biográfico”. Pois, talvez. Mas se a maioria das vidas é mais interessante quando escrita, a dela, aparentemente, será bem mais empolgante apenas na sua vivência.
Escrever sobre orgasmos múltiplos, fétiches, vibradores cor-de-rosa, silicone, tesão, pau duro, foder à bruta, calcinhas de fio dental, pipis indecisos, maminhas, bundinhas (e todas os sinónimos de bundinha: cu, bunda, balaio, bumbum, blá, blá, blá...) ou, pelo menos, mencioná-los aqui e ali, não faz de um livro um livro arrojado. Hilda Hilst, só para referir uma brasileira (e bem sei que a comparação é injusta), consegue, com a mesma intenção desempoeirada, por-nos a ver tudo e a suar e a rir (e às vezes a chorar) sem ser tão vazia. (E sem ter que avisar a cada página que está a perder leitores.) Sem parecer um mágico que faz um truque e logo a seguir desata a explicá-lo para a eventualidade de alguém não o ter percebido. O problema de Mónica é que os seus passes de mágica nem sequer têm magia.
No mínimo, podia assumir-se ou reiventar-se como essa mulher avessa à normalidade, às convenções, como uma mulher à frente do seu tempo, o que faria, senão do livro, pelo menos dela uma personagem muito mais interessante. Mas, portuguesinha de sangue, ao mesmo tempo que discorre sobre práticas e aparelhos e posições e pecados de onde virá o prazer sexual, vem logo acautelar que nem tudo é biográfico: “Há coisas que gostaria muito de ter vivido, mas não posso e aí ficcionei porque sou casada, muito portuguesa e muito envergonahda”. No comments.
Finalmente, nessa mistura entre sexo e cultura, entre Lisboa e o Rio (não faltam as referências que todas as mulheres com medo de serem vistas como burras não resistem a fazer: na História, José Hermano Saraiva; na Filosofia, Kierkgaard; na Literatura, Ruben Fonseca, Flaubert, Saramago; na Música, Chico Buarque, Roberto Carlos, etc, etc), o livro poderia sobreviver na paisagem das duas costas do Atlântico e na forma cantada de contar dos brasileiros, e que ela tenta assimilar. Mas nem isso. Aliás, o primeiro capítulo lembra vagamente Luiz Ruffato (outra vez de outro campeonato, também sei), outro brasileiro.
Exercício de comparação. Diz ela, logo a abrir: “O Rio é uma cidade de passeadores de cachorros, pet shops, jornais deixados na porta logo de manhã, meninos pretos malabaristas nos sinais de trânsito cheirando cola, chauffers, lavadores de vidros, empregadas fardadas, mordomos de luvas brancas, empregadores de farmácias, drogarias, alfarrabistas, taxis imundos, livrarias, flamboyants, favelas.....”
A passagem nem é má. Mas agora leia-se Ruffato em "Eles eram muitos cavalos". Alto, de preferência:
“O Neon vaga veloz por sobre o asfalto irregular, ignorando ressaltos, lombadas, regos, buracos, saliências, costelas, seixos, negra nesga na noite negra, aprisionada, a música hipnótica, tum-tum tum-tum, rege o tronco que trança, o corpo, o carro, avançam, abduzem as luzes que luzem à esquerda e à direita...”
Não é prazer de mal dizer. É o que é. Quem escreve blogues com piada não tem que saber escrever um livro. Bom. Mas se ousa fazê-lo, por favor, não lhe chame romance.
Não me lixem, este livro não é bom aqui nem na China. Nem, vá lá, no Brasil. E é pena, porque Mónica Marques, 39 anos, parece tão genuinamente humilde nas explicações que insiste em dar no desenrolar das quase 200 páginas (as conversas com o editor, os cortes do editor...), que quase se fica a gostar dela e com vontade de gostar da sua estreia literária. O que, no meu caso, foi completamente impossível. Numa entrevista à Ler, em Dezembro, ela explicou que “não ia conseguir ficcionar o tempo todo” e que “um primeiro livro tem muito de biográfico”. Pois, talvez. Mas se a maioria das vidas é mais interessante quando escrita, a dela, aparentemente, será bem mais empolgante apenas na sua vivência.
Escrever sobre orgasmos múltiplos, fétiches, vibradores cor-de-rosa, silicone, tesão, pau duro, foder à bruta, calcinhas de fio dental, pipis indecisos, maminhas, bundinhas (e todas os sinónimos de bundinha: cu, bunda, balaio, bumbum, blá, blá, blá...) ou, pelo menos, mencioná-los aqui e ali, não faz de um livro um livro arrojado. Hilda Hilst, só para referir uma brasileira (e bem sei que a comparação é injusta), consegue, com a mesma intenção desempoeirada, por-nos a ver tudo e a suar e a rir (e às vezes a chorar) sem ser tão vazia. (E sem ter que avisar a cada página que está a perder leitores.) Sem parecer um mágico que faz um truque e logo a seguir desata a explicá-lo para a eventualidade de alguém não o ter percebido. O problema de Mónica é que os seus passes de mágica nem sequer têm magia.
No mínimo, podia assumir-se ou reiventar-se como essa mulher avessa à normalidade, às convenções, como uma mulher à frente do seu tempo, o que faria, senão do livro, pelo menos dela uma personagem muito mais interessante. Mas, portuguesinha de sangue, ao mesmo tempo que discorre sobre práticas e aparelhos e posições e pecados de onde virá o prazer sexual, vem logo acautelar que nem tudo é biográfico: “Há coisas que gostaria muito de ter vivido, mas não posso e aí ficcionei porque sou casada, muito portuguesa e muito envergonahda”. No comments.
Finalmente, nessa mistura entre sexo e cultura, entre Lisboa e o Rio (não faltam as referências que todas as mulheres com medo de serem vistas como burras não resistem a fazer: na História, José Hermano Saraiva; na Filosofia, Kierkgaard; na Literatura, Ruben Fonseca, Flaubert, Saramago; na Música, Chico Buarque, Roberto Carlos, etc, etc), o livro poderia sobreviver na paisagem das duas costas do Atlântico e na forma cantada de contar dos brasileiros, e que ela tenta assimilar. Mas nem isso. Aliás, o primeiro capítulo lembra vagamente Luiz Ruffato (outra vez de outro campeonato, também sei), outro brasileiro.
Exercício de comparação. Diz ela, logo a abrir: “O Rio é uma cidade de passeadores de cachorros, pet shops, jornais deixados na porta logo de manhã, meninos pretos malabaristas nos sinais de trânsito cheirando cola, chauffers, lavadores de vidros, empregadas fardadas, mordomos de luvas brancas, empregadores de farmácias, drogarias, alfarrabistas, taxis imundos, livrarias, flamboyants, favelas.....”
A passagem nem é má. Mas agora leia-se Ruffato em "Eles eram muitos cavalos". Alto, de preferência:
“O Neon vaga veloz por sobre o asfalto irregular, ignorando ressaltos, lombadas, regos, buracos, saliências, costelas, seixos, negra nesga na noite negra, aprisionada, a música hipnótica, tum-tum tum-tum, rege o tronco que trança, o corpo, o carro, avançam, abduzem as luzes que luzem à esquerda e à direita...”
Não é prazer de mal dizer. É o que é. Quem escreve blogues com piada não tem que saber escrever um livro. Bom. Mas se ousa fazê-lo, por favor, não lhe chame romance.
Portugal ao nível do terceiro mundo. Até na homossexualidade.
Não estivesse o Governo português a tentar propor o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, não estivesse essa proposta a incendiar a igreja e outros mentecaptos e a notícia de que países africanos e muçulmanos - e a Santa Sé, naturalmente - se opuseram, ontem, na ONU à menção do conceito de orientação sexual num projecto de declaração internacional sobre o racismo, que deverá ser adoptado em Abril na conferência de Genebra, pareceria uma coisa típica do terceiro mundo. Ou das culturas fundamentalistas.
Infelizmente, até na deficiente noção dos direitos de igualdade e liberdade para todos parecemos estar rigorosamente ao nível do terceiro mundo. Em muitos países africanos e muçulmanos, a homossexualidade é considerada delito. E cá?
Para que conste, a frase da polémica na ONU é esta: "Condenar todas as formas de discriminação e todas as outras formas de violações fundadas na orientação sexual". Deveria ficar como?
terça-feira, fevereiro 17, 2009
Não sabemos nada do amor. Dos outros.
Um dia conhecemos alguém capaz de nos ler nos olhos, nas mãos, nas cartas, na bola de cristal, no raio. E de todas as putativas perguntas do mundo, não resistimos à única a que era suposto ninguém senão nós saber responder. E, mesmo assim, só depois de mortos, retrospectivamente. E mesmo assim, não resistimos a fazê-la: É para sempre este amor? Não! Balde de água fria. Gelada. É aí que imediatamente se desvanece todo aquele não-precisar-de-ver-para-crer que ainda há segundos depositáramos naquela alma sábia na qual tropeçáramos sem procurar; é aí que desaparece todo o respeito que ainda há milésimos de segundo nutríamos por essa espécie de exercício visionário que os cépticos adoram maldizer.
Gosto conscientemente, e consciente do risco, de acreditar em quase tudo o que me dizem - sabe-me bem; desconfiar de tudo e todos dá demasiado trabalho e é muito menos produtivo do que julga quem julga que não desconfiar é preguiça. O problema é que estou preparada, a qualquer momento, para que me digam que o meu nome faz parte do despedimento colectivo da empresa; que a euribor vai enlouquecer e obrigar-me a vender a casa; que vou espatifar-me de mota porque tenciono conduzi-la sem carta; que o amigo A ou B vai desiludir-me ou desapontar ou trair; por absurdo, que vai ser-me diagnosticada uma doença qualquer que não terei como sanar... Mas não estou preparada para que me digam que o Amor da minha vida não é o amor da minha vida.
Toda a gente quer o Amor. De preferência, para sempre. Mesmo aqueles que nunca amaram ou não estão interessados em amar de forma definitiva agora, desejam um dia encontrar o amor da sua vida. Qualquer pessoa confrontada com a possibilidade de ter todas as mulheres (ou homens) do mundo em todos os dias da vida, ou apenas um homem (ou uma mulher) na sua vida inteira, optaria pela segunda hipótese. Aposto. Não conheço ninguém que pense: "O sonho da minha vida é nunca encontrar o amor".
Por estes dias, a propósito de S. Valentim, a imprensa fartou-se de nos bombardear com teorias sobre o amor, a sua durabilidade ou impossibilidade, as suas fórmulas de sucesso ou falta dele. Fiquei, como fico sempre quando o assunto é esse, impressionada com as teorias que alguns especialistas debitam de forma tão científica. Como se o amor pudesse e efectivamente tivesse sido testado em ratinhos de laboratório. Ou como se fosse uma democracia em que a maioria é que ganha. Qualquer teoria é ainda mais curiosa porque o amor parece sempre condenado à partida: se dura é porque seguramente já não é amor e ali se desenvolveu uma supostamente confortável habituação, uma confusão de conceitos que mistura companheirismo e amizade com os tórridos sentimentos iniciais; se não dura é porque não há amor sem paixão e a paixão, garantem, é efémera, incompatível com relações que não acabam nunca.
Sem surpresa, para Júlio Machado Vaz, está tudo mais ou menos ligado ao sexo. "A sexualidade tornou-se uma razão respeitável para nos sentirmos bem ou não numa relação. Há as que terminam porque não há entendimento sexual", disse ao Expresso. Mais radical, o psiquiatra brasileiro Flávio Gikovate defende que o melhor mesmo é não nos chatearmos muito com o outro. "É possível ser feliz sozinho. As relações vão de mal a pior e, se não houver uma revisão geral, um tsunami de frustrações amorosas vai engolir toda a gente", disse à Visão. E por aí fora...
A verdade é que não sabemos nada do amor. Dos outros.
segunda-feira, fevereiro 16, 2009
Hunger
De repente, lembro-me do Irréversible, o filme que o realizador argentino Gaspar Noé estreou em 2002. E lembro-me do aviso na bilheteira: "Este filme contém imagens chocantes. Não devolvemos o dinheiro se desistir a meio". E lembro-me de ver muita gente a não aguentar as imagens cruas daquela vingança, daquela violação, muita gente a desistir logo no início. Não subestimo a violência, aquela, mas resisti.
Passaram muitos anos ou os anos suficientes para que tenha deixado de ver cinema no Cinema. Por isso, não sei se Hunger, o filme com que o inglês Steve McQueen decidiu abalroar-nos no ano passado, motivou, ou não, o emagrecimento repentino das salas (no DocLisboa, não conta). Mas sei que, entre um e outro, estive muito mais perto do ataque cardíaco neste.
Vi quase metade do filme de olhos fechados. E de olhos fechados vi tudo o que não queria ver. E sobretudo tudo o que o realizador nem precisou mostrar - é aí, também aí, que o filme é absolutamente incrível. A Irlanda do Norte, apesar de não haver uma única imagem do país ou sequer exterior à prisão de Maze, em Belfast; a dama de ferro Margareth Tatcher e sua insistência no castigo de quem não queria manter essa parte da Irlanda anexada ao Reino Unido; as motivações do IRA pela igualdade... Consegui até ver, tão longe dali, tão perto no que de pior pode existir na Humanidade, a prisão de Guantanamo.
Hunger é sobre a greve de fome que os militantes dos IRA detidos encetam na prisão para reclamar os seus direitos. É, com aguda precisão, sobre os sessenta e tal dias de Bobby Sands, membro do INLA, Irish National Liberation Army, em contagem decrescente até à morte. É escuro e triste e violento até dizer "basta". Mas é, ao mesmo tempo, uma extraordinária obra de arte. Terrível, mas extraordinária.
domingo, fevereiro 15, 2009
Joana Vasconcelos
"Irrita-me a pequenez portuguesa. A sensação de que não se deve partilhar e de que temos connosco a verdade: as nossas opiniões é que contam; as outras não. A forma como o mundo olha para as coisas não é especialmente importante. É essa a herança da ditadura: o "orgulhosamente sós". E é contra isso que luto todos os dias."
Joana Vasconcelos, artista plástica, aqui
Sessão de poesia no Gato Vadio, às 18h
Saber viver é vender a alma ao diabo
Gosto dos que não sabem viver,
dos que se esquecem de comer a sopa
(Allez-vous bientôt manger votre soupe,
s... b... de marchand de nuages?»)
e embarcam na primeira nuvem
para um reino sem pressa e sem dever.
Gosto dos que sonham enquanto o leite sobe,
transborda e escorre, já rio no chão,
e gosto de quem lhes segue o sonho
e lhes margina o rio com árvores de papel.
Gosto de Ofélia ao sabor da corrente.
Contigo é que me entendo,
piquena que te matas por amor
a cada novo e infeliz amor
e um dia morres mesmo
em «grande parva, que ele há tanto homem!»
(...)
Alexandre O'Neill
sábado, fevereiro 14, 2009
Seja lá quem for São Valentim...
Por mais que a vida nos agarre assim
Nos troque planos sem sequer pedir
Sem perguntar a que é que tem direito
Sem lhe importar o que nos faz sentir
Eu sei que ainda somos imortais
Se nos olhamos tão fundo de frente
Se o meu caminho for para onde vais
A encher de luz os meus lugares ausentes
É que eu quero-te tanto
Não saberia não te ter
É que eu quero-te tanto
É sempre mais do que eu te sei dizer
Mil vezes mais do que eu te sei dizer
Por mais que a vida nos agarre assim
Nos dê em troca do que nos roubou
Às vezes fogo e mar, loucura e chão
Às vezes só a cinza do que sobrou
Eu sei que ainda somos muito mais...
Mafalda Veiga
quarta-feira, fevereiro 11, 2009
Mr. Sócrates Milk
As pessoas não gostam dos políticos por eles serem políticos. As pessoas não gostam dos políticos porque não querem que eles sejam pessoas. São capazes de varrer da memória a corrupção, a incompetência, a insensibilidade, mas não perdoam um pingo de humanidade. José Sócrates terá mil e um defeitos, mil e uma falhas, mas no sábado passado, em Coimbra, esteve bem. Melhor do que o país merece. Sugeriu, e bem, e muito bem, que as pessoas fossem ao cinema ver o filme de Gus Van Sant, Milk, sobre a luta dos homossexuais pelos seus direitos. Mas meio país ficou escandalizado. Deve ser o mesmo país que acha que só tem direito a casar o homem que ama uma mulher e vice-versa. Mesmo que depois a espanque ou traia. Como se o amor fosse privilégio só de alguns. Deve ser o mesmo país que corre para essa igreja que proclama que nos ergamos em nome dos verdadeiros valores cristãos e nos recusemos a votar em que ergue bandeiras de pecado. Quando vi o filme pareceu-me estranho que em 30 anos o mundo tivesse mudado tão pouco. Fatalmente, Portugal mudou menos ainda.
terça-feira, fevereiro 10, 2009
The Reader (Oops! vagamente spoiler, pelos vistos...)
Pode o analfabetismo doer mais do que matar ou deixar morrer (é a mesma coisa) milhares de pessoas inocentes? Stephen Daldry, o realizador de The Reader não diz - mas diz claramente que é mais humilhante. Aliás, o filme - um dos mais impressionantes na corrida aos Oscars - dá muito poucas respostas. Em compensação, deixa muitas perguntas soltas.
O que parece ser apenas, e já não seria pouco, uma intrigante história de amor entre um rapaz de 16 anos e uma mulher de 38, é afinal um manual inteiro sobre a fronteira entre o que está certo ou errado, e sobre o fino fio de cabelo que nos faz pender para um lado ou para o outro. Às vezes, sem querer. Sem saber. Mesmo quando o que é errado parece tão óbvio quanto guardar um campo de concentração nazi.
P.S.: Já aqui disse que não gosto da Kate Winslet. E realmente não gosto. Neste filme, ela está bem melhor do que em Revolutionary Road. Mesmo assim, a exibição de um peito escandalosamente flácido era escusada.
segunda-feira, fevereiro 09, 2009
Amor antes da maioridade V
Querida Wookie,
Aproveito este instante para te chamar Amor.
Sei que é a última vez e que deverei aprender a viver com a minha solidão.
Acabámos miseráveis papéis de um caixote do lixo,
nada de muito eterno.
Não chegou a salvação para nós.
Aprendi contigo
A dedicação, a perseverança,
o amor impossível, o sublime amor eterno.
Sei que tudo o que digo agora já não fará sentido para ti,
Mas espero que entendas que te amo, que te amei sempre,
Mesmo quando te traí.
No fundo, nunca te traí. E sei que sabes isso.
O problema é que achava que não havia lugar para nós,
esse sítio de que falavas,
onde podiamos ser apenas nós e o nosso amor.
Isso revolta-me agora.
Preferi procurar um lugar terreno,
mas sei agora que esse também não existe.
O único lugar que existe está no meu coração,
no meu ideal, no meu interior.
Como havia de saber exteriorizá-lo?
Quiseste mostrar o teu amor por mim,
o teu medo de viver sem mim.
E eu provoquei-te, sacrifiquei-te.
E perdi-te.
Um final desastroso, caótico, feio.
Morte! Morte! Morte!
Não fiz nada para parar a roda da destruição,
Fui passivo no que me era impossível remediar,
Culpado, irresponsável.
Mesmo assim, nunca te quis magoar.
Aprendi contigo a eternidade,
a continuidade dos inícios e dos fins.
E numa partida de xadrez,
na luta pela conservação do ego, em todas as batalhas,
tudo o que fiz foi declarar-te amor.
Amor! Amor! Amor!
Estás livre agora. Corre.
C.A.
Aproveito este instante para te chamar Amor.
Sei que é a última vez e que deverei aprender a viver com a minha solidão.
Acabámos miseráveis papéis de um caixote do lixo,
nada de muito eterno.
Não chegou a salvação para nós.
Aprendi contigo
A dedicação, a perseverança,
o amor impossível, o sublime amor eterno.
Sei que tudo o que digo agora já não fará sentido para ti,
Mas espero que entendas que te amo, que te amei sempre,
Mesmo quando te traí.
No fundo, nunca te traí. E sei que sabes isso.
O problema é que achava que não havia lugar para nós,
esse sítio de que falavas,
onde podiamos ser apenas nós e o nosso amor.
Isso revolta-me agora.
Preferi procurar um lugar terreno,
mas sei agora que esse também não existe.
O único lugar que existe está no meu coração,
no meu ideal, no meu interior.
Como havia de saber exteriorizá-lo?
Quiseste mostrar o teu amor por mim,
o teu medo de viver sem mim.
E eu provoquei-te, sacrifiquei-te.
E perdi-te.
Um final desastroso, caótico, feio.
Morte! Morte! Morte!
Não fiz nada para parar a roda da destruição,
Fui passivo no que me era impossível remediar,
Culpado, irresponsável.
Mesmo assim, nunca te quis magoar.
Aprendi contigo a eternidade,
a continuidade dos inícios e dos fins.
E numa partida de xadrez,
na luta pela conservação do ego, em todas as batalhas,
tudo o que fiz foi declarar-te amor.
Amor! Amor! Amor!
Estás livre agora. Corre.
C.A.
domingo, fevereiro 08, 2009
sábado, fevereiro 07, 2009
Quanto vale uma assinatura?
O nosso nome é o nosso património. Dias Loureiro não prescinde do património, que é farto, mas aparentemente prescinde do nome. Fosse isso possível...
O homem que, desde o início do ano, anda a apregoar que não assinou nada, não viu nada, não sabe de nada, só desconfiou, vá lá saber-se porquê, da gestão do BPN, e até avisou e tudo, tão bonzinho que ele é, o senhor António Marta, ex-governador do Banco de Portugal... Esse homem, respeitável ministro de Cavaco Silva, actual conselheiro de Estado, afinal, tinha a assinatura em tudo.
Hoje, diz o Expresso, o senhor Dias Loureiro foi confrontado com os documentos que provam que o desmoronamento do Banco Português de Negócios está impregnado das suas impressões digitais... Ele diz que não assinou nada, depois que afinal assinou, mas foi para atenuar os prejuízos... Ninguém lhe ensinou que mentir é coisa feia?
O "livro negro" de Mário Nogueira
Alguém podia fazer um favor ao país e deportar o senhor da Fenprof para um lugar seguro que assegure um não retorno. Já toda a gente percebeu - à excepção do próprio e do universo docente - que a única coisa que o incomoda no processo de avaliação do desempenho de professores é o facto dele existir.
Depois de tudo o que já correu, sermos obrigados, nesta altura, a ouvi-lo dizer, com o maior descaramento possível, que daqui a umas semanas vai divulgar o "livro negro" das políticas educativas é de fazer perder a paciência a um morto!
sexta-feira, fevereiro 06, 2009
Do you want to marry me?
[By Annie Leibovitz]
Twenty-two films as director-star, among them two that received Oscars for both best picture and best director: Unforgiven (1992) and Million Dollar Baby (2004).
“But what I really want to do is direct.” Has any actor fulfilled this wish more brilliantly and prolifically than our Clint? In the 1970s, Eastwood-the-star proved himself worthy of his mentors (Dirty Harry’s Don Siegel, The Good, the Bad and the Ugly’s Sergio Leone) by working both sides of the camera in High Plains Drifter (1973) and The Outlaw Josey Wales (1976).
Since then, he has completely shattered any preconceptions that he’s strictly a genre-Western guy, taking on taut drama (Million Dollar Baby, last year’s Changeling), slush for the ladies (The Bridges of Madison County, 1995), the musical biopic (Bird, 1988), and the war epic (2006’s Iwo Jima twofer, Flags of Our Fathers and Letters from Iwo Jima).
In his 29th feature as a director, Gran Torino, he delivers what he has hinted is likely his final film performance, as Walt Kowalski, a white-ethnic remnant of a working-class Detroit neighborhood now given over to Hmong immigrants. It’s a measure of Eastwood’s comfort with himself that he doesn’t approach the role with valedictory pompousness; rather, he plays Walt broadly, for laughs—growling, squinting, and spitting like a crotchety C.G.I. creature in a George Lucas film.
But Eastwood-the-director still manages to take Walt to some deep, dark places, as only he can. The performing Eastwood will be missed, if this is indeed his last role, but the filmmaker, 78 years old, marches onward: The Human Factor, starring Morgan Freeman as Nelson Mandela, is due later this year.
[in Vanity Fair]
Freida Pinto
Pronto, cá está ela, assim ao modo boneca Barbie, Freida Pinto, 24 anos, a bela Latika de Slumdog Millionaire, na Vanity Fair.
"Catapulted to stardom as Latika, the irresistible love interest in Danny Boyle’s Golden Globe–winning Slumdog Millionaire, which was set—and filmed—in her native city. “Bombay is literally the third character in the film, and a very important one,” says Pinto, a former model. “The most wonderful thing about Danny is he’s not focused on poverty only. He shows that Bombay does rise above it.” On outlasting the protracted auditioning process: “Danny said that when he first saw me on tape he pretty much knew he was going to cast me, but we needed to go through auditioning to be sure,” says Pinto. “So it took me six months of auditioning to get the part. By the fourth month I started getting obsessed with the role. Every time I met my friends I would read lines from the script!”
KRISTA SMITH
quinta-feira, fevereiro 05, 2009
V.I.P.
Se generalizar é pecado, e eu também acho que é, vou pecar: vou generalizar. Os artistas são figuras vagamente sinistras, perturbadas, a braços com uma espécie de esquizofrenia que, de alguma forma, até entendo, mas que não me impede de dizer o que vou dizer. Encenar sempre o mesmo número cordato deve dar trabalho e mexer com o sistema nervoso. Se eu fosse artista, daqueles que as pessoas chateiam na rua, perderia os fãs ao primeiro contacto. Melhor, ao primeiro olhar: fulminava-os mal se aproximassem.
Há uns meses subi uma rua da Apúlia com o Sr. Markl, coisa de três minutos, e fiquei a morrer de pena do homem que mordeu o cão. "Ó Markl, és o maior!"; "Ó Markl dá-me um autógrafo!" Dois, dez. "Ó Markl, diz uma piada. Podem ser duas?" E o senhor Markl, imperturbável, educadíssimo, a cumprimentar à esquerda e à direita, lá ia subindo a rua, a custo, mas com genuína simpatia. Não é para todos. Também não podia ser companheira de um destes artistas, que a minha paciência é figurinha anoréxica. Também fiquei a morrer de pena da grávida mais bonita de Portugal, Aninha de algodão doce. Também ela, qual primeira dama do humor português, a acenar e a sorrir.
Entendo que deva ser custoso ser lobo sem querer estar sempre com a pele vestida, sou até solidária. O que já não entendo tão bem é quando um desses artistas da praça partilha esta minha costela, digamos, pouco amistosa, mas também não acha piada se não repararmos neles, se não se criar um certo burburinho a denunciar que ali estão. Preso por ter cão e preso por não ter. Há uns meses, no dermatologista, estava um desses. Hesito em revelar o nome. Hmmm, é melhor não. O senhor fixava os pacientes que, como ele, como eu, estavam ali na sala de espera do consultório à espera da sua vez. Sorria como quem diz: "Eu sei que você sabe quem eu sou". E depois levantava-se, sentava-se, voltava a levantar-se. E voltava a sorrir, quase-quase a dizer: "Olá, olá, sim, sou eu, o do bacalhau." A sorrir quase de caneta na mão a postos para dar o autógrafo que ninguém lhe pediu. Como aqueles artistas que já trazem o encore de casa preparado sem saber se o vão requerer ou não. Bem, mas pelo menos este não abriu a boca.
Há uns dias, entrei num SPA aqui do burgo para levantar um presente. Enquanto as raparigas do balcão desafiavam a minha ira com um laço que teimava em não dar o nó, eis que surge um desses figurões mediáticos, dos mais mediaticamente mal dispostos. A malta mal disposta tem sempre a minha simpatia, quase a minha rendição. Mas tem que ser coerente, tem que ser mal disposta com convicção, assim como se não soubesse ser de outra forma, mesmo que o desejasse muito. Não pode, nunca!, num momento de distracção ou fraqueza, desatar a dizer: "Olá, por aqui?", ao primeiro palerma que encontra. Sobretudo se o palerma for eu.
Mas aconteceu-me, é verdade. O homem a sair da sua ginástica, ou das suas massagens, ou do que quer que seja que lá foi fazer, óculos escuros na cara dentro de um salão a meia-luz - SPA oblige - para não ser, suponho, reconhecido e depois desata a tagarelar. Não havia necessidade! Eu nunca o vi (na televisão não conta); ele seguramente nunca me viu e aquilo foi bastante embaraçoso, para não dizer deprimente.
Sou solidária com artistas de mau feitio. Não sou solidária com artistas carentes.
Tindersticks, Casa da Música, 14 de Fevereiro
"So hush now, my babe, please don't cry
Everything's gonna be alright..."
Amor antes da maioridade IV
Querida Wookie,
Acabou o Verão. E nós com ele.
Morremos subitamente após a última orgia.
Gozámos. Rimos.
A tua voz lancinante, o teu olhar engraçado.
Feliz.
Encontrei-te no ponto certo, no momento bom.
Beijámo-nos no meio da sala enorme,
Abracei-te em gestos ousados, pousados,
suaves sobre a tua pele...
Corta!
Corto o filme!
O teu caso, o nosso caso está perdido. Definitivamente.
Encontrei-me a sonhar no passado perdido.
É certo: gostei, amei-te, odiei-te,
Chorei. E depois morri.
Chega de tretas! Chega de canalhices!
Os teus olhos choram. Tudo chora.
E mais choro eu de tudo ver chorar.
Cansei-me. Cansei-me de sonhar.
De mentir.
Mentir-me a mim. Mentir-te a ti.
Deixei de gostar de mim quando deixaste de gostar de mim.
O teu egoísmo abafou-me, asfixiou-me.
Mas não quero partir.
Deixa-me viver. Em ti.
Sentir-me livre. Em ti.
Não percebes que não posso confiar em ti desconfiando de mim?
Isto não pode estar a acontecer.
Fungos trespassam-me,
alarmando e alastrando-se no meu corpo.
Sinto-me imundo, ex-mundo.
Fecho os olhos devagar.
Vai! Voa!
Brinca com a vida. Eu fco com a morte.
Desculpa. A culpa não é tua.
Mas explica-me porque já não me fazes feliz.
Nem queres a minha felicidade com antes querias.
Exagero, ultrapasso os limites, eu sei.
Perco-me na vida
e a vida perde-se em mim.
Vou morrer.
Mas olho para a minha mão e vejo que ainda me sobra algum tempo.
Sinceramente, gostas do que escrevo?
Do que faço, do que digo,
Do que fumo, do que bebo
Do que me chupa a pele?
Nunca dás respostas,
Só fazes perguntas!
Merda!
C.A.
Acabou o Verão. E nós com ele.
Morremos subitamente após a última orgia.
Gozámos. Rimos.
A tua voz lancinante, o teu olhar engraçado.
Feliz.
Encontrei-te no ponto certo, no momento bom.
Beijámo-nos no meio da sala enorme,
Abracei-te em gestos ousados, pousados,
suaves sobre a tua pele...
Corta!
Corto o filme!
O teu caso, o nosso caso está perdido. Definitivamente.
Encontrei-me a sonhar no passado perdido.
É certo: gostei, amei-te, odiei-te,
Chorei. E depois morri.
Chega de tretas! Chega de canalhices!
Os teus olhos choram. Tudo chora.
E mais choro eu de tudo ver chorar.
Cansei-me. Cansei-me de sonhar.
De mentir.
Mentir-me a mim. Mentir-te a ti.
Deixei de gostar de mim quando deixaste de gostar de mim.
O teu egoísmo abafou-me, asfixiou-me.
Mas não quero partir.
Deixa-me viver. Em ti.
Sentir-me livre. Em ti.
Não percebes que não posso confiar em ti desconfiando de mim?
Isto não pode estar a acontecer.
Fungos trespassam-me,
alarmando e alastrando-se no meu corpo.
Sinto-me imundo, ex-mundo.
Fecho os olhos devagar.
Vai! Voa!
Brinca com a vida. Eu fco com a morte.
Desculpa. A culpa não é tua.
Mas explica-me porque já não me fazes feliz.
Nem queres a minha felicidade com antes querias.
Exagero, ultrapasso os limites, eu sei.
Perco-me na vida
e a vida perde-se em mim.
Vou morrer.
Mas olho para a minha mão e vejo que ainda me sobra algum tempo.
Sinceramente, gostas do que escrevo?
Do que faço, do que digo,
Do que fumo, do que bebo
Do que me chupa a pele?
Nunca dás respostas,
Só fazes perguntas!
Merda!
C.A.
quarta-feira, fevereiro 04, 2009
Lev Tolstoi: A morte de Ivan Ilitch
"A vida é uma série de sofrimentos em aceleração, voa cada vez mais velozmente para o seu termo, para o mais hediondo sofrimento. «Estou a voar...» Estremecia, estrebuchava, queria resistir, mas já sabia que era impossível resistir, e de novo, com os olhos cansados de olhar mas incapazes de não olhar para o que estava diante deles, perscrutava o espaldar do sofá e esperava - esperava a queda terrível, o golpe, a destruição. «É impossível resistir», dizia para si."
Tábua de salvação
Acreditamos nos estranhos para não perdermos a esperança na Humanidade. Um amigo salva-nos a vida e achamos que não fez mais do que a sua obrigação. Um estranho oferece-nos uma flor e achamos que ele é um super-herói.
terça-feira, fevereiro 03, 2009
O amor antes da maioridade III
Querida Wookie,
Contigo quase soube o que eram certezas na vida,
o que eram caminhos para andar.
Senti segurança, conforto,
mas talvez fosse fruto da minha imaginação (que não me falta).
Talvez fosse fruto da minha imaginação a certeza de que nada nos separaria.
Às vezes, estou verdadeiramente noutro mundo
porque não compreendo nada deste.
Nem as pessoas.
Nem a ti.
Não consigo viver sem amor,
sem um gesto, um olhar, uma mão, talvez uma palavra.
Sufoco por contenção, comprime-me o coração.
No silêncio, finalmente...
Vou desistir. Não quero ser forte.
Nem consigo chorar, embora queira.
Palhaço triste.
Sinto a traição, o engano.
Não consigo acreditar. Quero fechar os olhos.
Porque é que os sonhos morrem?
Por que razão continuas a andar, a cantar e a dançar?
É preciso grande coragem! Não vês que enlouqueço?
Há semanas, ouves? Há semanas que não escreves!
Esquece. Esquece-me.
Não sou nada. Já não significo nada.
As pessoas todas encontram o significado para a vida em coisas baratas, fúteis.
Isso basta-lhes. Isso basta-te?
Como conseguirei viver assim?
Como consegues viver assim?
C.A.
Contigo quase soube o que eram certezas na vida,
o que eram caminhos para andar.
Senti segurança, conforto,
mas talvez fosse fruto da minha imaginação (que não me falta).
Talvez fosse fruto da minha imaginação a certeza de que nada nos separaria.
Às vezes, estou verdadeiramente noutro mundo
porque não compreendo nada deste.
Nem as pessoas.
Nem a ti.
Não consigo viver sem amor,
sem um gesto, um olhar, uma mão, talvez uma palavra.
Sufoco por contenção, comprime-me o coração.
No silêncio, finalmente...
Vou desistir. Não quero ser forte.
Nem consigo chorar, embora queira.
Palhaço triste.
Sinto a traição, o engano.
Não consigo acreditar. Quero fechar os olhos.
Porque é que os sonhos morrem?
Por que razão continuas a andar, a cantar e a dançar?
É preciso grande coragem! Não vês que enlouqueço?
Há semanas, ouves? Há semanas que não escreves!
Esquece. Esquece-me.
Não sou nada. Já não significo nada.
As pessoas todas encontram o significado para a vida em coisas baratas, fúteis.
Isso basta-lhes. Isso basta-te?
Como conseguirei viver assim?
Como consegues viver assim?
C.A.
Amordacem o Papa!
O Papa condenou a autorização judicial para a morte por eutanásia de Eluana, em coma há 17 anos. A italiana, que sofreu um acidente rodoviário aos 20 anos, já viveu quase tanto em coma como em vida viva. Mas para o Vaticano esse sofrimento ainda não é suficiente.
“A eutanásia é uma falsa solução para o drama do sofrimento, uma solução indigna do homem”, declarou o senhor Bento, suscitando aplausos da multidão dos fiéis concentrados na Praça de S. Pedro, no Vaticano. “A verdadeira resposta não pode ser proporcionar a morte, por muito suave que ela seja, mas sim testemunhar amor para ajudar a enfrentar a dor e a agonia”.
Importa-se de repetir?
As declarações encontraram eco, também, no chefe da Igreja italiana, monsenhor Angelo Bagnasco, que esta semana voltou a afirmar que “parar alimentação e a hidratação de uma pessoa significa conduzi-la a uma eutanásia inaceitável”. Por que raio a Igreja não mata a fome a quem a tem? E são cada vez mais?
O ministro da Saúde do Vaticano, o cardinal Javier Lozano Barragan, foi ainda mais longe na sentença sobre a decisão da família: trata-se de um “assassínio abominável".
É por estas e por outras que a Igreja tem cada vez menos fiéis...
Troika
A propósito da nudez de José Cid, O Louco, e da nudez de Morrissey, The Charming Man, ocorreram-me, para completar a troika, dois vídeos de Rui Reininho, The Special One (qual Mourinho, qual carapuça! Antes o Quique Flores ao Mourinho. O FCP que me perdoe, mas enquanto o espanhol andar por estas bandas continuamos a ganhar e a consolar os olhinhos!). Porque nunca percebi muito bem o título que lhe deram: "Vergonha". Vergonha de quê? Reininho é talvez o único homem do Mundo que consegue usar uma camisola de alças sem ficar ridículo. Que pode trocar de camisa em palco depois dos 50 anos - o Morrissey e o Cid não podem. Pelo menos, não devem - e com aqueles abdominais fazer morrer de inveja rapazes de 20 e deixar a suspirar meninas de 15. Ok, 18, para não parecer mal. É definitivamente o único - pelo menos, não me ocorre mais ninguém - que pode baixar as calças em palco. Aquilo são dois metros inteiros. Puros. E com humor, ainda por cima.
segunda-feira, fevereiro 02, 2009
domingo, fevereiro 01, 2009
Pedro Mexia
"Os homens têm um caderno de encargos permanente que os obriga a mostrar que são homens segundo um regulamento que está escrito não sei onde, e que os leva a serem patetas em full time. Os homens são muito pouco livres de se exprimirem de acordo com aquilo que sentem e que pensam porque têm medo de que isso possa afectar a sua imagem."
Pedro Mexia, Farpas JN
Jacarandá e Mulemba
Não sei se teria gostado da mesma forma de Jacarandá e Mulemba se não tivesse ouvido Jacarandá e Mulemba dito por quem o escreveu, por quem o viveu. António Costa Silva e Nicolau Santos, os dois autores dos poemas que não são poetas, são "fazedores de versos", e que à boleia desse conforto que os esvazia da responsabilidade que a pompa dos títulos confere, publicaram o livro. Sobre África: Angola.
Angola é ali uma mulher, a única que os homens, aqueles e outros, não se importam de partilhar. Pelo contrário, ela é tanto mais celebrada, tanto mais deles quanto mais a derem a conhecer aos outros. Angola de rara equação: multiplica-se na divisão. Angola é ali mãe, amiga, irmã, amante. A mulher que não queriam deixar, mas deixaram. A mulher que não os queria abandonar, mas abandonou. A mulher que nunca poderão esquecer. E que não resistem a procurar em todas as mulheres, sabendo que nenhuma mulher é aquela. E que aquela nunca poderá voltar. História de amor que não se apaga nem se atenua e a que se volta sempre. Na reconstrução da memória. "Angola/ Não é normal que / passados tantos anos / eu me continue a lembrar de ti."
A forma como um e outro, por baixo ou por cima de um extraordinário quarteto de jazz, leram os poemas, ontem, na Cooperativa Árvore, no Porto, não deixa grande margem para que outra leitura possa ser feita a partir daquela. Leio os poemas outra vez, e outra, e outra, e ainda é a voz deles que ouço. A voz de António, serena, às vezes sussurrada, às vezes magoada (esteve preso durante três anos sem saber se dali sairia a tempo de partilhar a poesia), essa voz a vir de mansinho como quem ressuscita da dor ("Eu conto as feridas vivas/ As rugas da palavra/ Colecciono as ruínas") e escolhe viver do amor. Essa voz a dizer: "Amo a vida/ como a uma irmã/ O importante é não perder/ nenhum dos dias que sobram". E a voz de Nicolau exaltada, quase cantada, dançada, a percorrer as ruas da infância, olhos de menino, de gula ("Eu sabia lá o que era lânguido/ Aos 15 anos!"), a descobrir os sabores do mundo, "fascinado, espantado", essa voz gritada, a ir para lá, como se precisasse, qual declaração de amor gritada ao mundo em cima de um banco, de ser ouvida lá. "Nessas sílabas, camarada/ Marcarei/ Que só acredito em vós/ E por vós acreditei".
É como se um chorasse para a vida porque esteve lá e outro sorrisse para a vida porque lá esteve. E, no entanto, háverá lagrimas e sorrisos nos dois. E nos dois há sobretudo a generosidade imensa de uma partilha tão íntima. Obrigada.
O amor antes da maioridade II
Querida Wookie,
As folhas caem, o vento sopra, a alma voa. Chegou o Outono.
Quero pedir-te perdão. Pedir-te desculpa não chega.
Não há culpa: nem eu nem tu somos culpados.
Gostaria de não remexer no passado, no nosso desmoronamento, no nosso sonho.
No nosso lugar.
Não quero voltar a discutir contigo.
Entusiasmava-me rever-te, conversar. Mas isso ser-me-ia difícil. Muito difícil.
Há sempre a tentação. Maldita tentação, sim.
Um dia perguntaste-me porque gostava de ti, o que gostava em ti.
A resposta foi perplexa, desconhecida. Talvez tudo.
Gostava de te ver rir e também eu explodir numa gargalhada. A vida.
Gostava de te ver chorar, o teu choro sempre tão contínuo como a dor que te provocava.
Gostava de te ver dormir no teu quarto, sempre na penumbra.
Gostava de te ver nua, do teu sexo, das tuas pernas.
Gostava das tuas mordidelas ferozes, das tuas loucuras.
Gostava do teu amor.
Da tua mão na minha mão. Do teu rigor.
Gostava de ver-te cozinhar, vestir. Do teu dinamismo.
Amei-te, sabes?
Acho que não fiz mais porque não sabia.
E o que não sabia era essencial para a nossa sobrevivência.
Isso confundiu-me, apaixonou-me. Enterrou-me.
Não me alongo mais.
Na minha lágrima deposito o desejo de que recuperes a felicidade.
O desejo de que não me guardes rancor.
Choro, mas com grande fé em ti.
Um beijo no papel.
A lágrima caiu ao lado.
C.A.
As folhas caem, o vento sopra, a alma voa. Chegou o Outono.
Quero pedir-te perdão. Pedir-te desculpa não chega.
Não há culpa: nem eu nem tu somos culpados.
Gostaria de não remexer no passado, no nosso desmoronamento, no nosso sonho.
No nosso lugar.
Não quero voltar a discutir contigo.
Entusiasmava-me rever-te, conversar. Mas isso ser-me-ia difícil. Muito difícil.
Há sempre a tentação. Maldita tentação, sim.
Um dia perguntaste-me porque gostava de ti, o que gostava em ti.
A resposta foi perplexa, desconhecida. Talvez tudo.
Gostava de te ver rir e também eu explodir numa gargalhada. A vida.
Gostava de te ver chorar, o teu choro sempre tão contínuo como a dor que te provocava.
Gostava de te ver dormir no teu quarto, sempre na penumbra.
Gostava de te ver nua, do teu sexo, das tuas pernas.
Gostava das tuas mordidelas ferozes, das tuas loucuras.
Gostava do teu amor.
Da tua mão na minha mão. Do teu rigor.
Gostava de ver-te cozinhar, vestir. Do teu dinamismo.
Amei-te, sabes?
Acho que não fiz mais porque não sabia.
E o que não sabia era essencial para a nossa sobrevivência.
Isso confundiu-me, apaixonou-me. Enterrou-me.
Não me alongo mais.
Na minha lágrima deposito o desejo de que recuperes a felicidade.
O desejo de que não me guardes rancor.
Choro, mas com grande fé em ti.
Um beijo no papel.
A lágrima caiu ao lado.
C.A.
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