domingo, julho 31, 2011

Miguel Esteves Cardoso: A calma de Agosto

[Paolo Roversi]

O amor é uma coisa muito estranha, que todos os dias nos acorda, depois de sonhos inequívocos, a lembrar-nos que estamos condenados à pessoa que amamos. E ficamos, por estarmos apaixonados, convencidos. Que o nosso inteiro coração, por estar ocupado por ela, está entregue a expandir-se ilimitadamente por causa disso, por uma só pessoa.

O amor - que foi, nalgum dia ou em qualquer outra vida que se teve, enquanto se estava distraído, uma prova de se estar vivo, uma maneira de chamar e de pertencer só para poder fazer parte da palavra - revela-se, ao ver-se tão feio e egoísta, uma prova de humanidade, que também dói.

Dói tanto o amor desencontrado como aquele que se encontra. Cada apoteose antecede um plano de fuga. Só os sentimentos de cada um, excluindo os outros (a começar por aqueles que têm os que amamos) conseguem concertar a emoção de que se foge e, ao mesmo tempo, na qual se encontra refúgio.

Amar antes de Agosto começar é como aceitar, de abraço aberto, o frio de Dezembro - e agradecer, apesar da desilusão do tempo que está, o conforto de saber que não é Inverno nem Outono. Há calma.

Em Agosto vai haver tempestades; vai chover; vamos ser confundidos tanto como o tempo consegue, presos ao passar das nuvens e ao azular do céu, surpreendidos e encantados, como se sob o efeito de um ilusionista.

O amor é como o ano. Agosto é como um dia. O tempo o amor começam enquanto continuam. É quando o amor continua que se está mais apaixonado.

Hoje, no Público

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