terça-feira, maio 04, 2010

Inês de Medeiros apeada

O problema não é Inês de Medeiros ter aceitado o convite para ser deputada em Portugal, residindo em Paris. Primeiro, sem saber se teria direito às deslocações; depois, dizendo que aceitaria qualquer que fosse a resposta do Parlamento à sua solicitação de esclarecimento; recentemente, aceitando o subsídio, que parecia ser claramente um regime de excepção; e finalmente, abdicando afinal do direito ao subsídio, custeando a própria as despesas de viagem.

O problema não é se a referida despesa representa uma migalha ou uma montanha no orçamento do Parlamento. Seriam cerca de cinco mil euros mensais. Representa pouco no bolo, como se sabe, e há viagens outras (e fossem só as viagens...), de todos os deputados de todos os partidos que, se conhecidas fossem, suscitariam choque muito maior no povo - e um rombo mais significativo no bolso do Parlamento.

O problema, no limite, nem é a actriz, agora deputada e vice-presidente da bancada socialista, ter aceite exercer o seu direito de cidadania neste país, tendo escolhido outro para viver, o que não deixa de ser vagamente esquizofrénico, mas tudo bem. O problema não é sequer não se perceber ao certo qual é a mais-valia que ela traz consigo. Não pode ser a bagagem cultural, que o PS tem passado alegremente ao lado da cultura. Nem o seu glorioso passado político, que a estreia ao lado de Vital Moreira nas europeias não é de boa memória. Mas o que a traz ou o que acrescenta é indiferente num país cuja radiografia ao cérebro dos deputados deixar-nos-ia a todos deprimidos e a ela, por comparação, provavelmente muito bem cotada.

O problema não é Inês de Medeiros. Não é Inês de Medeiros que, ainda por cima, ao abdicar do dinheiro sai razoavelmente bem da história. Ou tão bem quanto é possível sair no varrer dos cacos. Daqui a um ano já ninguém se lembra e quem se lembrar não a poderá acusar de ter sido beneficiada.

O problema, claro, é o Partido Socialista! O que o PS fez foi o equivalente a comprar casa sem saber que a partir de determinado montante, teria de pagar IMI a vida toda. Sem isenção nos primeiros anos, sem isenção depois da eventual hipoteca paga. Sem regime de excepção que lhe valha. Comprar casa sem saber se poderia suportar o IMI. O que o PS fez foi dar o pior dos exemplos num país onde o cliché da mulher de César - não basta ser sério; é preciso parecer sério - tem aplicação científica. E a defesa da dama, em textos publicados no Público - Francisco Assis há dois ou três dias e Vital Moreira hoje -, só veio piorar o cenário. Porque não há desculpa possível para um episódio destes, mesmo que ele se preste a aproveitamento barato por parte da oposição. Como se explica a um eleitorado pobre e desempregado que cinco mil euros é uma ninharia?

Pior do que tudo, ainda ninguém disse se é o PS que vai custear as despesas de Inês de Medeiros. Provavelmente é. E o que o partido faz ao dinheiro é lá com ele. Mas não seria mais decente se o dissesse já?!

6 comentários:

  1. Era. Até porque quando se diz meia verdade supõe se que quem nos ouve pensa pela metade.

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  2. Embirrei logo que comecei a ler ... Não é ter aceite , mas ter aceitado ... Toca a rever a lição dos partícipios.
    Gomes Canotilho

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  3. Dr. Gomes Canotilho,

    Obrigada pelo puxão de orelhas. É erro recorrente, mas tem toda a razão. A regra diz que quando o auxiliar é o verbo Ter usa-se o particípio passado regular. Soa mal, eu acho, mas é a regra. Obrigada.
    helena.

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  4. Cara Dra , eu não sou esse , mas por acaso os apelidos coincidem... Agora vou ler o seu poste. Sabe , cheguei aqui um pouco por acaso porque andei a ver se encontrava alguma coisa sobre o livro da Mnemónica e fui reenviado . Li o que escreveu sobre o BI dela com atençâo, mas em nada , sinceramente, alterou o que me é dado a ver , a ilustrada não sabe falar nem exprimir-se , e escreve indigentemente. Será postura?

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  5. Não importa que Gomes Canotilho é. Não muda nada. Agradeço-lhe a lição na mesma. Quanto ao resto, aparentemente, não estamos mesmo do mesmo lado. Filtrando a postura, a MFM (é dela que estamos a falar, não é?) merece, de facto, a minha total admiração.

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