domingo, agosto 18, 2013

José Miguel Gaspar: Coura, dia 5

Palma Violets

"Só vi metade dos Palma Violets porque fiquei para trás como quem fica até tarde na praia, na tenda dos Ducktails, havia sol e surf e electricidade e uma brisa com vista para pop psicadélico e por isso fiquei até ao fim. Quando saí, ainda ensolarado por aquele som pop horizontal que jorrava da guitarra de Matt Mondanile, assim que comecei a andar e deixei para trás o piso pedrado da tenda Vodafone FM, deu-me imediatamente vontade de correr e ver o que era aquilo, Palma Violets, era muito ALTO. 

Assim que assomei a meio da encosta e do chão fofo estaquei. E foi como se visse um só clarão. Mas um clarão com todas as cores. Quando dei por mim tinha furado até à boca daquilo, no fundo da encosta, 
e estava no ringue onde se agitam e se alteram os espectadores de ferro, onde dançam os índios, convulsos, onde se estremece, onde o pânico se confunde com a alegria e as roupas parecem dançar sozinhas no ar em cores esticadas debaixo da poeira.



Foi nesse pó, dourado, que vi nadar Chilli Jesson, nadou de costas nas palmas das nossas mãos e prolongou indefinidamente o sol da goldenhour, que se punha nas cabeças da encosta de capim. Foi lá no fundo que tremi ri empurrado empurrei com ímpeto as roupas das caras que voavam, estonteado filmei Chilli a flutuar, flashado pelas mãos que o elevavam, ele a passar como se fosse deitado numa cruz. No fim ninguém me perguntou se tinha 16 anos, se lhe tinha conseguido tocar ou quando é que ia tirar a pulseira. 


Chilli, que anda na roda dos 20 anos, como os outros do quarteto Palma Violets, veio do bairro de Lambeth, fervedouro da Great London, e trouxe algo novo para mim: flowerpunk, música que tem aquela imparável negrura do feedback discordante de todas as cores, festa Clash, patina psicadélica, riffs empolgantes de hardcore hipster, a música é ALTA, Chilli rosna como os cães às cobras e às mãos, toca o baixo comprido, bramido como se fosse uma lança, e os outros três, Samuel, Peter, William, guitarra, teclas, bateria, parece que estão numa pega ente os Bad Seeds e os Doors dentro do Gun Club (não estão todos: o teclista Peter não perde a pose, fleumaticamente posto no seu sítio, paciente, como se visse aquele motim todos os dias). O seu rock de '180' (‘Johnny Bagga Donuts’, ‘Rattlesnake Highway’, ‘All the Garden Birds’ ou 'Best of friends', um single infeccioso e felino, é a única canção que me parece feminina), é música tesa, é atirada à nossa cara, Chilli cospe no chão, e no entanto é romântica, como se para eles também fosse a primeira vez. A mim, todo aquele lume de suspensão e enlevo foi-me directo ao coração. Foi o meu concerto de Coura 2013."

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