sexta-feira, agosto 16, 2013

José Miguel Gaspar: Coura, dia 3

The Vaccines


Everything Everything.
Pop polifónico de fim de tarde, agudo, cheio de claridade e falsetto, demasiado inofensivo ou demasiado vegetariano. Quando o vocalista dizia thank you parecia estar a dizer fuck you - não era ironia, era só sotaque brit, e era sensaborão. 

Veronica Falls.

Fiquei sempre à espera que acontecesse alguma coisa que não chegou. Às vezes parecia que aí vinha um pequeno apocalipse noise, um abismo gótico ou um impulso desenfreado para enfrentar de guitarra o horror, mas não, não houve oásis, só um vago aborrecimento de indie brit pop. Deu-me saudade de ver dois fantasmas vivos e de uma coisa que nunca aconteceu: Morrissey amarrado, esticado a cantar numa corda puxada pelos Jesus and Mary Chain. 

Hot Chip.

Há quem seja adepto do cientismo de Alexis Taylor e da sua cientologia pop, mas a mim parece-me como Dan Brown ou a literatura plana e de demasiada claridade, literatura calculada escrita com embalos de sossego, sem armadilhas ou reais ciladas ou ardor. Às vezes aquilo é galvanizante e a encosta desata de braços no ar (não toda, a metade maior, da mesa de som até ao cimo, está sentada), quando se lança nas pequenas épicas de crescendum da indietrónica . Mas no fim aquilo parece-me música que não está a evoluir, música para ouvir em salões de casacos demasiado brancos ou demasiado grandes e grandes barcos de água estacada, música para desaguar em casinos cansados. 

The Knife
Aos géneros synthpop, dark disco, ambiental, minimal, e techno teatral experimental, os The Knife têm que acrescentar outro agora: exclusivamente-coreográfico-se-tocado-ao-vivo. Com formação em octeto, a banda sueca fez uma coisa inédita e extraordinária ao vivo: chegou a ter os oito elementos em palco e estar longamente em playback total, vocal e instrumental. Perante isto, só sobrava vermos a única coisa que havia ao vivo: a voz de Karin Dreijer Andersson, voz aguda, angulosa e de cristal, mas que ali esteve sempre encapuzada numa ausência espectral. Projectados para enfeitiçar ou enfurecer o público, provocaram coisa infinitamente pior: deixaram tudo na bruma da indiferença, sem paciência para a ironia de collants, a coreografia e o coordenado liceal, sequer da sua aeróbica Trekkie espacial. As réplicas deste pequenino trémolo equivocado para prato principal hão-de prejudicar o futuro do festival. 

Little Boots
Discoteque eurotrash com a vontade de um arrastão a andar para trás em direcção ao strob de 1980. É música óptima para a pequena alienação, enquanto se está ali, debaixo daquela batida protectora de cores e do caleidoscópio discopop, nada de mal pode acontecer, parece que estamos protegidos do mundo. Mas insistido e visto ao perto, vemos que Victoria Christina, a Little Boots de Blackpool, loira com uma capa que quer esvoaçar, está ali como podia estar no quarto dela, a cantar para o espelho, a acreditar no seu secador e no vento da fama e da eterna juventude. 

Echo and the Bunnymen.
O post-punk chegou aqui como um cadáver hirto e exumado. 'Lips like sugar' já não é uma mulher fogosa que foge, já não é um cisne, já não flutua, é só uma boneca balofa insuflada, com menos vida que a Gina, a boneca escachada que se passeia nua e labial nas encostas e no rio e num grupo folgazão do festival. 

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