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quarta-feira, agosto 19, 2015
domingo, agosto 16, 2015
Lykke Li
A primeira vez que ouvi esta rapariga foi num filme de vampiros para adolescentes (sim, o Twilight), apesar de já não ser adolescente para aí há cinquenta anos. Na altura, passei não sei quantos dias seguidos a ouvi-la pedir: tell me when you hear my heart stop. Era uma espécie de guilty pleasure, um acesso insano de adolescência retardada. God, save me!
Dois anos depois, em 2011, Lykke Li esteve no Meco (sim, vou continuar a chamar-lhe Meco até que o devolvam à proveniência) e deu um concerto absolutamente inacreditável. Uma espécie de prestação em modo Alice Glass em versão moderada, salvo ainda assim o exagero. Foi aí que ficámos a saber que a sueca, de 29 anos, passou parte da infância em Portugal, com os pais. E foi aí que percebemos que os concertos dela não são para chorar, são para dançar.
Passaram quatro anos, cada canção um single, quase. Lykke Li já não é a rapariga dos vampiros embora esteja ainda mais gótica, mas nunca mais ninguém a trouxe. Até agora. Coura, 22 de agosto, próximo sábado, concerto único. Coura é partilha!
sexta-feira, fevereiro 13, 2015
segunda-feira, agosto 25, 2014
Teremos sempre Coura
Se Coura fosse um lugar, seria um daqueles lugares onde desejaríamos ficar para sempre. Mas Coura não é um lugar, é um território mental. Não é seguro que o que lá se passa não passe apenas na nossa cabeça. Ou nesse canto mais fundo e insondável - e infalível - chamado coração. Não vale a pena experimentar sentir o que lá se sente noutro festival. Não funciona. Coura põe-nos a levitar como naquele momento inicial em que um poderoso medicamento nos tira a dor. E, desta vez, foi como ver um filme num cinetoscópio, em que é quase impossível isolar as posições.
Talvez os Chvrches não tenham dado o melhor concerto do festival, mas deram seguramente um concerto mil furos acima do que qualquer jornalista escreveu. É um dos nossos concertos do ano, também porque uma banda é a bagagem que nos dá, e na nossa tínhamos longos meses de perseguição da digressão europeia destes escoceses em busca de um concerto que não estivesse esgotado (estavam todos) e só deixámos de procurar quando foram confirmados em Coura. Logo em Coura!
Lauren Mayberry, com aquela voz de desenho animado, miníma na estatura, é enorme porque não precisa de freakshow nenhum para nos pôr a dançar freneticamente do início ao fim, a cantar do início ao fim. Era impossível ter sido melhor e eu quase gostava de a ter descoberto só ali, para aquilo tudo ser ainda mais bonito. Que pena que não tenha contaminado a encosta inteira. Mas tudo bem, Coura é uma espécie de mapa da caça ao tesouro e é sempre possível encontrar mais do que um no mesmo palco. Ou no palco do lado.
Mas não, não foi o excessivamente juvenil Mac DeMarco, apesar da boa imprensa e de todo o hype criado em torno dele.
Ao contrário, um homem que aparece em palco a parecer o Vincent Gallo em novo só pode ser um caso sério. Se ainda por cima nos atira logo para dentro do Pulp Fiction e nos põe automaticamente a sorrir e a menear as ancas como Uma Thurman naquete twist do Chuck Berry (ou como Manuel Justo dos Sensible Soccers), isso é amor à primeira vista. Foi o que sentimos quando vimos Brooks Nielsen dos Growlers, empatia total e muita temperatura a subir. E ainda agora podíamos lá estar a dançar com ele.
Depois, há sempre pelo menos um momento epifânico em Coura, daqueles que ajudam a entender por que razão ficaríamos lá para sempre.
Este ano houve dois: Hamilton Leithauser a cantar I'll never love again, I'll never love again, I'll never love again, toda a gente a cantar I'll never love again, ninguém pode em consciência querer cantar isto, mas toda a gente cantou em coro I'll never love again e foi absolutamente de arrepiar. E Cheatahs, naquele Fall (que mesmo remetendo um bocadinho para Song for Zula dos Phosphorecent, a epifania do ano passado) atirou-nos para um lugar qualquer dentro de nós que só é possível descobrir ali. Há concertos de ir às lágrimas em Coura. Estes foram, e foram dos mais memoráveis desta edição.
Mas também há concertos inesperados, que nos deixam com um Hã?! na cara e nos engolem e contagiam. Goat foi um maravilhoso e total freakout. Coura é descoberta, mas também é memória. Isso explica a rendição-lata-de-sardinhas em Beirut (mesmo se já os tínhamos visto em 2011 no Meco e percebido que o concerto não é bem o que gostaríamos que fosse e desta vez tenha sido igual - igual não é mau, é só menos) e não explica o desapontamento de tantos com James Blake.
Raios, ele deu-nos a case of you que não nos deu no Primavera, deu-nos um concerto para ouvir (sentir?) de olhos fechados e no fim ainda nos estendeu como que uma hóstia mágica para uma comunhão de paz. E nós viemos embora dali só a rezar para que dure. Talvez só mais um inverno. Talvez só até ser Coura outra vez. Coura é amor e o amor é cego, mas não é surdo. Talvez tenha sido a melhor edição de sempre. Muito e muito obrigada.
PS1. Já vimos vários concertos dos Sensible Soccers, já os vimos em Coura, e podíamos vê-los alegremente todos os dias. Mas este ano, às seis da tarde (às seis da tarde?!? Sensible Soccers?!?) foi impossível chegar a tempo. Caso contrário, teria sido um dos nossos concertos. Sensible Soccers é sempre um dos nossos concertos.
PS2. Concertos ao fim da tarde é dureza. Chegámos a duas canções do fim de Seasick Steve e, por razões outras, a igual distância de The oh sees. Duas perdas imperdoáveis, consta.
PS3.: Nunca consegui ver um concerto dos Linda Martini até ao fim. E acho que nunca vou conseguir. O concerto começa, tudo bem, o baterista começa com aquele paleio e eu começo a ter vontade de sair e saio, tem mesmo de ser. Não se aguenta aquilo.)
(Nos últimos 16 anos falhei uma edição de Coura, treze das quinze foram vividas contigo, José Miguel Gaspar. Pode mudar tudo e até pode acabar o mundo, como canta o Herman, mas uma vida inteira juntos já ninguém nos tira. És o melhor companheiro rock do mundo.)
sexta-feira, julho 25, 2014
domingo, junho 01, 2014
In my my dreams, we're still screaming
Foi o segredo mais bem guardado da nossa quase última década de tournées. Naquele 17 de Agosto de 2005, era o concerto que mais queríamos ver. Saímos a correr do trabalho, atrasados como sempre, Coura era o destino, o inspiradíssimo Funeral dos Arcade Fire a missão. Começámos a ouvi-los ainda dentro do carro - mau sinal, tinham começado a horas -, a chegar à vila, uma canção, a levantar os bilhetes, outra canção, a tentar encontrar lugar para estacionar, mais uma, a tropeçar encosta abaixo. Teremos finalmente chegado, sem certezas absolutas, naquele momento apoteótico de Rebellion (Lies). Mas na nossa memória afectiva guardámos sempre a ideia de que vimos "quatro canções, talvez cinco". Rebellion (Lies) foi a última canção daquele fim de tarde. Talvez uma canção possa valer um concerto inteiro, nunca nenhum de nós quis apurar a verdade. "Quatro canções, talvez cinco". Estava tudo bem, estávamos juntos, estivemos lá e foi lindo.
Os Arcade Fire voltaram em Julho de 2011, ao Meco, depois de a NATO ter cancelado o concerto marcado para Novembro de 2010, em Lisboa. Era meio estranho porque iam tocar a seguir aos Portishead. E a Beth Gibbons, que já não vinha a Portugal há não sei quantos anos, deu naquela noite um concerto maior que a vida. Não precisávamos de rigorosamente mais nada depois da homilia funda que nos deu, só de ficar ali a digerir aquilo devagarinho. Mas tínhamos ainda Arcade Fire, Neon Bible para recuperar e The Suburbs fresquinho. Era uma decisão difícil, mas quase nem tivemos tempo de escolher. Os canadianos entraram em palco com a força de um tsunami e atropelaram-nos naquilo que sempre pareceu uma contraditória ressurreição. Um concerto memorável naquela que foi talvez a melhor edição de sempre do Meco.
E depois, ontem, voltaram a voltar... ao Rock in Rio. Dez anos depois de ter ido pela primeira vez à quinta da bela vista, confirmei por que razão jurei na altura que nunca mais lá ia. É um festival esquizofrénico, de misturas altamente duvidosas, um gigantesco circo em que a música é apenas um adereço. É preciso ser muito, muito grande para conseguir fazer esquecer a circunstância. Os Arcade Fire, razão única da excepção, só podiam conseguir. Durante quase duas horas estivemos noutro sítio qualquer. "In my my dreams, we're still screaming". Grandioso concerto.
sábado, maio 31, 2014
terça-feira, abril 15, 2014
Arcade Fire no Rock in Rio a 31 de Maio
Seria necessária uma coragem que não temos para faltar a este concerto!
quarta-feira, janeiro 29, 2014
sábado, dezembro 28, 2013
Concertos inesquecíveis em 2013
[Paulo Pimenta]
Phosphorescent, Paredes de Coura
Alabama Shakes, Paredes de Coura
Forest Swords, Theatro Circo Braga
James Blake, Primavera Sound Porto
Nick Cave, Primavera Sound Porto
Mark Eitzel, Lux, Lisboa
These New Puritans, Hard Club Porto
The XX, Lisboa
Savages, Primavera Sound Porto
Beach House, Hard Club Porto
Sensible Soccers, Paredes de Coura e Braga
Explosions in the sky, Primavera Sound Porto
Local Natives, Primavera Sound Porto
Daughn Gibson, Primavera Sound Porto
My Bloody Valentine, Primavera Sound Porto
Blur, Primavera Sound Porto
Yo La Tengo, Casa da Música Porto
ASIWYFA, Paredes de Coura
Devendra Banhart, Casa da Musica, Porto
Jay-Jay Johanson, Casa das Artes, Famalicão
Divine Comedy, CC Vila Flor, Guimarães
Cold Cave, Paredes de Coura
Glass Candy, Primavera Sound Porto
Smashing pumpkings, Marés Vivas, Gaia
[Não necessariamente por esta ordem, mas por uma ordem aproximada]
domingo, agosto 18, 2013
José Miguel Gaspar: Coura, ilusões e despenhamentos
Phosphorescent
"Para mim o festival não precisava de ser salvo. Já levo os Iceage no coração, vão lá ficar, empedernidos, levo a ruidosa aurora de novo shoegaze dos Toy e das suas malhas secretas de azul MBV (e como dançavam a tocar, obscuros), levo a Brittany dos Alabama e a desproporção da sua grandeza soul e o momento em que ela voltou a ver o 'Heartbreaker' e nos disse antes de cantar com blues da língua que ele era uma lição, que aquilo não era uma canção triste, levo até debaixo do braço ou entre dentes Jagwar Ma (eles asfixiam e depois pulverizam Madchester, pareceram-me quase tão bons como os Doldrums) e levo ainda (vou, irei sempre com ele, fiquei até ao fim da cavalgada e do encore) Bombino, não é possível esquecer Omara Bombino e o seu enxame de psicoblues. Para mim o festival não precisava de ser salvo. Mas para quantos, a maioria de quantos dos 5 dias da encosta de Coura, 2013, a quantos ainda lhes faltava um big moment, nem que fosse breve mas que tivesse estrondo, que fosse aquele instante que fosforesce e que queima tudo à volta, aquele instante decisivo que vamos partilhar, que nos faz sempre suster e respirar para dentro. Acho que os Palma Violets, ainda que brevemente, criaram e tiveram hoje na mão esse magnífico instante."
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José Miguel Gaspar: Coura, dia 5
Palma Violets
"Só vi metade dos Palma Violets porque fiquei para trás como quem fica até tarde na praia, na tenda dos Ducktails, havia sol e surf e electricidade e uma brisa com vista para pop psicadélico e por isso fiquei até ao fim. Quando saí, ainda ensolarado por aquele som pop horizontal que jorrava da guitarra de Matt Mondanile, assim que comecei a andar e deixei para trás o piso pedrado da tenda Vodafone FM, deu-me imediatamente vontade de correr e ver o que era aquilo, Palma Violets, era muito ALTO.
Assim que assomei a meio da encosta e do chão fofo estaquei. E foi como se visse um só clarão. Mas um clarão com todas as cores. Quando dei por mim tinha furado até à boca daquilo, no fundo da encosta,
e estava no ringue onde se agitam e se alteram os espectadores de ferro, onde dançam os índios, convulsos, onde se estremece, onde o pânico se confunde com a alegria e as roupas parecem dançar sozinhas no ar em cores esticadas debaixo da poeira.
Foi nesse pó, dourado, que vi nadar Chilli Jesson, nadou de costas nas palmas das nossas mãos e prolongou indefinidamente o sol da goldenhour, que se punha nas cabeças da encosta de capim. Foi lá no fundo que tremi ri empurrado empurrei com ímpeto as roupas das caras que voavam, estonteado filmei Chilli a flutuar, flashado pelas mãos que o elevavam, ele a passar como se fosse deitado numa cruz. No fim ninguém me perguntou se tinha 16 anos, se lhe tinha conseguido tocar ou quando é que ia tirar a pulseira.
Chilli, que anda na roda dos 20 anos, como os outros do quarteto Palma Violets, veio do bairro de Lambeth, fervedouro da Great London, e trouxe algo novo para mim: flowerpunk, música que tem aquela imparável negrura do feedback discordante de todas as cores, festa Clash, patina psicadélica, riffs empolgantes de hardcore hipster, a música é ALTA, Chilli rosna como os cães às cobras e às mãos, toca o baixo comprido, bramido como se fosse uma lança, e os outros três, Samuel, Peter, William, guitarra, teclas, bateria, parece que estão numa pega ente os Bad Seeds e os Doors dentro do Gun Club (não estão todos: o teclista Peter não perde a pose, fleumaticamente posto no seu sítio, paciente, como se visse aquele motim todos os dias). O seu rock de '180' (‘Johnny Bagga Donuts’, ‘Rattlesnake Highway’, ‘All the Garden Birds’ ou 'Best of friends', um single infeccioso e felino, é a única canção que me parece feminina), é música tesa, é atirada à nossa cara, Chilli cospe no chão, e no entanto é romântica, como se para eles também fosse a primeira vez. A mim, todo aquele lume de suspensão e enlevo foi-me directo ao coração. Foi o meu concerto de Coura 2013."
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sábado, agosto 17, 2013
José Miguel Gaspar: Coura, dia 4
Cold Cave
"Quando acabei de ver Iceage tinha o coração aos saltos. Não saberei dizer porquê. Se isto é o festival do amor, então Elias Bender Rønnenfelt, e Elias Bender Rønnenfelt tem 23 anos, chegou e cravou uma picareta no coração do festival. E depois rugiu. Foi o número mais poderoso do dia de Horrors e de errors: Simian Mobile é um erro low cost e de casting, paralítico e monolítico; Echo foi desoladamente fraco, como se Ian McCulloch fosse uma cover de si mesmo, entorpecido e fotocopiado, a assassinar ao vivo a 'Killing moon' , que só me pareceu uma versão piano-bar na bruma. É post-punk em rigor mortis, já não traz estrago ou urgência e saí sem querer pensar na desilusão.
Fiquei o resto da noite com Elias Bender Rønnenfelt na cabeça e com o coração de pedra Iceage (mesmo quando já estava nos Delorean, subitamente a saltar por haver ali instrumentos e músicos vivos no fim da noite). Iceage cerca como uma parede de som de filigrana e de cascalho, é simultaneamente rude e requintado. Punk, muito punk, noise e hardcore, canções curtas que soam como um vespeiro e um voo de pedras em fricção. Elias é o centro daquilo e caminha como se o chão desmoronasse ou como se tivesse membros de pesos diferentes, debaixo da chuva metálica do baixo, guitarra e bateria, o fio do microfone a subir-lhe pelas costas da camisa negra como uma corda e ele pendura-a à volta do pescoço quando canta e quando nos fita e vocifera. Transido, Elias, é mudo entre as canções e sai sem falar, mas olha-nos. Ruge e depois fica a olhar para nós, lívido e dinamarquês, com supremo desinteresse ou a fingir supremo ar de desinteresse por nós, a olhar-nos como se fosse uma cobra que cambaleia, a caminhar entre as colunas negras e para ele lunares, e ruge novamente durante 2, 3 minutos, o tempo das canções. Houve mosh, fez-se o anel da luta nos da frente e muitos surfaram debaixo da luz amarela negra (e mais do que os de Omaro), a voar nas mãos, as pernas despenhadas entre os braços, a nuvem de luz e o pó. Aquilo é abrasivo, parece perigoso, é perigoso. Saí de coração aos saltos."
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José Miguel Gaspar
sexta-feira, agosto 16, 2013
José Miguel Gaspar: Coura, dia 3
The Vaccines
Everything Everything.
Pop polifónico de fim de tarde, agudo, cheio de claridade e falsetto, demasiado inofensivo ou demasiado vegetariano. Quando o vocalista dizia thank you parecia estar a dizer fuck you - não era ironia, era só sotaque brit, e era sensaborão.
Veronica Falls.
Fiquei sempre à espera que acontecesse alguma coisa que não chegou. Às vezes parecia que aí vinha um pequeno apocalipse noise, um abismo gótico ou um impulso desenfreado para enfrentar de guitarra o horror, mas não, não houve oásis, só um vago aborrecimento de indie brit pop. Deu-me saudade de ver dois fantasmas vivos e de uma coisa que nunca aconteceu: Morrissey amarrado, esticado a cantar numa corda puxada pelos Jesus and Mary Chain.
Hot Chip.
Há quem seja adepto do cientismo de Alexis Taylor e da sua cientologia pop, mas a mim parece-me como Dan Brown ou a literatura plana e de demasiada claridade, literatura calculada escrita com embalos de sossego, sem armadilhas ou reais ciladas ou ardor. Às vezes aquilo é galvanizante e a encosta desata de braços no ar (não toda, a metade maior, da mesa de som até ao cimo, está sentada), quando se lança nas pequenas épicas de crescendum da indietrónica . Mas no fim aquilo parece-me música que não está a evoluir, música para ouvir em salões de casacos demasiado brancos ou demasiado grandes e grandes barcos de água estacada, música para desaguar em casinos cansados.
Pop polifónico de fim de tarde, agudo, cheio de claridade e falsetto, demasiado inofensivo ou demasiado vegetariano. Quando o vocalista dizia thank you parecia estar a dizer fuck you - não era ironia, era só sotaque brit, e era sensaborão.
Veronica Falls.
Fiquei sempre à espera que acontecesse alguma coisa que não chegou. Às vezes parecia que aí vinha um pequeno apocalipse noise, um abismo gótico ou um impulso desenfreado para enfrentar de guitarra o horror, mas não, não houve oásis, só um vago aborrecimento de indie brit pop. Deu-me saudade de ver dois fantasmas vivos e de uma coisa que nunca aconteceu: Morrissey amarrado, esticado a cantar numa corda puxada pelos Jesus and Mary Chain.
Hot Chip.
Há quem seja adepto do cientismo de Alexis Taylor e da sua cientologia pop, mas a mim parece-me como Dan Brown ou a literatura plana e de demasiada claridade, literatura calculada escrita com embalos de sossego, sem armadilhas ou reais ciladas ou ardor. Às vezes aquilo é galvanizante e a encosta desata de braços no ar (não toda, a metade maior, da mesa de som até ao cimo, está sentada), quando se lança nas pequenas épicas de crescendum da indietrónica . Mas no fim aquilo parece-me música que não está a evoluir, música para ouvir em salões de casacos demasiado brancos ou demasiado grandes e grandes barcos de água estacada, música para desaguar em casinos cansados.
The Knife
Aos géneros synthpop, dark disco, ambiental, minimal, e techno teatral experimental, os The Knife têm que acrescentar outro agora: exclusivamente-coreográfico-se-tocado-ao-vivo. Com formação em octeto, a banda sueca fez uma coisa inédita e extraordinária ao vivo: chegou a ter os oito elementos em palco e estar longamente em playback total, vocal e instrumental. Perante isto, só sobrava vermos a única coisa que havia ao vivo: a voz de Karin Dreijer Andersson, voz aguda, angulosa e de cristal, mas que ali esteve sempre encapuzada numa ausência espectral. Projectados para enfeitiçar ou enfurecer o público, provocaram coisa infinitamente pior: deixaram tudo na bruma da indiferença, sem paciência para a ironia de collants, a coreografia e o coordenado liceal, sequer da sua aeróbica Trekkie espacial. As réplicas deste pequenino trémolo equivocado para prato principal hão-de prejudicar o futuro do festival.
Little Boots
Discoteque eurotrash com a vontade de um arrastão a andar para trás em direcção ao strob de 1980. É música óptima para a pequena alienação, enquanto se está ali, debaixo daquela batida protectora de cores e do caleidoscópio discopop, nada de mal pode acontecer, parece que estamos protegidos do mundo. Mas insistido e visto ao perto, vemos que Victoria Christina, a Little Boots de Blackpool, loira com uma capa que quer esvoaçar, está ali como podia estar no quarto dela, a cantar para o espelho, a acreditar no seu secador e no vento da fama e da eterna juventude.
Echo and the Bunnymen.
O post-punk chegou aqui como um cadáver hirto e exumado. 'Lips like sugar' já não é uma mulher fogosa que foge, já não é um cisne, já não flutua, é só uma boneca balofa insuflada, com menos vida que a Gina, a boneca escachada que se passeia nua e labial nas encostas e no rio e num grupo folgazão do festival.
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quinta-feira, agosto 15, 2013
José Miguel Gaspar: Coura, Dia 2
Alabama Shakes
Alabama Shakes
"- Se fechares os olhos quando ela canta o que é que ela te parece?
- A mim parece-me um homem. Mas um homem mais baixo.
Não sabíamos que Brittany Howard era tão gorda e tão grande como uma cama (eu pelo menos não sabia, sou dos antigos, continuo a consumir só os áudios, não vejo os vídeos), nem que o baixista Zac é um sósia de Zack Galifianakis, mas um Zack imenso e sério e petrificado que só mexe dois dedos debaixo da túnica e da barba inamovível. À quinta canção, já eles tinham tocado 'Hang loose' e 'Hold on', lenta e linda que nos pôs a dançar e a dizer que sim com o torso, como se fossemos salomónicos que dançam sem cabeça e sem membros, e ela já estava a dizer que gostava muito de nós (mas disse-o enrolado, na sua língua americana cheia de sul). Ao sexto tema, com a tenda Vodafone FM atulhada e cinco vezes mais gente que transbordava até às escotilhas, ela parou e disse isto: 'Esta canção não é uma canção triste. Esta canção é sobre aprender a lição'. E atacou, com lentidão encorpada e dulcíssimos golpes (atacou: a canção faz estremecer e ter frio), e entrou-nos com aquela voz grave e de agudos estrídulos, como uma catana pelo coração adentro com 'Heartbreaker', a canção fulminante dos amores prostrados: 'Why, why did you have to slice so wide baby/How was I supposed to know you was a heartbreaker'. Aquilo, e aquilo foi o concerto da noite, é Alabama Shakes, é soul do sul: três acordes, blues e raízes gospel, doe quando é lento, arde e rosna quando é rápido. Os mais exagerados, os do meio e da frente, os que saíram a ressumbrar, falavam na qualidade confluente de vários espíritos, três mortos e um vivo, que ela, Brittany Howard, incorpora, como se ela fosse duas mulheres e dois homens: Winehouse e Simone, Ottis e Prince, nem menos. No fim ela parecia uma cama suada, feliz e desgrenhada.
U.M.O.
Ao vivo, a pop psicadélica da Unknown Mortal Orchestra (trio, EUA) é uma coisa fuzzy emaranhada cheia de wah wahs. Em disco não, mas ao vivo sim, parece-me música para ancas tortas ou para lagartos que levam choques eléctricos e ouvem excessivamente Tame Impala. Ali, na tenda preta que é sempre pequena para tanta gente (e que tem um chão demasiado duro), a voz do vocalista Ruban Nielson parece batida pelo vento, sai fatiada como as vozes de certos desenhos animados agudos, e ele toca a guitarra como se fosse um cossaco ou como se estivesse sempre prestes a perder o chão. Os da frente, os surrealistas e os desesperados, os que estão no vórtice do som, gostaram muito e guincharam, mas não foi grande pistola.
Bombino
Omara Bombino não é nenhum Omar Souleyman (Souleyman é só uma cassete e uns Ray Ban de kaffyeh com pernas curtas) e já tem pelo menos três recordes de Coura 2013: é campeão do salto em comprimento lento (tem mantras de 21 minutos que são faraónicas cavalgadas eléctricas); foi o único a fazer encore (nos festivais de agora o poder legislativo do improviso foi absorvido pelo poder executivo do patrocinador e da sua ditadura da pontualidade); e foi o que teve mais e melhor crowdsurfing (o único concerto onde se nadou licenciosamente e sem peias, com pernas pelo ar e mergulhos de bruços no mar de braços do povo). Bombino, um tuareg do Niger que se dedicava à desértica contemplação e à pastorícia, salta agora com o robe dourado de Cassius Clay, como se fosse um boxer invicto que luta de guitarra. Parece aprendeu a tocá-la a decalcar riffs de vídeos de Jimi Hendrix e de Mark Knopfler (mas também podia ter aprendido no Air Guitar, o jogo dos guitarristas imaginários). Graças a Deus e a Alá, aprendeu mais com os 15 minutos psicoeléctricos do 'Voodoo child' do que com toda a discografia do sultão serôdio do swing.
O seu jogo é hábil:
O seu jogo é hábil:
canções construídas em torno de riffs resistentes (são enganosamente simples mas estão em movimento perpétuo de justaposição e overdub), polinização cruzada de rock, blues e deserto, e aquele transe inacabável do trance que garante as alienações e os arroubos de espírito. O seu baixista, o único inteiramente enrolado no tagelmust branco , é o meu cromo favorito, um baixista de ferro que bamboleia sem nunca despegar os pés, como se tocasse atado a camelo que vai num trote interminável."
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quarta-feira, agosto 14, 2013
José Miguel Gaspar: Coura, Dia 1
Sensible Soccers
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segunda-feira, agosto 12, 2013
quinta-feira, agosto 08, 2013
Contagem descrescente III. Coura, 13 de Agosto
Já os vimos mil vezes, mas estes tipos são demasiado bons para não se verem sempre.
Em Coura, será especial.
terça-feira, agosto 06, 2013
Contagem decrescente II. Coura, 17 de Agosto
A canção (o concerto?) que vai deixar a encosta a chorar.
(Obrigada, Germano.)
segunda-feira, agosto 05, 2013
Em contagem decrescente. Coura, 14 de Agosto
Now that you’re gone
It’s been a long lonely time
It’s a long, sad lonely time
Rolling along, I'm in a strange state of mind
It’s a strange old state of mind
Memories they mess with my mind
Who am I to deny
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