segunda-feira, março 04, 2013

Fernando Sobral: O ventilador



Durão Barroso descobriu que não é o presidente da Comissão Europeia: é um técnico de ventilação. As suas declarações, há dias, em que colocava as culpas da crise portuguesa num ventilador, esperando que estas se espalhassem à sua volta e não o atingissem, mostram que ele acredita que é possível apagar a história. É óbvio que foram as opções erradas, em termos políticos e económicos, que fizeram com que Portugal se afundasse na crise.


Mas Durão Barroso não é um eremita nos Himalaias: foi chefe de Governo entre 2002 e 2004, assinou por baixo a política do betão que hegemonizou a economia nacional, debandou rapidamente para Bruxelas, não sem antes ter deixado uma bomba-relógio política que criou o período de Sócrates.

O dislate político, como se sabe, sempre foi um inimigo maior da verdade do que a mentira. E as declarações de Durão Barroso parecem uma esponja cheia de um detergente de marca branca para a limpeza da memória. Não o é. Para além da sua passagem pelo Governo, onde não foi o homem invisível, a sua presença na CE é determinante para a crise actual. Não porque mande alguma coisa.

Mas porque Bruxelas é uma caixa de ressonância de Berlim. Depois, Barroso tenta usar o ventilador de uma forma mais sofisticada: quer que os resíduos não atinjam a Europa. Nada mais impossível.

A Europa é parte do problema e não da solução. Foi com Barroso à frente que a UE pediu para que os governos fizessem investimento público. O resultado foi um aumento brutal da dívida pública. Depois, sob a batuta alemã, fez da austeridade cega a única política europeia. É este monte de resíduos que Barroso quer eliminar. Como se a memória se atirasse para o ventilador.


[Hoje, no Jornal de Negócios]

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