Em doze horas o PSD trocou uma resolução onde criticava o aumento de impostos pelo... aumento de impostos. Há, de facto, um enorme problema com a política. Chama-se realidade e é bem dura.
Ir aos congressos partidários é um divertimento a que raramente fujo. Sei que a maior parte dos portugueses acha aqueles encontros assustadores, mas a verdade é que são a melhor maneira de visitar políticos no seu habitat natural. São comícios em larga escala feitos para os mais fiéis e fanáticos seguidores. Se quiserem, são uma espécie de safari político.
O congresso do CDS em Viseu valeu a viagem. Não apenas pelos discursos e conversas, mas por uma evidência: o discurso de governo que o partido fez, apesar de bem ariculado, não partia da realidade. Falava de uma agenda de crescimento inteligente. Mas esquecia que nos próximos meses, o que os portugueses vão ter é aumento de impostos, corte de prestações ou as duas coisas. Ou seja, esquecia a realidade. Prometer o crescimento sem falar do presente imediato ou da brutal convergência orçamental é dar um salto no tempo e no espaço. É ler um livro e saltar o capítulo mais difícil.
Se isto é estranho no CDS é bizarro no PSD. Pelas minhas contas, o partido tinha neste momento quatro frentes a coligir ideias e propostas: Aguiar Branco andava a fazer o programa do partido, Carrapatoso a montar o remake dos Estados Gerais, Catroga o programa eleitotal e José Manuel Canavarro animava o gabinete de estudos. Mas até agora não tinham falado de aumentar o IVA. Só isso explica que o grupo parlamentar do PSD tenha escrito esta pérola na resolução que deitou abaixo o Governo: "O PEC mantém a receita preferida deste Governo: a solução da incompetência. Ou seja, se falta dinheiro, aumentam-se os impostos." Doze horas depois, o líder do PSD anunciou que estava pronto a aumentar o IVA...
Nem vale a pena explorar esta contradição. É básica de mais para que se perca tempo com ela. Mas leva-nos directamente para a questão que o congresso do CDS me levantou. O PSD tem feito um bom trabalho de casa, tem boas pessoas a colaborar, mas parece alheado da realidade imediata. O PEC 4 pode ser chumbado. Mas a Europa vai exigir uma solução alternativa imediata. Fazer uma resolução a recusar aumento de impostos é estranhamente incompetente.
A grande vantagem das crises é o choque com a realidade. A conversa redonda dá lugar à verdade. Afinal, a Fitch e as suas duas manas estão-se nas tintas para a política portuguesa, para Sócrates ou Passos. O que querem é ver o PEC 4, 5 e 6. É neste quadro que partimos para umas eleições que, se forem clarificadoras, podem ser importantes. Mas o PSD pode pôr os seus livros na estante por uns tempos. E escrever um capítulo verdadeiro com o título: "Preparem-se, vamos cair!".
[Hoje, Expresso]
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