Portugal, arruinado, vive da ajuda temporária dos bancos centrais. Não chega: a uma bicicleta em queda livre de nada servem as rodinhas. Servirá mudar o ciclista? O PSD pensa que sim, quer eleições e diz porquê - mas não sabe ainda explicar para quê.
O PS tem, desde o início, um Governo com medo de cair; o PSD tem, desde Passos Coelho, pressa em ascender. Um e outro parecem decidir o que fazem não em função do que é melhor para este cromo de uma caderneta alheia que é hoje Portugal, mas sim do seu poder, partidário e pessoal. A ajuda externa pode precipitar, na nossa queda, a do Governo. Desde 2008 que não se governa em Portugal. Em 2011 somos governados de fora. E José Sócrates, mesmo que não tenha sido culpado deste descalabro total, foi o primeiro-ministro a quem confiámos, a partir de 2005, que nos salvasse dele. Fracassou. A teoria da vitimização, que é outra face da negação que a precedeu, é uma cobardia. A tempestade é igualmente devastadora, mas as naus são os outros, de bote vamos nós.
A ajuda externa, de uma forma ou de outra, virá. E o PSD, que se preparava para provocar eleições com o chumbo do próximo Orçamento do Estado, pode ter oportunidade de desalojar Sócrates até ao Verão. Isso, e as sondagens, colocam Pedro Passos Coelho possível próximo primeiro-ministro. O próprio já o pressente e, depois de andar semanas a mandar calar os excitados que o adulam, mudou no fim-de-semana. Já tem coordenador para o programa eleitoral. Já pediu uma maioria clara. Já ataca o tabu da estabilidade - já arregaça as mangas. Está na hora de ser exigente com Pedro Passos Coelho. E das duas dúvidas que ele levanta: a sua consistência ideológica e a sua autonomia face a quem o rodeia.
Ser consistente significa poder mudar de opinião sem dobrar a convicção. É ser guiado pela sua própria cabeça e não pelo pensamento dominante em cada altura, tão histriónico quanto volúvel. Passos Coelho diz bem quando diz: isto é o que eu defendo, esta é a minha social-democracia, é vossa a opção de me dar poder ou não. Mas depois mostra-se plasticina quando os temas fracturam: na revisão constitucional; na privatização ou encerramento das empresas públicas perdulárias. Uma boa questão mal colocada - que ninguém percebeu e, pelos vistos, nem o próprio. Bastaria dizer: o Estado define, e paga, o que é serviço público; com essa receita do Orçamento, a empresa tem de ter equilíbrio económico. Não é mais aceitável engrossar dívidas "porque sim".
Ser autónomo é ser independente do partido que o vai corroer com as pressões, cunhas, lóbis, interesses, corrupções, conspirações. E aí, lamento se estou a ser injusto, olha-se à volta de Passos Coelho e fica-se com medo. Imagine-se um Governo com Miguel Relvas como ministro da Presidência, Marco António Costa nas Obras Públicas, Diogo Leite Campos na Justiça ou Jorge Moreira da Silva no Ambiente. Passos Coelho não resistirá a ser olhado como líder de gente fraca ou a tratar do "business". O facto de Eduardo Catroga ter sido chamado para credibilizar o PSD é em si mesmo uma demonstração dessa fragilidade. Em breve, o grupo "Mais Sociedade" trará outras capacidades mas o PS dirá, apontando para António Carrapatoso, Joaquim Goes ou Rui Ramos, que o Compromisso Portugal tomou conta do PSD. Nessa altura, o que fará Passos Coelho? Demarca-se, compromete-se, assume-se abaixo ou acima disso?
Passos Coelho tem de mostrar que foi ele que escolheu os seus conselheiros, não que foram os seus conselheiros a escolhê-lo a ele. Só se o for merecerá o que quer: ser o próximo primeiro-ministro de Portugal. Porque nós, nós o que queremos é que quem o for interrompa esta infinita tristeza de não gerar um Governo de jeito em décadas.
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