quinta-feira, março 24, 2011

Matthieu Baumier: A democracia totalitária


Em 2007, Barack Obama ainda não tinha sido apresentado aos Estados Unidos e ao mundo como o homem que haveria de salvar-nos ou, pelo menos, restituir-nos aparentemente a esperança. Em 2007, ainda não tinha estourado a crise do subprime (ou já tinha, mas só muito lentamente começava a ser revelada) e a pirâmide de Madoff ainda não tinha sido desmantelada numa ventania que faria tremer parte do mundo. Em 2007, a União Europeia ainda não tinha equacionado desfazer-se ou, nessa improbabilidade, tramar os parentes pobres. E o Euro ainda valia mais do que o Dólar. Mas o Muro de Berlim já tinha sido derrubado há muito e, com ele, os regimes soviéticos da Europa. O Iraque já tinha sido invadido e o 11 de Setembro já nos tinha familiarizado com uma coisa chamada Al-Qaeda. Dizer Ocidente já passara a significar outra coisa. Foi nesse contexto, no contexto do que já tinha mudado, que Matthieu Baumier publicou um livro sobre a inversão da realidade - no mundo e em cada um de nós - a que agora vale a pena voltar. Sobretudo à luz dos dias que correm...

A teoria gira toda em torno do que ele diz ser a pós-democracia (numa espécie de duelo invisível, mas constante, com Raymond Aron), que ilustra em vários cenários e que, cosendo tudo, define assim: "Ela é um estado servil da sociedade, em que o imaginário permanece o da liberdade e da igualdade, mas em que uma das suas principais características é a primazia do bem particular sobre o bem comum. (...) Entrámos na era da pós-democracia sem verdadeiramente nos darmos conta, como cegos e inocentes daquilo que construímos, pretendendo hipocritamente executar o exacto oposto daquilo em que entrámos. É o tempo da guerra permanente a todas as escalas da vida e do homem. Da guerra permanente interiorizada como normalidade. (...) O pós humano pós democrático dá uma contra-civilização não civilizada. (...) Trata-se de um retrocesso e a esse recuo chamamos, sem ironia, liberdade. Eis uma liberdade que me parece ter o gosto amargo da alienação colectiva aceite."

Na impossibilidade de citar o livro inteiro, fica a ideia: 

"Trocamos o prazer e o conforto a favor na nossa liberdade, o que quer dizer que em nome de uma paixão democrática radical, a paixão da igualdade, assassinamos o conceito de alicerce da própria democracia, a liberdade. (...) A democracia não vive somente das suas forças, ela vive também das suas tensões. Portanto, vive sob o jugo de um risco permanente: o de deixar de ser ela própria, antes de simplesmente deixar de ser. Estamos no exacto momento em que a democracia deixa de ser ela própria. Aí começa a servidão.

A história da democracia decidiu por nós: a democracia social, directa ou radical falhou. 
Nós entrámos na noite.
E já não compreendemos este mundo. É por isso que o transformámos numa grande Imagem. É por isso que nos escondemos na Imagem que constituímos do mundo. Somos aparências escondidas no coração de uma Aparência."

1 comentário:

  1. "Quem prescinde da liberdade essencial para garantir uma pequena segurança temporária não merece nem a liberdade nem a segurança." (dizem que de) Benjamin Franklin

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