[Olivia Bee]
Acabou. Está tudo bem, não faz mal, tanto faz. Há dias assim, muitos, em que a vida continua, fervilhante ensaio feliz, e a tua ausência é só um vestido a mais, supérfluo, esquecido no armário que guarda tantos, à espera de um estímulo, de um sol, de um dia se ele houver de vir. Penso, acabou, não faz mal, tanto faz, está tudo bem. Mas há dias, mais, em que está tudo mal, já não tanto faz, faz todo o mal. Dias em que te não sei e quero, em que te não tenho e preciso, em que me perco e tropeço, disco de embraigem colada, engasgo-me e caio. E caio. E do fundo não te procuro, não posso, não quero, não creio, engulo em seco a memória, mordo os lábios da promessa. Até passar. Sem chorar, embora tudo em mim chore. Esse amor construído à pressa. Num incêndio. Minuciosa, desmesuradamente perfeito. Milimetricamente cúmplice, coincidente, raro.
O epitáfio em fragmentos insaciados. As palavras a apagarem-se na boca. Redescubro-te no silêncio e em sensações homófonas. Soam ao mesmo, não sabem ao mesmo. Nada. Sabem a sal e cinza. Já não sei quem és, mas sei que não és tu. E sei que nunca mais te verei, mesmo que mil vezes te veja. Já não és tu. Ainda és real e já não és. Tens rosto, nome, talvez até o mesmo cheiro. Os mesmos dedos finos, a mesma voz. O mesmo sonho. Se te vir sei quem és. Sabê-lo-ía de olhos fechados em qualquer parte do mundo. Só pela pele. Por fora. Mas já não és tu, aqueles já não são os teus olhos. De luz onde agora há sombra. São os olhos de um suicida em fuga do medo, de ave presa num voo desistido. Nunca te reencontrarei. E só por isso não te procuro, não te chamo. Não te digo que te amo. Ainda tanto. E que nada me apazigua, nem o tempo nem a distância. E que às vezes ainda me engano. E o adeus me parece gralha.
Acho isto bonito.
ResponderEliminar