sexta-feira, janeiro 02, 2009

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[Stefanie Schneider]


Nunca me zango com ninguém. E devia. Sou incapaz de insultar alguém, de dizer "acabou", de cortar relações. Não consigo sequer ficar profundamente ofendida com alguma coisa. Pelo menos, ofendida a ponto de a coisa me parecer irreversível. Posso amuar, chorar, emudecer, mas não é a mesma coisa. E até tenho mau feito, praguejo com facilidade, não sou propriamente a pessoa de quem as pessoas gostam à primeira (nem à segunda nem à terceira...), nem o tipo de moçinha sobre quem dizem: "Que querida, que simpática". Tenho mau feitio e isso já não é mau. Mas não chega. Porque não me zango. E as pessoas que nunca se zangam com ninguém não são levadas a sério.
As pessoas, para serem levadas a sério, têm que se zangar. Mesmo. Têm que ter pelo menos uma história, que serve como pré-aviso, em que possam dizer: "... e depois, pronto, nunca mais lhe falei." Têm que estar na disposição de levar a delas avante e não ceder um milímetro, como se disso dependesse o futuro da humanidade. Têm que se ofender visceralmente com uma palavra ou uma frase fora do sítio. Ou com um gesto ou atitude que foi ao lado. Ou não foi a lado nenhum. Têm que não conseguir perdoar, seja o que for, ou perdoar mas serem capazes de nunca dizer que o fizeram. Têm que ter paciência para esperar que o agressor um dia peça desculpa, mesmo sabendo que esse dia pode nunca chegar. Têm que ser quase capazes de castigar, não atender um telefonema, não responder a uma mensagem, mudar de café e de hábitos, se necessário for. Resistir ao aniversário, ao Natal e a todas as efemérides que nos unem em rede.
As pessoas que se zangam são respeitadas e levadas a sério porque provocam nos outros o medo de as perder. Eu nunca me zango. Não consigo. Nem é por não ter tempo para me zangar que não me zango. Ou por não ter paciência. Por não dar essa importância aos outros ou por ser particulamente boazinha. E também não sei bem pelo que é, pelo que só pode ser uma incapacidade qualquer sem nome. Mas tenho pena.
As pessoas que nunca se zangam são pessoas um bocadinho desprezíveis, são pessoas que não valem o esforço. E são um perigo para a humanidade, porque tendem a criar monstros. Uma pessoa normal que se dá com uma pessoa que nunca se zanga nunca poderá ser uma pessoa melhor. À partida, está-lhe vedada a reflexão sobre os seus actos, a revisão que lhe poderá ensinar o significado essencial da palavra "desculpa". E depois fica cega do valor do outro. Porque o outro, o que não se zanga, volta sempre. Em nome da paz. Mas quem é capaz de enaltecer essa paz se sabe que a seguir a uma guerra ganha ganhará outra e outra e outra?

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