Ele bem dizia que seria compreendido em 1900! Em 1900, fim do século XIX?! Em 2010, em pleno século XXI! Dirá bem do livro, mas muito, muito mal de nós. "O vermelho e o negro" foi escrito há 180 anos; poderia ter sido escrito hoje de manhã. É o retrato fidelíssimo de uma sociedade cuja ambição, de tão cega, substitui as escadas pelo elevador. O retrato de uma sociedade separada por corredores intransponíveis, e cujas aparências são tudo, mesmo quando traídas pelo fervor da paixão. O livro de Henry Beyle, verdadeiro nome do senhor, não é sobre a sociedade parisiense; é sobre o mundo quase todo. O dito desenvolvido, pelo menos. Não chorei no fim, como me tinham garantido, porque desde o início não empatizei com Julien Sorel, mas, sem querer exagerar, este é bem capaz de ser um dos melhores livros que alguma vez li.
"Não é o amor que se encarrega da fortuna dos jovens dotados de talento como Julien; prendem-se com um abraço invencível a um grupo e, quando este triunfa, tudo o que há de bom na sociedade chove sobre ele. Desgraçado do homem de estudo que não pertence a grupo algum; censurar-lhe-ão até os pequenos êxitos bastante incertos, a alta virtude triunfará roubando-o. Senhor, um romance é um espelho que se passeia ao longo de uma estrada. Tão depressa reflecte aos nossos olhos o azul dos céus como a lama dos lamaçais da estrada. E o homem que leva o espelho no seu alforge será por vós acusado de ser imoral! O seu espelho reflecte a alma, e vós acusais o espelho. Acusai antes o caminho onde está o lamaçal, e mais ainda o inspector das estradas que deixa empoçar a água e formar o lamaçal..."
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