Bem sei que do ponto de vista do porreirismo que nos é sempre exigido e que nós gostamos sempre de ostentar isto poderá parecer psicologicamente meio monocórdico. Dito de outra forma: sem sal. Mas a verdade é que poucas coisas me concedem maior prazer ao fim-de-semana do que ler a imprensa nacional quase toda. Pilhas e pilhas de papel prendem-me durante dois dias com muito mais eficácia do que qualquer encontro social, cultural ou familiar. Porque está lá tudo. E, volta e meia, quando menos esperamos, quando apenas viajamos inocentemente pelas referências do jornalismo português, somos também brindados com doses infindáveis de humor. Este fim-de-semana de chuva, trovoada e saraiva foi uma espécie de euromilhões... com notícias "a criar excêntricos". Do melhor! 1. Anda Mário Soares empenhado, à beira do limite e do desequilíbrio, a espicaçar Cavaco Silva - qual moscardo de Platão!! -, para tentar que o homem rompa o silêncio e reaja a qualquer coisa e ele nada. E depois responde a Miguel Cadilhe só porque o seu ex-ministro das Finanças o citou, completamente a despropósito, numa conferência, no Porto. Não é justo.
4. Santana Lopes não é homem de uma piada só. Por isso, no mesmo artigo, atacou também Jorge Sampaio, que acusa de ter dissolvido o Parlamento depois de ter lido a oração de Cavaco e, com isso, ter prejudicado o país. E vou citar, porque nada poderá ser melhor do que as palavras do próprio:
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domingo, novembro 27, 2005
Imprensa a criar excêntricos todas as semanas
Isabel Pires de Lima
"Estou preparada para ir embora amanhã" Ministra da Cultura analisa os dossiês mais complicados dos seus dez meses de governação Contestação feroz das companhias de teatro do Norte pelo atraso na distribuição dos subsídios; avanços e recuos no desenho do modelo de gestão a aplicar na Casa da Música; a herança de uma capital da cultura invisível acima de Faro; e o rotundo falhanço do Instituto das Artes com Paulo Cunha e Silva. Dez meses à frente do Ministério da Cultura, Isabel Pires de Lima continua a liderar complicados dossiês. O desgaste da sua imagem advém, no entanto, de um terreno improvável: a obra pública do Túnel de Ceuta, no Porto, e o braço de ferro que mantém com o presidente da Câmara, Rui Rio. (Entrevista de Helena Teixeira da Silva e José Miguel Gaspar publicada no Jornal de Notícias a 26 de Novembro de 2005) Reconhece que o Túnel de Ceuta , no Porto, desgastou a sua imagem enquanto ministra da Cultura? Uma vez que o dossiê foi acompanhado de acções no sentido de formar uma determinada imagem minha, com outdoors espalhados pela ciodade, é natural que isso tenha acontecido. Surgiu num momento eleitoral, o que fez com que fosse empolado ao nível da mediatização excessiva da imprensa e da própria autarquia. Mas procuro ler a coisa ao contrário: espero que tenha tido uma função pedagógica no sentido de sensibilizar a população para o facto de que tudo o que acontece no espaço público é cultura também. O resultado foi uma vitória política para si? Pode haver essa leitura. Mas foi sobretudo uma vitória da preservação do património. Sei que para a maioria das pessoas não é fácil entender que uma obra, que pode facilitar a circulação e a sua vida, seja posta em causa em nome de um Museu (Soares dos Reis). Daqui a uns anos entenderão mais facilmente. Entretanto, o ministro António Costa e o próprio primeiro-ministro tomaram conta do dossiê. Foi ouvida nas negociações em curso? Isso surpreende-se. Não conheço essas negociações. Rui Rio assumiu que essa negociação existe e não foi desmentido. Só lhe posso dizer que não tenho absolutamente ideia nenhuma de qualquer contacto com o ministro António Costa. Ninguém falou comigo. Para mim, o dossiê é meramente técnico, embora Rui Rio lhe tenha dado uma inclinação política. Inclusive, deu a entender que não se importará de prolongar o Túnel, desde que alguém o pague... O IPPAR não me deu conhecimento de que tenha havido alguma proposta dessa natureza. Teve algum indicador do IPPAR - que já tomou conta da obra -, do que vai ser feito? Há um processo judicial a correr. A tomada de posse administrativa decorre exactamente desse processo. Dei poderes ao IPPAR para tomar posse administrativa da obra. O IPPAR executará essa tomada de posse quando entender (há prazos para o fazer) e porventura, na sequência disso, haverá a apresentação de um projecto para a reposição do trânsito à superfície e depois a abertura de um concurso que seguirá os trâmites normais. Insiste nisso à margem das negociações que diz desconhecer? Ao contrário do que me está a dizer, a informação que eu tenho para lhe facultar é que não aconteceu nada. Com o ministério e o IPPAR não tenho conhecimento de qualquer negociação. Se houver, com certeza que todo este calendário poderá ser alterado. Depende do que acontecer. Até ao momento, não aconteceu nada. E já gastei muito tempo com este dossiê quando deveria ter-me debruçado sobre outros. A Casa das Artes, também no Porto, está fechada há mais de um ano e a ruir. O espaço poderá acolher um pólo da Cinemateca, como foi promessa do anterior governo? Esse é um dossier que irei repensar a curto prazo. É da maior gravidade que um equipamento daquela qualidade esteja na situação em que está. Temos que encontrar uma solução a breve prazo. Não faz sentido que esteja fechado por razões de falta de segurança. A Casa das Artes ser uma espécie de braço da Cinemateca no Porto é uma possibilidade que faz sentido. Além de que o espaço faz falta – o Porto tem poucos espaços daquela natureza para exposições. Com aquela dimensão só tem mesmo o da Biblioteca Almeida Garrett. Não trabalhei ainda essa ideia mas tenho que o fazer. Concorda que o Porto deve ter acesso aos filmes da Cinemateca? Concordo inteiramente. Essa não é a única solução para a Casa das Artes – o equipamento tem polivalência artística – mas essa é uma das vertentes que merece ser pensada. Não estudei ainda o dossier. Não posso dar ainda uma resposta taxativa. No entanto, a ideia de haver uma sala no Porto onde se possam ver filmes que só são exibidos na Cinemateca faz todo o sentido. Não sei se será um pólo da Cinemateca ou se passará apenas pela exibição de filmes que os lisboetas vêem na Cinemateca. Acho que a Casa das Artes será o espaço mais vocacionado para isso. Ou para a exibição de outro tipo de filmes que começam a não ter espaço comercial nas salas do Porto.
Não sei o que implica. Tenho que estudar o dossier. Há uma coisa que é clara: uma das funções das políticas culturais do Estado é a defesa da diversidade cultural. Em relação ao cinema passa pela defesa de filmes que não são eminentemente comerciais. Concorda que o actual panorama não defende essa diversidade?
A ministra da Cultura chegou a acordo com os fundadores da Casa da Música em relação a temas que durante dez meses os afastaram, mas o equipamento está longe da solução não há calendário para nomear o director artístico e é necessário mais capital social. Com tantos e tão complicados dossiês, quantas horas trabalha por dia? Muitas. Sempre à volta de 12, às vezes 14 horas. É normal, mas não é desejável. Se a minha passagem pelo Governo durar quatro anos... Coloca a sua continuidade no campo das hipóteses? Não há lugar que seja mais perecível do que um lugar executivo desta natureza. Estou preparada para deixar a minha secretária amanhã. Em termos psicológicos estou sempre preparada para poder sair no dia seguinte. Em primeiro lugar porque é realmente assim; e depois porque é assim que deve ser. Quando tomou posse, em Fevereiro, qualquer decisão sobre o modelo de gestão da Casa da Música (CM) seria já tardia. Ainda assim, houve inúmeros recuos e avanços para depois regressar à solução inicial... Não voltamos à solução inicial... A CM é uma Fundação... Sim, mas a solução inicial nunca esteve em causa. A única coisa que disse é que se não fosse possível a Fundação, encontrar-se-ia outra solução. Não íamos fechar a Casa da Música! Faltou coragem política para avançar com a solução de instituto público quando os privados, em Outubro, anunciaram a ruptura nas negociações? Os privados tiraram com uma mão e deram com a outra. A meio da declaração manifestaram disponibilidade para continuar a conversar. De facto, tivemos avanços e recuos em relação ao modelo de gestão, mas sempre dentro do quadro da Fundação. Internamente coloquei outras hipóteses, mas nem sequer esgotei o modelo de Fundação. Porque haveria hipótese de, dentro disso... Encontrar outros parceiros... Evidentemente. Já chegou a acordo com os fundadores em todos os pontos? Já. Afastava-nos o modelo de gestão, o financiamento e a integração da Orquestra Nacional do Porto. A direcção artística não foi também alvo de discórdia? Isso foi empolado pelos media, mas não houve dificuldade. Defende o nome de Pedro Burmester para a direcção artística? Ele estará sempre ligado à Casa da Música e será sempre uma peça fundamental - é um músico da cidade e esteve ligado ao projecto. No que diz respeito a ser ou não director, o bom senso dita que não deve introduzir-se na negociação peças que possam criar dificuldades. Procurei não pessoalizar. O nome dele causava ruído? Não me cabe escolher, cabe ao Conselho de Administração. Prezo muito o Pedro e o projecto que gizou para a CM, mas ele não é o único nome possível. O mercado das direcções artísticas é global. A Casa não fecha se ele for para o Japão. Se o CA o escolher, os representantes do Estado não objectarão. Irá sugerir o nome dele? Ainda não conversei com os representantes do Estado sobre isso. É vantajoso ver o projecto executado por quem o concebeu? Não acho que o Pedro seja vital para a CM. A minha preocupação é assegurar que a CM irá contribuir para a qualificação do tecido musical português, e para que a música, em Portugal, tenha forma de aceder a circuitos internacionais. Para mim está tudo certo, com ou sem Pedro, desde que esteja certo. Existem muitas soluções no mercado português? Não. Por isso, é que é natural que se recorra ao mercado internacional. Serralves recorreu O convite será feito até ao final do ano? Não sei responder a isso. Não há urgência em encurtar os prazos? Há. Mas também há necessidade de fortalecer o capital social. Tenho necessidade de ver alargado o leque de fundadores. Não posso chamar toda a responsabilidade de financiamento para o Estado. Faz sentido continuar a comparar o modelo ao de Serralves? Não são universos comparáveis Não podemos continuar a caucionar a reclamação dos privados, que investem muito menos na CM. E por isso é que há uma diferença no modelo na gestão aprovado para a CM, que não é absolutamente idêntico ao de Serralves. Na CM existe uma maioria qualificada com poderes no plano de actividades, direcção artística e orçamento. Isso permite-nos controlar o projecto cultural. Foram negociações difíceis e lentas. Há maioria qualificada, mas não um presidente com poderes especiais, como chegou a reclamar... Fez parte das cedências mútuas. O CA passou de cinco para sete membros, exactamente no sentido de defender o Estado. Ao contrário do que diz, Artur Santos Silva afirmou que os privados não cederam nada... Como negociador, ele é melhor do que eu (risos). E sabe que só se chega a acordos com cedências mútuas. Ele também disse que agora o mais difícil será definir o contrato-programa... Não é verdade. Já está numa fase muito avançada. Será aprovado até ao final do ano. Os estatutos já foram aprovados? Não. Os fundadores pediram mais tempo para procurar co-fundadores. Neste momento há mais 12 assegurados. E dos 18 iniciais, houve uma queda. Também neste dossiê houve intervenção de José Sócrates. Foi determinante? Só interveio no fim para mostrar o quanto o Governo se empenhou nesta solução. "Instituto das Artes foi mal gerido"
As artes cénicas no Norte ficaram fragilizadas devido à providência cautelar que levou à suspensão dos subsídios. Entende que o problema fica resolvido por ter pago, na sequência da decisão do tribunal, as verbas às companhias de teatro? Sempre disse que o dinheiro estava pronto a ser pago, e que não tinha sido desviado, como foi difundido pela antiga direcção do Instituto das Artes. Mas já respondeu às companhias de teatro que solicitaram ao ministério um estudo sobre a queda de público? Não há nenhum estudo encomendado. O ministério não tem responsabilidade na fragilidade do sector. Lamento que tenha havido circunstâncias que decorrem de um regulamento desproporcionado em relação ao que está em causa - parece um concurso para uma obra pública! Procuramos agilizar o regulamento, nomeadamente permitindo que companhias com provas dadas não tenham que estar sempre a concorrer. Mas os agentes teatrais, como todos nós, têm que conviver com a contenção orçamental. Há companhias que ponderam processar o Estado com base num artigo segundo o qual, em nome do interesse público, os subsídios poderiam ter sido pagos... Agirão conforme entenderem. Tenho formas de me defender. Estou escudada em pareceres jurídicos. O ex-secretário de Estado, José Amaral Lopes, afirmou que "é preciso assumir que não podem existir 500 companhias de teatro". Concorda? Completamente. Há uma proliferação excessiva de companhias que dificulta a vida dos próprios agentes. No mercado da cultura, a livre iniciativa é dos agentes se quiserem criar 500 companhias podem fazê-lo. Muitas terão apoios do Estado. Nunca todas. Não tem qualquer programa para recuperar do sector? Há programas de incentivo e apoio à difusão cultural, que devem ajudar à sedimentação do sector. O programa de difusão cultural [ainda sem nome] vai conjugar oferta e procura para dinamizar e agilizar o mercado. Queremos combater a falta de informação que existe e acentuar a descentralização. Investiu-se, nos últimos anos, muito dinheiro na construção de equipamentos. Agora, importa colocá-los a funcionar em rede ao nível da programação. Substituiu o modelo de júris locais por nacionais no apoio às artes. Quem é esse júri e quando será conhecido? Em breve porque os concursos pontuais abrem antes do fim do ano. Serão nomes reconhecidos pelos seus pares no sector e abrangerão o país todo. Quando Paulo Cunha e Silva assumiu a direcção do IA traçou dois objectivos descentralizar e internacionalizar. A sua substituição significa que ele falhou ou pretende dar novo rumo ao que deve ser o IA? As linhas fundamentais traçadas são válidas. A descentralização é prioritária. Importa também que o IA tenha vocação internacional - é o instituto que apoia a contemporaneidade, logo, quando se fala de "exportação cultural" temos que falar no IA. Quanto à saída dele, foi que ele se demitiu. E eu aceitei sem reservas. Nunca o disse porque nunca me perguntaram. Já tenm nomes para os dois subdirectores? Ainda não.O novo director, Jorge Vaz de Carvalho, tem currículo na área da música. Vai procurar equilíbrio nos dois restantes elementos da direcção? Também, mas não só. O IA tem problemas na sua concretização bipartida [nasceu da fusão entre IPAE e IAC] e outros de má governação. Era um instituto mal gerido? Sim. Nunca o tinha dito. Era um instituto mal governado. Não se pode gerir um novo organismo a partir da simples junção de dois; é preciso concebê-lo. Isso não foi feito. E esse era um dos objectivos do Paulo Cunha e Silva. Outros dossiês Centro Cultural de Belém deve repensar a sua estratégia "O Centro Cultural de Belém não está actualmente a explorar de modo nenhum as virtualidades que tem." A ministra da Cultura não manda só um recado para a actual administração do CCB; diz directamente que o equipamento "deve repensar a sua estratégia, a sua mecânica de gestão, e repensar a sua própria estrutura porque tem todas as condições materiais para ser um dos espaços culturais mais dinâmicos do país." Na perspectiva de Isabel Pires de Lima, o CCB perdeu grandeza, mas não se pode falar em desinvestimento estatal: num orçamento de 15 milhões, oito são fornecidos pelo Estado. Capitais da Cultura congeladas Em 2006, Portugal não vai ter nenhuma Capital Nacional da Cultura. A ministra entende que é necessário "fazer um exercício profundo de avaliação", olhando para os exemplos mais recentes: Coimbra 2003 e Faro 2005 - "e as duas foram atribuladas, como vimos". Sem argumentos taxativos contra ou a favor, a governante entende que "é necessário ponderar tudo, desde os apoios à produção e distribuição até à componente mais festiva que uma Capital deve ter". E mais: Importa relacionar isso com a compreensão da cultura como forma de investimento e geradora de desenvolvimento económico." |
Rápidas e Curtas
É uma internauta?
Sim, mas de forma moderada.
Sabia que a página do MC está desactualizada?
Sim... Estamos a trabalhar aí de forma intensa. O MC está muito à frente no campo da sociedade de conhecimento. Mas aqui somos muito à frente.
Qual foi o último filme português que viu?
Tenho visto pouquíssimo cinema português. O último foi "A Costa dos murmúrios". Desde que vim para o Ministério sobra-me muito pouco tempo livre. Creio que ainda não vi nenhum filme português desde que cá estou.
Não vê cinema em casa?
Não, detesto. Estar numa sala de cinema é totalmente diferente de estar no sofá de casa. Usufruir da arte passa muito, na minha opinião, pela possibilidade de conceber isolamento.
Não viu “O crime do padre Amaro”?
O novo? Não. Vi a versão anterior, do autor mexicano. Este novo, português, ainda não vi. É do meu Eça e ainda não vi. É uma das minhas prioridades.
Lê as críticas de cinema?
Leio, sim. As criticas foram positivas, não foram?
O universo do Eça, para os puristas, está desvirtuado...
Sim? isso não acho preocupante. Isso é o eterno problema das adaptações ao cinema de obras literárias – são produtos de suporte completamente diferente. A obra mexicana desvirtuava o original mas era muito defensável.
O seu lazer actual não inclui actividades culturais?
Bom, inclui... Tenho ouvido mais música do que ouvia. Tenho ido muito à Casa da Música, como vocês sabem. Olhe, hoje [quarta-feira] até vou ver os Coldplay. Como vê tenho diversificado os meus hábitos musicais. Aqui há tempos vi um concerto – bom, fui arrastada – daquele músico que participou na banda sonora do filme “A cidade de Deus”. Como é que ele se chama?
Viu o espectáculo do Seu Jorge?
Sim, o Seu Jorge, exactamente. Gostei bastante. É muito sui generis. A banda era virtuosa e ele teve intervenções prementes sobre o significado da música na actualidade.
Está a ler algum livro recomendável?
Estou a ler três coisas: o último livro de poesia do Bernardo Pinto de Almeida (qualquer coisa lusitana; é a partir de um titulo do Cesariny). Estou a ler um clássico – eu faço muitas misturas… – que nunca li, o “Lolita”, do Nabokov; e estou a ler um novo romancista brasileiro, Luís Rufato, que tem uma coisa muito interessante chamada “Eles eram muito cavalos”. Esse estou quase a acabar. E vou ler em breve a nova adaptação da “Odisseia” do Frederico Lourenço.
A versão adolescente?
Sim [risos]. A outra já li. Tenho curiosidade em ver como é que ele solucionou a narrativa fazendo a adaptação do verso para prosa. Eu sou muito a favor das adaptações para diferentes públicos – ao contrário da opinião dominante no sector literário. Acho sempre que são bons indutores de leitura.
Diria o mesmo em relação à literatura ‘light’?
Sim. Não tenho nenhuma rejeição ad inicium em relação a esse género. A literatura ‘light’ é um patamar perfeitamente viável.
Já experimentou?
Não [risos]. Li algumas coisas, há anos já, dessas primeiras manifestações de escrita ‘light’, designadamente da Rita Ferro. A única gravidade da literatura ‘light’ é quando é mal escrita – mas se for bem escrita pode ser uma bela forma de indução à leitura.
Está a seguir alguma ficção televisiva?
Não. Sou uma péssima telespectadora. Quase não vejo televisão.
Dir-se-ia que é uma ‘workaholic’?
Não, não sou – mas obrigam-me [risos]. Sou até preconceituosa relativamente aos ‘workaholics’; acho que as pessoas que trabalham em demasia são tendencialmente limitadas. Acho mesmo que é limitador alguém passar horas a mais, dias a mais só sentado no gabinete. É horrível ter de confessar que há meses não vou ao cinema, mas é verdade.
sexta-feira, novembro 25, 2005
José Manuel (ex-Durão) Barroso
O que é que mudou no país desde que Durão Barroso, de forma altruísta (!!!) - voltou a garantir, hoje, na entrevista concedida a Judite de Sousa -, trocou o Governo por Bruxelas? No que depende dele, nada. No que depende dele, na versão dele, "o país já não vê os seus problemas tratados em terceiro ou quarto lugar". Nele próprio, mudou o peso... físico. O homem está muito mais gordo!!!! Foi impossível evitar o alívio ao ouvi-lo... o alívio de o saber longe! |
segunda-feira, novembro 21, 2005
Violação de privacidade
Lembro-me daquele dia por ter coincidido com a ressaca das eleições nos Estados Unidos. George Bush voltara a ganhar e eu ainda não tinha conseguido digerir a estupidez dos americanos. Ao início da tarde, um indivíduo (não era amigo nem colega nem conhecido. Era uma mistura disto tudo; daquelas pessoas que não se inscrevem propriamente em nenhuma das gavetas fundamentais da nossa vida, mas que lá vão aparecendo, cordialmente, aqui e ali. E que merecem o nosso respeito.) liga-me para me inquirir sobre uma conversa que, supostamente, acabaramos de ter no messenger. Surpresa número um: eu ainda não tinha ligado o messenger naquele dia. Mas ele insistiu que tinha estado uma hora a conversar comigo e que eu lhe tinha feito, entre outras coisas, uma cena de ciúmes. Surpresa número dois: Cenas de ciúmes são um exclusivo que guardo para uma única pessoa. E nunca para aquelas que não me dizem nada para além da esfera mundana do quotidiano. Muito menos para uma pessoa - como era o caso -, que conhecia há dez anos, ainda dos tempos da faculdade, e que não mexia minimamante com nenhum dos meus sentidos. Mas ele voltou a insistir na teoria: tinhamos falado, eu tinha feito uma cena de ciúmes, tinha gravado a conversa e enviado, por e-mail, para essa terceira pessoa que motivara os meus delirantes ciúmes. Resultado: o indivíduo e a dita pessoa, que tinham uma relação de carácter "fonte-jornalista", ficaram com o relacionamento profissional estragado por violação de confiança. A rapariga em causa ficara ofendida com os comentários que o indivíduo proferira sobre ela na dita conversa de messenger. E eu, que tinha com ele uma relação de carácter semelhante, fiquei também com menos uma fonte. Surpresa número três: No mesmo dia, deixei de ter acesso ao messenger e ao hotmail. Sempre que tentava ligar, surgia uma janela a informar-me que eu já estava ligada noutro computador. Liguei à rapariga esclarecendo-a de que não tinha qualquer interesse nele ou nela ou em qualquer relação que ambos pudessem ter, e que tudo não passaria portanto de um mal entendido. Ela não acreditou, o que é legítimo, porque nunca me viu na vida. Mas ele também não acreditou. Até hoje, o que é pior, porque me conhece. Os homens quando não acreditam em alguém, destilam sempre o mesmo comentário: "É uma vaca". E pronto, fica o assunto arrumado. A violação de privacidade através das novas e supostamente eficazes formas de comunicar é grave. Mais grave, no entanto, é as pessoas não terem como provar a sua inocência. Eu não tive como provar a minha. Apesar de ter feito queixa aos administradores informáticos do local onde trabalho, de ter feito queixa ao servidor do hotmail, à Microsoft, etc, etc... A consolação (para o que quer que ela sirva... temo que para muito pouco) chega-me agora, mais de um ano depois, através da entrevista de Kevin Mitnick, publicada na revista Única do Expresso. A história já era conhecida. O pirata entrou em mil e um sistemas informáticos, foi condenado por isso, e hoje é uma figura famosa e recuperada. Se é possível entrar nos mais complexos sistemas informáticos do mundo, como é que não haveria de ser possível forjar a entrada num mísero messenger? |
sábado, novembro 19, 2005
Sigur Rós. Inesquecível.
Chegaram de mansinho com uma música que é chuva e é vento. Que é nocturna e de estrelas cadentes consumidas como um segredo, que já não é de minorias. E levaram-nos nessa tempestade que eles dizem ser de esperança. Mas na lágrima congelada da boneca mutilada, que espécie de esperança pode existir? Nós não sabemos e eles também não dizem. Inventaram uma língua para ser entendida só com os sentidos. E nós deixamo-nos embalar, docemente impotentes, por aquela arrepiante explosão de cordas. E pelos 30 segundos arriscados em silêncio. Os Sigur Rós protagonizaram, hoje, no Coliseu do Porto, um dos melhores concertos do ano. Poderá haver melhores; dificilmente algum outro poderá ser tão comovente. |
sexta-feira, novembro 18, 2005
Raul Brandão (1867-1930)
Em circunstâncias normais, no próximo dia 4 de Dezembro, alguém se lembraria de escrever sobre Raul Brandão, escritor do Porto falecido há exactamente 75 anos. Infelizmente, sou capaz de apostar que o aniversário da morte de um dos melhores escritores portugueses de sempre passará, discretamente, sem ninguém dar por ela. Uma citação, apenas, de "A morte do palhaço", publicado em 1926: "Da existência ficara-lhe o olhar desvairado, p'ra dentro, de quem segue na alma um sonho e anda na vida por acaso; o olhar daqueles em quem a vida interior é enorme e que ficam surpreendidos quando a dor lhes diz que a morte existe." |
E agora, algo completamente diferente...
Há pessoas que nos ganham, assim, por nada e para sempre. Gosta-se sempre de alguém só porque sim. E nunca pelas qualidades. E nunca pelos defeitos. E nunca por nada que não seja, apenas, aquilo que são. Sejá lá isso o que for. E quando se sabe exactamente porque é que se gosta - beleza, inteligência, nobreza, riqueza, compatibilidade, carácter... -, é porque não se gosta realmente. Porque há sempre alguém melhor, mais especial. E, nesse caso, o gostar seria, ininterruptamente, derrubado por uma nova aparição. E por um novo pacote de características mais apuradas. Quando se gosta, gosta-se e pronto. E gosta-se para sempre. Porque o gostar não é passível de ser interrompido. Quando acontece, prevalece. Mesmo que seja guardado na distância. Ou no silêncio. Ou na vez única em que se tropeçou em alguém. |
Futurologia
Se a moda do D. Sebastianismo redentor pega, daqui a dez anos, vamos ter Paulo Portas a disputar as presidenciais... com António Guterres. Na próxima quinta-feira, o ex-ministro da Defesa e ex-líder do CDS irá falar na sessão de encerramento dos Encontros do Porto 2005 promovidos pela Associação Comercial da cidade. Mais dia, menos dia, há-de aparecer também a escrever num qualquer jornal de referência como quem despeja uma fórmula mágica para recuperar o país. Uma espécie de "Monstro", versão II. Não soa a déjà vu? |
sexta-feira, novembro 11, 2005
Dúvidas privadas para cargos públicos
A recente nomeação da direcção do Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM), levantou-me dúvidas sérias... José Pedro Ribeiro, que desempenhou, desde 2003, funções de vice-presidente, será o novo líder do organismo, sucedendo Elísio Cabral de Oliveira. A propósito, alguém deu por ele no mandato? Adiante. Pedro ou Elísio é tudo a mesma coisa. Daqui a alguns anos, continuaremos todos, alegremente, a discutir a eternamente nova lei do cinema, etc e tal...
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Pérolas a porcos
Agostinho Branquinho é um ginasta notável!!! Na semana passada, na crónica que assina, todas as sextas-feiras, no Jornal de Notícias (www.jn.sapo.pt), usou a rocambolesca analogia dos supermercados para explicar apenas a forma como o indefeso Rui Rio acabou por transformar-se num mártir nas mãos impiedosas dos vis jornalistas. O presidente da Câmara do Porto não fala (a não ser por escrito, naturalmente; e quando assim o entender), mas falam os seus súbditos por si, o que dá sempre muito jeito.
Hoje o cronista volta a repetir a fórmula. Mas com um jogo de cintura digno de figurar no livro de recordes do Guiness, na modalidade "elasticidade intelectual". O deputado da Assembleia Municipal do actual executivo PSD/CDS-PP dá consigo (ele próprio não deve saber como conseguiu!) a desancar nos ex-ministros da Cultura dos anteriores governos sociais-democratas, Pedro Roseta e Maria João Bustorff, por terem negligenciado e atrapalhado a Casa da Música. Dá, fatalmente, consigo a elogiar "a intervenção directa do primeiro-ministro", que, segundo defende, "fez vingar – e bem – o modelo de fundação, numa parceria virtuosa do Estado com a iniciativa privada." Mais: aprova, incondicionalmente, a nomeação do militante socialista, José Manuel Dias da Fonseca, para presidente do Conselho de Administração da futura Fundação.
Pelo caminho, quase acaba por perder-se, não poupando também elogios ao "sentido de Estado e pragmatismo" do engenheiro Couto dos Santos (ainda a presidir o Conselho de Administração da Casa, apesar de o seu contrato ter cessado em Maio), sem o qual, sublinha, "estaríamos, hoje, ainda bem longe de uma solução estável para o funcionamento da Casa da Música."
Sobre essa prodigiosa acção do engenheiro falaremos mais tarde. Importa agora questionar que motor leva Agostinho Branquinho a tecer súbitos louvores ao PS e convictos chumbos ao PSD. Seria a permuta Túnel de Ceuta/Casa da Música, servida à sobremesa de um qualquer restaurante da cidade, a turvar-lhe o raciocínio? Não! À semelhança do que aconteceu na semana passada, a resposta é dada no penúltimo parágrafo da prosa.
Branquinho está, apenas, preocupado com o regresso de Pedro Burmester à Casa da Música. Cito: "O primeiro teste a este ambiente de consensualidade em torno da Casa da Música será a nomeação do director artístico. Aí se verá se a opção será por uma personalidade que não volte a criar um clima de crispação e que permita que o projecto se afirme e recolha, sem reservas, o apoio de diferentes sectores da sociedade."
E sugere, sem o escrever abertamente, o apoio que Jorge Sampaio deu ao pianista na noite de S. João, no Porto, em 2003. "Pela validade e pertinência de Pedro Burmester, perder-se-ia menos com a saída de Rui Amaral" (primeiro presidente do Conselho de Administração da Casa da Música. Sim, o que queria um elevador directo para o gabinete), afirmou, na altura, o presidente da República confrontado a ira de Rui Rio e respectivo séquito.
"Portugal é um país de “cunhas” e nem o presidente da República escapa a esse mal endémico. Oxalá que a “cunha presidencial” não contribua para mais polémicas sobre a Casa da Música.", conclui, depois de muito navegar, Agostinho Branquinho.
Se Pedro Burmester não regressasse (ou não regressar...) ficaríamos todos a perder. Perderia o projecto (que só ele delineou ao pormenor), perderia a cidade e o país. Mas, depois de tudo, depois de todos os insultos e injustiças, depois de todos os impasses e manifestações de falta de coragem do actual Ministério da Cultura, quem é que ainda merece o regresso do pianista? Quem é que verdadeiramente merece que continue a deixar as partituras em segundo plano?
Anthony Withworth-Jones (director artístico britânico nomeado para a Casa, em Fevereiro do ano passado, sem que nunca alguém tivesse percebido porquê), confessou, em entrevista ao Público, anteontem: "Não sei muito bem o que queria que a Casa da Música fosse. Quando cá cheguei, não tinha ideias feitas."
Burmester tinha as ideias todas. As que lá estão, e as que destruíram. Valeu a pena? Ainda vale a pena dar pérolas a porcos?
quarta-feira, novembro 09, 2005
Oportunistas
Ainda não é líquido que o país esteja rendido ao salvador da pátria, materializado na figura de Cavaco Silva. Mas os jornalistas (uma fatia gorda, pelo menos), não podiam estar mais subjugados aos encantos (?!) do professor que recusa a etiqueta político profissional". |
Rui Rio no reino do ego insuflado
Alguém devia ter a generosidade de explicar ao doutor Rui Rio que o poder conferido pela maioria absoluta conseguida nas últimas eleições autárquicas não é extensível ao mundo em geral. Não é, definitivamente, passível de ser estendido à Comunicação Social. Uma coisa (já, por si, suficientemente grave), é mandar nos vereadores, cerceando-lhes a mais elementar das liberdades: exprimirem-se; outra coisa, bem diferente - e bem mais grave -, é achar que pode, só porque sim, só porque lhe apetece, só porque deve achar que cada um em sua casa é rei, embora a sua casa não seja a casa de todos, reescrever os manuais de jornalismo e deontologia. Sobretudo reescrever, questionando sem fundamentar, a ética individual de cada jornalista. Mas, bem vistas as coisas, onde está a novidade? Há quatro anos, fê-lo com os jornalistas do Público; agora fá-lo com os jornalistas do JN. Será de louvar-lhe o espírito de equidade?!...
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