domingo, novembro 27, 2005

Imprensa a criar excêntricos todas as semanas

Bem sei que do ponto de vista do porreirismo que nos é sempre exigido e que nós gostamos sempre de ostentar isto poderá parecer psicologicamente meio monocórdico. Dito de outra forma: sem sal. Mas a verdade é que poucas coisas me concedem maior prazer ao fim-de-semana do que ler a imprensa nacional quase toda. Pilhas e pilhas de papel prendem-me durante dois dias com muito mais eficácia do que qualquer encontro social, cultural ou familiar. Porque está lá tudo. E, volta e meia, quando menos esperamos, quando apenas viajamos inocentemente pelas referências do jornalismo português, somos também brindados com doses infindáveis de humor. Este fim-de-semana de chuva, trovoada e saraiva foi uma espécie de euromilhões... com notícias "a criar excêntricos". Do melhor!

1. Anda Mário Soares empenhado, à beira do limite e do desequilíbrio, a espicaçar Cavaco Silva - qual moscardo de Platão!! -, para tentar que o homem rompa o silêncio e reaja a qualquer coisa e ele nada. E depois responde a Miguel Cadilhe só porque o seu ex-ministro das Finanças o citou, completamente a despropósito, numa conferência, no Porto. Não é justo.


2. Gosto de António Barreto. Gosto dele por tudo. Gosto dele mesmo quando discordo do que defende. E não gosto de Miguel Cadilhe. Por nada especial, pormenores, tiques, apenas. Mas não gosto. E não gosto também porque não gosto da devoção que a imprensa tem por ele. Na passada terça-feira, os dois foram desafiados a dissertar sobre as elites do Porto, na Universidade Católica. O sociólogo levou um texto escrito, sustentado, brilhante. O economista ignorou o tema e gastou o tempo a falar da regionalização. Não terá sido por acaso. Amanhã lança o livro "O sobressalto do Estado em Portugal", onde retoma o assunto. O JN antecipou, ontem, excertos da obra e fez manchete com isso. O Público recuperou, hoje, o texto de António Barreto e publicou-o na íntegra. Um texto que vale mesmo a pena ler.


3. Definitivamente, no universo do humor ninguém consegue competir com Pedro Santana Lopes. Não é que o ex-Primeiro-Ministro decidiu criar uma nova efeméride? Para assinalar um ano sobre a publicação, no Expresso, do texto de Cavaco Silva, designado "Lei de Gresham" (sobre a moeda boa ou má ou assim-assim), escreveu um artigo de opinião homónimo no mesmo jornal, respondendo-lhe. Santana Lopes a tentar pôr Cavaco Silva no lugar!!! É, no mínimo, hilariante. Mais hilariante ainda: Cavaco Silva respondeu-lhe! Ou seja, Soares não só perde para Cadilhe, como também perde para Santana Lopes. É o descalabro.

4. Santana Lopes não é homem de uma piada só. Por isso, no mesmo artigo, atacou também Jorge Sampaio, que acusa de ter dissolvido o Parlamento depois de ter lido a oração de Cavaco e, com isso, ter prejudicado o país. E vou citar, porque nada poderá ser melhor do que as palavras do próprio:


"Criticava-se o meu Governo por falar em esperança, por falar em espírito positivo, por falar em confiança. Como os números provam, a economia portuguesa há um ano crescia. As pessoas acreditavam pouco na melhoria mas apesar de tudo acreditavam esse pouco. Agora, o clima é de generalizada descrença, quase de angústia nacional, como reconhecem os mais insuspeitos. A decisão do Presidente da República prejudicou, pois, Portugal. Tudo visto e ponderado ninguém duvidará que a situação do país é hoje pior do que no ano passado, tendo, precisamente, começado a piorar quando o Presidente anunciou a decisão."


Palavras para quê? Santana Lopes que, por mais do que uma vez, manifestou preocupação em relação à sua magra reforma, deveria enviar o currículo para as Produções Fictícias ou mesmo escrever uma cartita aos amigos dos Gatos Fedorentos. Algo me diz que está a passar ao lado de uma grande carreira como humorista.


5. Apresentar soluções milagrosas para o país nas páginas dos jornais é como comentar um jogo de futebol da bancada. Isto não é novo. Por saber isto, Paulo Portas, como previ neste blogue na passada sexta-feira (sim, não é só José Manuel Fernandes que tem esse dom da previsão...) regressará ao comentário político em Janeiro. É certo que eu previ que seria na imprensa. Ok, não é. É na Sic Notícias. So what?


6. Joaquim Oliveira que recentemente açambarcou boa parte da comunicação social nacional ao protagonizar o maior negócio do sector com a compra da Lusomundo à PT, afirmou que quer ainda acrescentar uma televisão generalista ao seu espólio multimédia. O patrão da Oliverdesportos prometeu ficar vigilante em relação ao processo de renovação das licenças dos canais privados de televisão e a uma eventual atribuição de novas licenças para novos canais generalistas. Não quereria ele dizer que vai estar atento às licenças dos canais por cabo? Recorde-se que dois produtos made in Porto estão por aí prestes a emergir...


7. Volta e meia o Expresso decide inovar. Pronto, é assim. Acho que é um direito adquirido muito semelhante ao dos velhinhos: podem fazer o que quiserem e nunca ninguém lhes leva a mal. Desta vez, o semanário coloca na primeira página, com direito a fotografia de casal e tudo, um anúncio: "Durão Barroso por ele próprio" - entrevista e reportagem "24 horas com". No interior do jornal? Não! Na próxima semana!


8. Isabel Pires de Lima em entrevista ao JN. Única leitura possível: o túnel de Ceuta roubou-lhe tempo para tudo. Não há um único dossier em que a ministra da Cultura se sinta confortável. As respostas são um concentrado de contradições e vazio.


9. Marco Paulo, esse grande senhor que passou a vida dividido entre dois amores, confessou à Única que não casou por causa das fãs. Importa-se de repetir?

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