Mostrar mensagens com a etiqueta Michael Cunningham. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Michael Cunningham. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, maio 06, 2011

Michael Cunningham: Uma casa no fim do mundo


Não éramos amantes, mas quase. Ocupávamos a esfera superior do amor, onde as pessoas acarinham a companhia e excentricidades umas das outras, onde se querem bem. Uma vez que não éramos amantes no sentido carnal do termo, não tínhamos utilidade para os pequenos crimes. Clare e eu partilhávamos os piores segredos e os mais absurdos temores. Jantávamos juntos e fazíamos compras, avaliávamos as qualidades dos homens que se cruzam connosco nas ruas. Em retrospectiva, diria que éramos como as irmãs das histórias tradicionais; as histórias em que a irmã mais nova e mais bonita não pode casar enquanto ninguém reclamar a mais velha e menos atraente. No nosso caso, contudo, éramos ambas as irmãs ao mesmo tempo. Partilhávamos uma vida de roupas, mexericos e auto-análise. Esperávamos, sem particular urgência, que alguém nos reclamasse para o outro, mais terrível, tipo de amor.

(...) O problema de um casamento tranquilo é que se recusa a acabar - em momento algum um gesto de injustiça ou crueldade nos proporciona um pretexto para voltar costas e avançar, sem remorsos nem culpa, para um outro modo de existência. Vive-se nos pormenores: uma cozinha disposta à nossa maneira, tomates a amadurecer em filas semeadas e regadas pelas nossas próprias mãos. (...) Os filmes e os livros da nossa juventude não nos preparam adequadamente para a força do encanto das nossas futuras casas; não nos advertem contra os poderes de sedução exercidos pelas janelas de uma sala voltada a sul, ou pelos vasos de malva-rosa ladeando duas portas de estilo francês.

quarta-feira, março 09, 2011

Michael Cunningham

[Foto: Dora Nogueira]

"A minha reacção é pensar, "mas as pessoas não se sentem todas assim [sozinhas, presas dentro delas próprias]?" Não sei. O segmento da população que se sente muito sozinho nas suas cabeças, distante mesmo dos amigos mais próximos, interessa-me. Pode não ser toda a gente, mas muitos de nós sentimo-nos assim. Passamos a juventude a pensar no que vem a seguir, mas depois só há mesmo isto. Mudar é difícil, mas acredito que possível. (...) Somos cidadãos do nosso próprio mundo, da nossa própria mente. Há uma certa interioridade e solidão que faz parte de ser humano."

Entrevista completa, no i.

sexta-feira, dezembro 10, 2010

Michael Cunningham


"Em arte, o heróico e o ideal foram eliminados muito antes da tragédia do 11 de Setembro. A pintura, por exemplo, há décadas que se tornou decididamente irónica, desenraizada e não-bela. Tal como a minha personagem Peter Harris pergunto-me se estaremos no melhor dos caminhos para esta espécie de dieta espartana nas artes que proíbe o Belo, o heróico e o ideal. (...) Interessa-me o facto de um belo objecto não ter poder para animar ou consolar. Podem chamar-me antiquado, mas continuo a considerar que uma das finalidades da arte é, não só desafiar-nos, mas ajudar-nos a recordar que a nossa vida merece ser vivida."

[Michael Cunningham, hoje, em entrevista ao Ípsilon, a propósito do livro "Ao cair da Noite"]