quarta-feira, novembro 21, 2012

Melancolia I


Albrecht Dürer

"A melancolia não é apenas depressão psíquica ou tristeza retorcida e doentiamente acalentada. A fugacidade e a imperfeição da nossa vida fazem dela uma corda fundamental do espírito, até daqueles que gostariam de se assemelhar mais ao rabino David de Lelov (que, na hora da morte, disse: “Rio-me de Deus, porque aceitei o seu mundo como é.”) do que aos monges propícios ao demónio do meio-dia. Nenhuma vida e nenhuma poesia podem ignorar a melancolia, a caducidade do tempo que passa, essa coisa que falta sempre em toda a felicidade e em todo o amor, até no que é feliz, a decomposição das coisas e dos sentimentos, inclusive os mais puros, o desencanto, a mudança incessante e o perecimento. Tal falta pode ser vivida não necessariamente com voluptuosidade masoquista, mas com um sentido forte – clássico, antigo – da inevitável distância que há entre o coração e mundo, do mesmo modo que para o teólogo Romano Guardini a melancolia é o sentido de uma insuficiência terrena que pode levar a Deus. Não há encanto sem conhecimento e não há conhecimento sem melancolia. Há um século, um cultor da fisiognomonia, ao descrever a belíssima boca de Cléo de Mérode, grande atriz e grande amante, notava que, com o passar dos anos, em torno daquela boca se havia esboçado um halo de melancolia. Talvez assim fosse ainda mais bela."

“Melancolía y Modernidad” (2007).

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