domingo, outubro 29, 2006

Diálogos pueris (fim)

A transmissão da série "Diálogos Pueris" neste blogue provocou certas e determinadas altercações nos últimos dias, nomeadamente a pessoas que se terão erradamente identificado com conversas que lhes não pertenciam. Para não criar mais equívocos, os diálogos passarão a ser transmitidos em canal codificado, não acessível aos habituais clientes do Coriscos.
Os "Diálogos Pueris" eram conversas pequenas, fugazes e ficcionadas sobre relacionamentos - situações banais, eventualmente aplicáveis a uma infinidade de pessoas sem que, todavia, se referissem a alguém em concreto. As confusões, no entanto, levarão a supor que o mundo e as relações são, afinal, mais pobres - porque menos singulares -, do que seria desejável.

quinta-feira, outubro 26, 2006

Portugal Fashion

Depois de um intervalo razoavelmente longo nas minhas incursões pelo Portugal Fashion abro uma excepção para assistir ao desfile de Nuno Baltazar. A passerelle ainda não começou e já sinto o arrependimento. O evento de moda do Porto continua tão mau como antes; tão mau como sempre. Sem glamour, sem organização, sem nada que contribua para o dignificar.
Sendo gigantesco, o Cace - local escolhido há alguns anos para albergar a mostra dos criadores portugueses promovida pela ANJE - fica reduzido a uma plataforma com uma bancada incapaz de receber os convidados todos. O acesso aos lugares será a parte mais dramática: tudo ao molho, tudo aos encontrões, tal e qual como num estádio de futebol. Depois, no caso de ontem, a ideia seria ouvir os poemas recitados pelo actor João Reis enquanto as manequins exibiam a colecção. Poderia ter sido bonito se alguém se tivesse lembrado de cumprir o exercício básico dos testes de som. Assim, restou a intenção. E uma colossal dor de cabeça pelo ruído de uma voz incompreendida acompanhada por uma música literalmente aos berros.

quarta-feira, outubro 25, 2006

"Está-se sempre mais perto se não ficarmos parados".
Thom Gunn, On the move

terça-feira, outubro 24, 2006

A maioria do silêncio I



Descubra as diferenças. Se conseguir.

segunda-feira, outubro 23, 2006

Equador resulta de um plágio?

Li o Equador de Miguel Sousa Tavares tal como não sei quantos milhares de portugueses. Li esse livro e li os outros e as crónicas: as do Público, as da Máxima, e agora, as do Expresso. Gosto de Miguel Sousa Tavares e, apesar das evidências, espero que esta notícia não seja verdade.

domingo, outubro 22, 2006

A "rivolução" de Pacheco Pereira (conclusão)

Pergunto-me, o que sabe realmente Pacheco Pereira do actual tecido cultural do Porto? Ele que acha que o protesto contra a privatização do Teatro Rivoli foi encetado pelo Bloco de Esquerda? Ele que acha que "o número escassíssimo de pessoas" que se barricou no equipamento pertence ao Teatro Plástico, desconhecendo que a companhia não tem propriamente uma família residente? Ele que parece não saber sequer que, em Portugal, salvo raras excepções, nenhuma companhia a tem? Ele que acredita que os espectáculos do Plástico têm 30 pessoas na plateia, não tendo em dez anos visto uma única peça da estrutura? Ele que não está minimamente a par do teatro e do resto que se faz na cidade, embora na crónica tenha decidido perseguir só o teatro e só o Plástico? Ele que definitivamente não sabe que Lorca, Miller, Virginia Woolf andam por aí nos palcos do Porto, provavelmente com qualidade igual ou superior àquela que ele parece ter visto quando tinha 20 anos?
Ele que considera "completamente absurdas" as "manifestações públicas de apoio inequívoco" da ministra da Cultura - se as tivesse havido e, ao contrário do que escreveu, não houve -, num "governo democrático"? Não será, justamente, liberdade de expressão de um membro eleito que se espera num governo democrático?
O que sabe realmente Pacheco Pereira do tecido social do Porto? Ele que acha que Rui Rio, o autarca "contabilista", ao contrário de Fernando Gomes "dos bons velhos tempos do binómio futebol-"cultura" anda a investir o dinheiro que sobra da sua "severa gestão" na acção social? Pergunto-me há quantos anos não virá Pacheco Pereira ao Porto ou em que ruas passeará quando cá vem.
Aliás, que sabe Pacheco Pereira de Rui Rio? Se acredita, como escreveu, que a "cultura" - e ele lá saberá por que escreve cultura sempre entre aspas -, "é o meio mais eficaz para obter propaganda", por que raio se esqueceu que o autarca do Porto, quando ganhou as últimas eleições, anunciou (mentindo, é certo) uma inflexão nas suas posições culturais prometendo compensar os cidadãos da cidade pelos últimos quatro anos em que subestimou a cultura? Seria uma tentativa de Rui Rio para obter "boa imprensa, legitimidade, figuras de cartaz e "nome"?!

Que poderá saber Pacheco Pereira de uma cidade onde não vive quando defende que antes do 25 de Abril é que era? Antes do 25 de Abril é que "o povo - O povo?! Será que é isto que chateia Pacheco e todo o sequitozinho de Direita? Que o "povo" tenha descoberto outras coisas para lá daquelas a que o queriam limitar?! Que o povo tenha invadido universidades e alcançado horizontes que antes do 25 de Abril estavam apenas à disposição de uma minoria, essa sim, de elite?- dispunha de espectáculos de teatro, quer "sério", quer de revista, com a vinda regular das companhias de teatro de Lisboa ao Rivoli e ao Sá da Bandeira. Será que Pacheco sabe que agora não vêm só de Lisboa? Que vêm do mundo todo? Antes do 25 de Abril, continua, é que havia óperas, "óperas mais "fáceis" como O Barbeiro de Sevilha, o Rigoletto ou a Cavalaria Rusticana, mas era ópera e os espectáculos conheciam enchentes". Reparem bem no desdém: eram óperas mais fáceis mas para o povinho servia e o povinho ia. "Eram espectáculos populares e baratos".
Pacheco Pereira representa o que de pior existe na Direita. Nessa Direita para quem os pobres e os menos esclarecidos fazem imensa falta para lhes recordar que eles não fazem parte desse universo. Só lhes fazem falta para isso, porque depois nem lhes dão cultura nem lhes melhoram a qualidade de vida. Por muito contabilistas e severos que se achem.
Por fim, que sabe Pacheco Pereira do "completo divórcio entre a "cultura" subsidiada e o público, que gera um establishment cultural de muito má qualidade, caro e solipsista, que existe apenas para si próprio e fora de quaisquer critérios que avaliem o uso de dinheiros públicos" quando parece desconhecer que a irmã, Beatriz Pacheco Pereira, e o cunhado, Mário Dorminsky, serão a maior esponja de subsídios da cidade, mentindo sempre, ano-após-ano, no número de espectadores, e também de convidados da imprensa estrangeira que frequenta o seu Fantasposrto? [Ninguém tem culpa da família que tem. E ninguém tem que responder pelos pecadilhos dos outros. Mas o decoro deve obrigar-nos ao silêncio].
"Não não é isso a rivolução dos nossos dias?"

sábado, outubro 21, 2006

Paulo Pimenta


O fotógrafo chama-se Paulo Pimenta. É repórter fotográfico do jornal Público desde 1997 e tem um dos meus olhares de eleição sobre as coisas, as pessoas e o resto. A exposição que tem patente até 9 de Novembro no espaço "Barba & Cabelo" [Rua S. João Bosco, nº 295, Porto] chama-se "Apontamentos de Paris em sete dias". Trancrevo o texto da exposição:

"Falamos de Paris, falamos de moda, falamos de estilistas e de cabeleireiros. E de "coiffure", e dos sorrisos dos cartazes, e das imagens trabalhadas e retocadas. Falamos de imagens, sim. Mas não destas reproduções retocadas e ampliadas em cartazes. Mas das imagens/apontamentos que nos chegam pela retina Paulo Pimenta e pela sua máquina de fotografar. Falamos, então, da imagem de sexta-feira, se a sequência começa à segunda, e se a cada apontamento de Paulo Pimenta corresponder a dia da semana. O título da sequência parece confirmá-lo: "Apontamentos de Paris em sete dias", e basta sabê-lo, para partimos em viagem. O homem que esconde o seu cabelo mas espreita a montra do "coiffeur" é um dos instantes que nos transportam para a Paris que não vem nos postais, mas onde, mesmo assim, conseguimos reconhecer sempre a cidade-luz.

É impossível não reconhecê-la, até porque a lente não fugiu do símbolo parisiense. Mas a Torre Eiffel muda de enquadramento, subalterniza-se para dar lugar a outro estilo de vida, parecendo posicionar-se num ghetto norte-americano. Mas a cidade aparece sempre reenquadrada pelo olhar singular do fotógrafo. A Paris cosmopolita, que alberga muitas comunidades, entre as quais a chinesa; a paris dos cafés e das portas abertas, das esquinas e dos cruzamentos; a Paris monumental, onde as peças de arte convivem com as esculturas vivas; a Paris do quotidiano e a Paris do futuro. Em cada dia, um apontamento. E em cada apontamento, uma visão. Em cada imagem, uma fracção de vida."

sexta-feira, outubro 20, 2006

Reposição da justiça

Anteontem escrevi que lamentava a ausência de solidariedade de algumas respeitáveis figuras do Porto para com aqueles que incessantemente, mesmo que de forma discutível, têm defendido a continuidade do serviço público no Teatro Rivoli. Mas fui injusta com algumas das pessoas que referi. Ou porque desconhecia o estado de saúde de Isabel Alves Costa, que soube entretanto estar de baixa; ou porque não estava devidamente a par das acções de João Fernandes, de Serralves, que manifestou publicamente o seu apoio ao movimento, acabando inclusivamente por pedir demissão do Conselho Geral da Culturporto; ou porque não soube simplesmente esperar pelo despertar de declarações como a de Pedro Burmester da Casa da Música ou pelos esforços investidos por alguns vereadores da Oposição, no sentido de estancar a crise. Isto é um pedido de desculpa. A todos.

A "rivolução" de Pacheco Pereira

José Pacheco Pereira tem de inteligência, às vezes, o que tem de burrice profunda, outras vezes. É como o tempo. E ontem, no Público, a propósito da ocupação do Rivoli, o rosto do autor da crónica, irmão daquela que é, muito provavelmente, a senhora mais subsidiada da cidade e que mais descaradamente mente em relação à média de espectadores dos seus "não-objectos" - ou ainda ninguém reparou que não passam realmente 500 mil pessoas em 15 dias no Fantasporto? -, deveria cobrir-se de vergonha. Mesmo.
Hoje estou cansada, mas amanhã voltarei, definitivamente, ao assunto.

quinta-feira, outubro 19, 2006

Teatro Rivoli IV

Não será ainda caso para pedir a demissão do vereador da Cultura? E, de preferência, não o substituir? Era uma boa maneira de poupar dinheiro...

quarta-feira, outubro 18, 2006

Teatro Rivoli III

Já passa da meia-noite. Passo no Teatro Rivoli uma vez, duas, três. E de todas as vezes sou atropelada pelas mesmas questões: por que é que só alunos de teatro e pessoas que, de uma forma ou de outra, estão ligadas às artes, sobretudo cénicas, estão a manifestar solidariedade com a minoria que se barricou no edifício para defender os interesses da maioria? Onde estão aqueles amantes da cidade e da cultura que há uns anos se amarraram ao Coliseu para o defender? Ou não seria um grito a reclamar o direito à cultura mas antes e só um protesto mesquinho contra a IURD - Igreja Universal do Reino de Deus? Onde estão os responsáveis pelas outras respeitáveis estruturas da cidade? Ricardo Pais do Teatro Nacional S. João, Nuno Cardoso do Teatro Carlos Alberto, Pedro Burmester da Casa da Música, João Fernandes do Museu de Serralves... onde estão? Não têm nada a ver com isto?! E a própria Isabel Alves Costa, alguém viu? E os políticos, os que prometiam uma oposição inédita na história da cidade?
Inicialmente comecei por estranhar que a indignação do caso tivesse ficado circunscrita ao Porto; que não tivesse havido manifestões e mensagens cúmplices dos directores de outros teatros municipais, de outras entidades de Lisboa e do resto país. Depois entendi: se nem a cidade se mobiliza por que haveriam os outros de o fazer? Para esses seremos sempre, provavelmente, apenas, a cidade em que os polícias matam um condutor quando ele não pára.

terça-feira, outubro 17, 2006

Teatro Rivoli II

O presidente da Câmara do Porto tem há quase 72 horas várias dezenas de ocupantes no interior de uma casa que é, ainda, da autarquia. Podia seguir um de dois caminhos: expulsá-los, o que seria eticamente discutível, mas legal; ou enviar alguém capaz de entender as razões pelas quais decidiram barricar-se. Mas Rui Rio não foi por aí. Rui Rio decidiu brincar com as pessoas (não só com as que estão dentro do Teatro Rivoli) como uma criança brinca com uma mosca enfiada dentro de um copo: primeiro arranca-lhe uma pata, depois outra e outra até ter-lhe subtraído as quatro. Depois passa para as asas, que amputa. Não satisfeito com o sofrimento, quando a mosca já não pode caminhar ou voar, Rui Rio tapa o copo com a mão e fica ali a vê-la, lentamente, morrer asfixiada. E sorri cá fora, orgulhoso por ter assassinado o insecto. O comportamento, bizarro, demonstra bem o carácter do homem que o Porto tem à frente da cidade.

segunda-feira, outubro 16, 2006

Teatro Rivoli I

Rui Rio está para os artistas que continuam a protestar contra a sua decisão de privatizar o Rivoli como os deuses para Sísifo (do mito de Albert Camus): os deuses condenaram Sísifo a incessantemente rolar uma rocha até o topo de uma montanha, de onde a pedra voltaria a cair devido ao seu próprio peso. Eles pensaram que não há punição mais terrível do que "o trabalho inútil e sem esperança".

quinta-feira, outubro 12, 2006

Diálogos pueris IV

Ele: Ela acabou tudo comigo.
Ela: Quem? A tua mulher ou a tua amante?
Ele: Claro que não foi a minha mulher!
Ela: E acabou tudo porquê?
Ele: Porque queria casar comigo. Fez-me um ultimato.
Ela: Como queria casar contigo? Não sabe que és casado?
Ele: Claro que sabe. Mas queria na mesma. As mulheres, a partir de determinada altura, querem sempre casar comigo.
Ela: É aquele momento em que soa o "Game over. Next player", não é?
Ele: É. Porque as mulheres são todas umas burras!
Ela: Porquê?
Ele: Porque sabem que sou um filho-da-puta como marido e mesmo assim querem casar.
Ela: E como amante?
Ele: Nunca mais voltam a ter um como eu.
Ela: Vejo que a ruptura não afectou o teu ego...
Ele: Não tem nada a ver com ego; é a verdade. Elas sabem e mesmo assim querem casar. Parece que não gostam de ter só o lado bom da vida.
Ela: Achas que esse lado bom é uma mulher abdicar da sua vida, de eventualmente encontrar o seu amor exclusivo, para viver um amor pela metade?
Ele: Não é exactamente pela metade. Ela também era casada.
Ela: Não sabia.
Ele: Pois, mas era. Eu bem insisti para ela não se divorciar...
Ela: Divorciou?
Ele: Sim.
Ela: Ela também tem filhos?
Ele: Sim.
Ela: Há uma coisa que não percebo: por que que estás triste se não queres casar com ela?
Ele: Porque gostava dela. Porque ainda gosto. E porque ela é uma burra.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Havia dúvidas?

Tiago Craveiro, autor do blogue Bode Expiatório, é o novo secretário-geral da Liga dos Clubes. O antigo jornalista do Diário Digital há havia sido assessor de Hermínio Loureiro quando esse foi secretário de Estado do Desporto. E mais não digo.

Faz sentido, não faz?

(Foto: Gustavo Machado)

Por vezes, a crónica não resiste ao chamamento da política, como é o caso, a propósito das declarações de Francisco Assis, deputado europeu e vereador do PS na Câmara do Porto, abrindo a porta a uma plataforma de esquerda, a mais de dois anos das próximas autárquicas, para derrubar Rui Rio e a sua maioria.O assunto tem a ver com a cidade e o modo de a governar, daí o interesse do "desabafo tardio ou mea culpa" de Assis, aliás extemporâneo, na forma e na substância. Ninguém pensa, neste momento, no assunto, está é expectante, na esperança de ver Francisco Assis capitanear uma frente de oposição na Câmara, o que não tem acontecido. Sem isso, tudo o que diga ou proponha, não passa de retórica, fora de tempo e pouco credível.
E comecemos pela questão está hoje a Câmara a governar bem a cidade? É o dr. Rui Rio o presidente adequado para inverter o declínio que se apoderou dela?Cada um responde de sua justiça, mas uma coisa é certa os portuenses, se estão desencantados com a sua Câmara e em verdade muitos estão, metem no mesmo saco poder e oposição, pois tirando "uns fogachos" do eng.º Rui Sá, aliás sem "poder de fogo" representativo, nada mais acontece de substancial. Ou seja, há o Plano da Baixa que se mantém "emperrado", o Rivoli que vai mudar de "gerência", os bairros que estão na mesma, o Bolhão que poucos sabem onde vai desaguar e, sobre isto e muito mais, que estratégias alternativas fundamentadas e consistentes tem o PS/Porto, ou tem divulgado o seu líder na vereação portuense?
Aqui é que bate o ponto tão importante como ser poder e governar é afirmar uma alternativa na oposição e conferir-lhe suficiente credibilidade para "a vender" à opinião pública. Quanto ao resto, aritméticas eleitorais atrás ou à frente é questão a ver na hora própria, por quem para isso tenha legitimidade e para tal esteja mandatado. A esta distância, pode parecer um "foguete" bonito, mas arrisca-se a não passar disso, porque as maiorias constroem-se politicamente e, também, sociologicamente, o que significa análise cuidada e preparação séria, sobretudo conteúdo e compromisso.
Assim a frio e sem cobertura de rectaguarda, é abrir "a agenda" na página errada, no calendário e no acontecimento!Mas voltemos à questão será Assis uma "bandeira" do PS suficientemente forte e credível para arrastar sociologicamente o Porto para uma alternativa de governação da cidade à esquerda? Por outras palavras, já cumpriu o PS/Porto o "período de nojo" suficiente para convencer os portuenses a apostarem de novo nele?Não menos importante será que Rui Rio e a sua equipa vão manter o mesmo "estilo e conteúdo de governação", ou serão capazes ainda de "um golpe de rins", que lhes permita, como aconteceu no mandato anterior, fazer inverter a dúvida dos portuenses a seu favor, sobretudo se a alternativa não oferecer credibilidade e consistência?
São muitas coisas e bastante sérias, para não poderem ser iludidas com a "cortina de fumo" lançada por Francisco Assis, pois o tema até merece ser seriamente tratado e o PS definir-se com clareza sobre ele, mas, no devido tempo, em sedes próprias e com aval de indiscutível manifestação de vontade de quem a deve afirmar. Até lá, tudo bem como opinião pessoal, mas desajustado para quem tem responsabilidades políticas delegadas pelos cidadãos e pouco sinal útil tem dado desse compromisso.Ou não será assim que pensam os eventuais parceiros do "negócio" ora proposto e os cidadãos portuenses em geral?É bom não esquecer que uns e outros sabem muito bem o que querem!

A obscena senhora D

(Foto: Teatro do Morcego)
O Teatro do Morcego vai voltar a levar à cena (16, 17, 19 e 20 de Outubro) no Teatro Gil Vicente, em Coimbra, "A obscena Senhora D" - uma adaptação da obra de Hilda Hilst. Não conheço a companhia nem o encenador Carlos Martins. Mas Hilda Hilst é a melhor escritora brasileira que conheço e, talvez, uma das melhores do mundo. E o livro em causa, sobre uma mulher que perde o amante é definitivamente mais comovente do que obsceno.
"Vi-me afastada do centro de alguma coisa que não sei dar nome, nem por isso irei à sacristia, teófaga incestuosa, isso não, eu Hillé também chamada por Ehud a senhora D, eu nada, eu nome de ninguém, eu à procura da luz numa cegueira silenciosa".

The Pillowman


(Fotografia tirada no atelier de Paula Rego, em Londres, em Novembro de 2004. A pintora construiu o "Homem almofada" depois de ter assistido à peça de Martin McDonagh's. E pintou-o posteriormente num tríptico que esteve em exposição no Museu de Serralves, no Porto, há dois anos.)
Quem teve o incomensurável privilégio de assistir à peça "The Pillowman", em cena no Teatro Maria Matos, em Lisboa, até ao próximo domingo, já conhece o texto que se segue. Quem não assistiu à brilhante estreia de Tiago Guedes na encenação, mas ainda espera assistir, não deve, ainda, ler o texto. Quem não assistiu nem tenciona fazê-lo pode ler. Deve ler. É uma história assinada pelo irlandês Martin McDonagh's - um dos dramaturgos mais polémicos, negros e absolutamente geniais da actualidade.
Se há teatro que não nos deixa nunca mais iguais, esta peça será disso o exemplo maior. Com um elenco inatacável - Albano Jerónimo (agente Ariel), Gonçalo Waddington (Katurian, o escritor), Marco D'Almeida (Michael, o irmão do escritor), João Pedro Vaz (agente Tupolsky) -, Pillowman é a peça que há-de ficar a ressoar durante vários dias (meses?) no que existe de mais fundo em nós. A arte justifica tudo?

"O escritor e o irmão do escritor"

"Era uma vez um rapazinho cujos pais, desde o dia em que nasceu, inundaram de amor, gentileza, carinho e essas coisas todas. Vivia numa grande casa no meio de uma linda floresta e o seu quarto era perfeito em todos os sentidos. Ele não precisava de nada: todos os brinquedos do mundo eram seus, todas as tintas, todos os livros, papéis e canetas. Todas as sementes da criatividade foram implantadas nele desde muito cedo e foi a escrita que se transformou no seu grande amor: historinhas, contos de fadas, pequenos romances, todos positivos, muito felizes, sobre ursinhos, porquinhos e anjinhos. Algumas das coisas que ele escrevia eram boas e outras eram muito boas. A experiência dos seus pais tinha funcionado. A primeira parte da experiência dos seus pais tinha funcionado.
Foi na noite do seu sétimo aniversário que tudo mudou e os pesadelos começaram. O quarto do lado do seu tinha estado sempre fechado a sete chaves com alguns cadeados e vários trincos, por razões que o rapaz nunca percebera mas que também nunca questionara. Nessa noite começou a ouvir baixinho, vindos desse quarto, através da parede grossa de tijolos, sons de berbequim, sons de correntes a arrastarem, sons de pequenas descargas eléctricas e o som de gritos abafados de uma criança. Foi assim nessa noite e em todas as noites que se seguiram a essa.
- O que eram aqueles barulhos todos a noite passada, mãezinha? - perguntava ele depois de cada interminável noite que passava em claro.
Ao que a mãe respondia sempre:
- Oh meu querido, é apenas a tua maravilhosa e exagerada imaginação a pregar-te partidas.
- Então todos os meninos da minha idade ouvem sons horríveis durante a noite?
- Não, meu querido. Apenas os extraordinariamente talentosos.
- Ah, boa!
E foi assim. O rapaz continuou a escrever e os pais continuaram a encorajá-lo com amor profundo. E todas as noites, o som dos gritos e do berbequim continuaram a ouvir-se e as histórias do rapazinho foram ficando mais negras e mais negras e mais negras. Foram ficando cada vez melhores, o que é normal, por causa de todo o amor e encorajamento dos pais, mas foram cada vez mais negras, o que também é natural por causa do constante som de crianças a serem torturadas.
Foi no dia em que fez 14 anos, num dia em que estava à espera de saber o resultado de um concurso literário, do qual era finalista, que um papel deslizou por baixo da porta do quarto que estava trancado. Um papel que dizia: "Eles amaram-te enquanto me torturaram durante sete anos seguidos com o único objectivo de realizarem uma experiência artística, uma experiência artística que funcionou. Tu já não escreves sobre porquinhos verdes, pois não?" O papel estava assinado "Teu irmão", e estava escrito a sangue.
Depois de ler o papel, o rapaz pegou num machado, rebentou a porta e entrou no quarto para encontrar os seus pais a sorrir para ele, sem mais ninguém. O pai dele tinha um berbequim na mão e carregava um gatilho para fazer sons; a mãe estava a fazer uns gritos abafados como se fosse uma criança em apuros; no meio deles estava um pequeno balde com sangue de porco. O pai sorriu e disse ao rapaz para espreitar para o verso do papel escrito em sangue. O rapaz obedeceu e leu no verso do papel que tinha vencido o grande prémio do concurso literário. Todos se riram muito. A segunda parte da experiência dos seus pais tinha funcionado.
Mudaram de casa logo a seguir e apesar dos sons e dos pesadelos terem terminado, os seus contos permaneceram estranhos e retorcidos, mas bons. E ele até chegou a agradecer aos pais por tudo o que lhe tinham feito. Anos mais tarde, no dia em que o seu primeiro livro foi publicado, decidiu voltar à cas da sua infância pela primeira vez desde que de lá se tinham mudado. Ele pendurou-se em pensamentos e recordações do seu quarto, a olhar para todos os desenhos e para todos os brinquedos que lá tinham ficado e depois entrou no quarto do lado do seu e também esse permanecia intacto, com os velhos e ferrugentos berbequins, correias e fios eléctricos por todo o lado e sorriu perante a insanidade de tudo aquilo.
Mas o sorriso acabou por desaparecer rapidamente quando o rapaz descobriu o cadáver de uma criança de catorze anos que tinha sido ali deixada a apodrecer, com praticamente todos os ossos partidos ou queimados, e que segurava na mão, uma história completamente coberta de sangue. E, horrorizado, o rapaz leu aquela história, uma história que só poderia ter sido escrita nas mais horríveis circunstâncias e que era a coisa mais bonita e gentil que alguma vez tinha lido, mas ainda mais grave, melhor do que qualquer coisa que ele próprio alguma vez escrevera. Ou que pudesse alguma vez vir a escrever.
Então, o rapaz queimou a história e cobriu o seu irmão outra vez, e nunca mencionou uma palavra do que tinha visto a ninguém. Nem aos seus pais, nem aosseus editores, a ninguém. A última parte da experiência dos seus pais tinha terminado".
Katurian K. Katurian

terça-feira, outubro 10, 2006

Casa da Música



Quem estiver satisfeito com o rumo da Casa da Música ponha o dedo no ar! A Casa da Música de todos e de todas as músicas; a Casa da Música democrática; a Casa da Música que prometia dessacralizar a própria música; a Casa da Música que não nos iria permitir esquecer que a música existe, que a podemos aprender e apreender e que ela pode mudar a nossa vida; a Casa da Música que recordaria diariamente a importância histórica da música no Porto; a Casa da Música das permutas do que melhor se faz no mundo; a Casa da Música que não seria apenas o edifício de um arquitecto holandês reputado, nem apenas um edifício que nos custou cem milhões de euros; a Casa da Música que não seria apenas um manual de quezílias e histórias mal contadas. A Casa da Música que nos faria planar de orgulho, alguém se lembra? Quem achar que a missão está cumprida coloque, por favor, o dedo no ar.

segunda-feira, outubro 09, 2006

World Press Photo



Tenho sempre dúvidas quanto ao facto de esta exposição contemplar as melhores fotografias do mundo; mas é inegável que é o melhor resumo concentrado de sofrimento experimentado, no caso em 2005. No Centro Cultural de Belém, em Lisboa, pela 11ª vez, até 22 de Outubro.