sábado, março 01, 2014

Empobrecer


[Investigação de Miguel Carvalho, na Visão desta semana]

Imaginemos que um presidente de Câmara ganha, números redondos, quatro mil euros por mês. Imaginemos que foi presidente de Câmara durante 16 anos. E que nunca gastou dinheiro em nada, nem sequer para comer. Tudo o que ganhou, poupou. Ao fim de 16 anos (cada a ano a 14 meses), teria auferido a módica quantia de 896 mil euros. É pouco e isso é triste, há que reconhecer. Mas estar na política é, como se sabe, empobrecer.

Mas imaginemos que um dia, na loucura, o presidente de Câmara decide comprar uma casa por meio milhão de euros. Ficariam a sobrar-lhe apenas 396 mil euros. Vamos perder a cabeça e imaginar que comprou também uma quinta, talvez em saldo, por 150 mil euros. Vá lá, e mais uns 50 mil euros em carros e motas e uma ou outra bugiganga, tudo a preço de amigo. Restar-lhe-iam apenas 196 mil euros. 

Como ninguém vive de oração, vamos humanizar o presidente e suprir-lhe necessidades básicas: comer, vestir, educar filhos, contas de manutenção. Que verba teria o presidente de Câmara para esse essencial? Dividimos 196 mil euros pelos 192 meses que perfazem os 16 anos e chegámos a um valor: mil euros!

Assim se assiste, sem dó nem piedade, ao empobrecimento de um presidente de Câmara, que durante anos, em nome da causa pública, aceita abnegadamente ser mileurista. 

Isto seria crível se eu soubesse fazer contas. E não sei. De certeza que me enganei em alguma equação ou que me escapou uma qualquer variável (poupanças, investimentos, heranças, whatever!). Mas se isto fosse mesmo assim, o único consolo que teria seria o de saber que algumas pessoas podem, aos 60 anos, decidir enriquecer. Os jovens com menos de 34 anos, não. Esses saem aos magotes para fora do país. As pessoas com mais de 45 anos que perdem o emprego, também não. Dessas, mais de metade, dizem os estudos, não voltarão ao mercado de trabalho. Mas há pessoas de 60 anos que podem começar do zero e enriquecer. Caramba, que alívio! Quem disse que este país não está melhor?

1 comentário:

  1. De facto só no nosso país é que acontecem estas coisas incríveis. Uns enriquecem enquanto a maioria emprobece.

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