sexta-feira, maio 04, 2012

Tolstoi: Senhor e servo


Vassili Andréitch permaneceu durante alguns segundos imóvel e silencioso. Depois, bruscamente, com o mesmo ar resoluto que costumava ter quando apertava a mão de um cliente ao concluir qualquer negócio vantajoso, recuou um passo, arregaçou as mangas da peliça e pôs-se, com ambas as mãos, a afastar a neve que cobria Nikita e o trenó. Afastada a neve, desapertou a pelica e, empurrando Nikita para o fundo do carro, estendeu-se sobre ele, cobrindo-o assim com a pelica e com o seu próprio corpo. Entalando as abas da pelica entre Nikita e os lados do trenó a segurando-as com os joelhos, Vassili ficou assim deitado de bruços com a cabeça apoiada na parte dianteira da carruagem. Já não sentia agora movimentos do cavalo, nem silvos da tempestade; prestava atenção apenas à respiração de Nikita. Este permaneceu a princípio imóvel durante algum tempo, depois suspirou e agitou-se suavemente.
- É assim mesmo! E dizias tu que ias morrer. Tranquiliza-te, aquece-te. Nós, cá, somos assim...
Mas com grande espanto seu, Vassili Andréitch não pôde prosseguir porque os seus olhos se lhe enchiam de lágrimas e o lábio inferior se lhe pôs a tremer convulsivamente. Deixou de falar, esforçando-se para abafar o soluço que lhe subia à garganta. "Tive um grande susto... pensou. - Estou muito enfraquecido." Entretanto, não só essa fraqueza lhe não era desagradável, como até, pelo contrário, lhe fazia sentir uma singular alegria, que nunca até então experimentara. 

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