"Quando sabemos muito pouco, é como se esse pouco não existisse. Quando sabemos muito, é como se esse muito também não existisse. Escrever é retirar da sombra aquilo que não sabemos. Escrever é isso. Não o que acontece aqui e acolá, não que eventos aconteceram aqui e acolá, mas sim o próprio aqui e acolá. É esse o lugar e o objectivo da escrita. Mas como lá chegar?
(…)
Durante vários anos tentara escrever sobre o meu pai, mas não chegara a lado nenhum, talvez porque o assunto era demasiado próximo da minha vida, e portanto nada fácil de transpor para outra forma, o que naturalmente é um requisito da literatura. É essa a sua única lei: tudo tem de se submeter à forma. Se algum dos outros elementos for mais forte do que a forma, como o estilo, o enredo, o tema, se algum deles se apoderar da forma, o resultado será pobre. É por isso que escritores com um estilo forte escrevem muitas vezes livros fracos. É também por isso que escritores com temas fortes escrevem muitas vezes livros fracos. A força do tema e do estilo deve ser destruída para que a literatura possa existir. É a essa destruição que se chama "escrever". Escrever relaciona-se mais com destruir do que com criar. Ninguém o sabia melhor do que Rimabaud.
O extraordinário nele não era o facto de se ter apercebido disso numa idade perturbadoramente precoce, mas o facto de também o ter aplicado à sua vida. Para Rimbaud, tudo se relacionada com a liberdade, tanto na escrita como na vida, e era por a liberdade estar acima de tudo que ele podia deixar a escrita para trás, porque também ela se tornou para ele um limite que tinha de ser destruído.
A liberdade é igual a destruição acrescida de movimento."
[Só não é angustiante terminar este livro, porque ele é apenas o primeiro de seis volumes. E o segundo chega já em Maio. Karl Ove é norueguês e é a confirmação de que a literatura nórdica começa a competir com a literatura russa, a melhor de todas.]
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