terça-feira, janeiro 22, 2008

O Bolhão na Assembleia Municipal


Há vacinas contra quase tudo; dificilmente alguém conseguirá inventar uma para evitar o curso que sempre segue a Assembleia Municipal do Porto. Teria que ser inventada uma vacina contra a estupidez e a Ciência, infelizmente, nunca irá tão longe.

Ontem, o tema era o Bolhão. Mas nem importa o assunto; importa quem o discute. Ou quem finge que o discute. Não importa porque os cidadãos são sempre o mais importante (claro, claro, é para isso que eles lá estão, que lá estamos). Mas são os cidadãos quem menos falam. Aguentam ali, estoicamente, três, quatro horas (às vezes mais), a assistir àquele desfile de vaidades, de egos mal amanhados, discursos vazios de deputados que, na sua esmagadora maioria, são incapazes de conjugar dois tempos verbais de forma correcta (que raio, é assim tão difícil?). Aliás, diria que em nenhum outro local a Língua Portuguesa é tão mal tratada. Mas eles, cheios de si e dos seus fatitos adornados com gravata, pedem e pedem e pedem para falar. Para - como disse Rui Rio e bem - discutir o sexo dos anjos. Mas não há quem os pare. Chega a parecer uma sessão de terapia.

Além dos habitués, como Manuel Monteiro (PSD), espécie de Mr. Bean, só que com menos piada e mais paleio (caso digno do Guiness na modalidade: 'Quem acha mais piada a si próprio'), há os novatos, imberbes que da política só conhecem o desejo de ascender através dela. De vez em quando aparecem. Inchados. E é preciso – juro! – colocar o cinto de segurança. Dois exemplos à Direita (da próxima vez, falo da Esquerda): Paulo Dias (PSD), com aquela voz de garganta inflamada (mais ou menos como quando tentamos falar com um caramelo colado ao céu da boca) a fazer pausas acertadas (não assertivas) como se estivesse a fazer stand-up e, por isso, a dar espaço para as reacções do público, e acentuar as frases no final à la Professor Marcelo, é desastroso. Sobra-lhe em pose (pose que, apesar de tudo, não chega a ser suficiente para perder o ar de rapaz da escola) o que lhe falta em conhecimento. Chega a ser embaraçoso (estou a especular, mas especulo com esperança) para quem está na bancada do Executivo. Porque eles querem sublinhar as ideias do seu partido, defendê-las, mas não fazem a mínima ideia, tantas vezes, demasiadas vezes, do que estão a dizer. Perfil onde, aliás, encaixa, também, na perfeição, Miguel Barbosa (PP). Coitado, o rapaz lá tentou duas ou três vezes começar a frase à la Gato Fedorento: “Dizem que temos uma espécie de Oposição…” e tal…. Mas além de não ter tido particular piada, enterrou-se em ignorância até ao pescoço ao dizer que o Bolhão é obsoleto (um rapaz centrista devia ser um bocadinho mais culto, mais viajado, mais informado…) e que o que os comerciantes querem mesmo é dinheiro. Que dessa forma lá se calariam e esqueceriam o que o local tem de emblemático ou lá o que os move. Que para ele tanto faz.

Os três senhores partilham um interessante denominador comum: todos quem ter piada. Terão sido eles a enganar-se no local ou eu? Ou as pessoas que esperam horas a fio para em 30 minutos divididos por meia dúzia, ou mais, poderem expor – não resolver – os seus problemas?

Depois, há Aguiar-Branco. José Pedro Aguiar-Branco (PSD). O homem do cronómetro e do martelo. Que dá e tira o tempo e decide o que é, ou não, insultuoso. Ontem, o presidente da AM decidiu que meandro – sim, eu disse meandro – é um insulto. E que o senhor em questão, comerciante do Bolhão, estava proibido de o repetir. Confesso que ouvi aquilo e pensei: Será que também este quer ter piada? Mas não, queria mesmo dizer o que estava a dizer. Que "meandro", cujo significado é enredo, intriga, é um insulto. E o homem, o outro, ali, inseguro na sua escolaridade, a pedir desculpa a tremer, a suar, a abreviar o protesto. Nada de novo. A política actual - longe de ser só esta, desta autarquia - é isto.


P.S.: Há muito tempo que tenho vontade de revelar os bonecos – literalmente, bonecos - que cada vereador e cada deputado me faz lembrar de cada vez que os vejo ali. Hoje, revelo apenas dois. E nem sequer é porque tenham sido relevantes para a discussão. Não foram. Nunca são. A diferença é que às vezes falam. Nem sequer foi o caso. Mas hoje apetece-me dizer quem vejo quando os vejo.

Matilde Alves, a vereadora da Acção Social, é a Barbie. A única boneca que nunca teve direito a pilhas, a uma evolução tecnológica qualquer que a fizesse ser mais do que um objecto de decoração dela própria. Que nunca teve a direito a mudar de expressão; só de baton.
Gonçalo Gonçalves, vereador da Cultura, é Humpty Dumpty, aquele ovo inventado por Lewis Carroll (a da Alice no País das Maravilhas) que tentava a todo o custo equilibrar-se em cima do muro. Que enrola as palavras, mas não domina os seus significados, tentando com isso enrolar os interlocutores. "Humpty Dumpty argumenta com Alice que as palavras significam exactamente aquilo que ele "quer que elas signifiquem", por isso importa saber quem manda para que se decida qual o significado que as palavras irão ter.

Ontem, durante quatro horas, ambos pareceram dois bonecos numa prateleira da Toys’r’Us, lado a lado, inertes, inúteis, desumanos.

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