terça-feira, maio 06, 2008

My Blueberry Nights


Wong Kar-way filma o amor. E a tradução dos títulos dos filmes, pelo menos em Portugal, está sempre a sublinhá-lo. "In the mood for love" (2000) - no original é canção de Bryan Ferry -, é "Amor à flor da pele"; o futurista "2046" (2004) é "Os segredos do amor"; e agora "My blueberry nigths" (2007) é "O sabor do amor". Já antes, "Chungkink Express" foi traduzido algures como "Amores Expressos". E seria possível fazer rewind até ao início, filme-a-filme, encontrando em todos esse denominador comum.
No entanto, o cineasta asiático, que nunca fecha os filmes, que se nos deixa entrar nunca nos deixa sair do seu universo, decidiu desenhar My Blueberry Nights a papel milimétrico. Tudo acontece na hora e lugar exactos. Nada falha. Pela primeira vez, tudo parece fácil, tangível. É o menos melancólico dos filmes que assina. E, apesar disso, mantém a beleza de todos os outros, se não mais. Beleza plástica. A fotografia, as cores, os planos são completamente arrebatadores.
De resto, a ideia de sempre está lá, mas desta vez, só em intenção: a distância, a impossibilidade, as pessoas que viajam sempre até não haver mais para onde viajar, as pessoas que se conhecem assim do nada. E que se perdem antes de se terem. As saudades das pessoas que nunca sabemos se voltaremos a ver. Um dia. O amor, claro.
Mas eu preferia que o beijo abrisse o filme em vez de o fechar. Que fosse realmente roubado e, por isso, sem continuidade. Que resultasse de uma espécie de engano ou de uma espécie de verdade que só existe inteira no momento em que acontece. Que a rapariga do coração partido (Norah Jones, suficientemente rústica) e o rapaz atrás do balcão do café, (Jude Law sempre a fazer dele próprio), também ele abandonado, nunca encetassem a história que até poderia ser de amor, mas não era. Porque o amor não é, como ali parece, o encosto de duas solidões.
Preferia que tivesse havido maior tensão quando a namorada russa de Law reaparece só porque sim. Quando o pai de Natalie Portman (fabulosa, fabulosa!) morre. E quando, naquela que é a melhor história das micro histórias todas, o dilacerado polícia alcoólico (David Strathairn), também ele abandonado pela mulher um par de anos mais nova (Rachel Weisz), sucumbe. Nenhuma das relações é suficientemente densa, realmente convincente, mesmo que todos os personagens, individualmente, funcionem.

Talvez se tudo ficasse mais longe do happy end, ficasse mais perto de Wong Kar-way. Talvez a chave do filme pudesse estar na frase dita por Jude Law: "Mesmo que se possua a chave, isso não significa que o que procuramos esteja dentro da porta que conseguimos abrir".

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