Aparentemente, qualquer um poderá executar a partitura de John Cage e tocar a sua faixa 4'33. Mas se for Pedro Burmester a tocá-la, soará diferente. Porventura, soará hoje, no Palácio da Bolsa, no Porto, às 22 horas, como deverá soar. Simplesmente, porque não há música contida nessa partitura. Há apenas silêncio. Literalmente, quatro minutos e trinta e três segundos de silêncio.
A peça "composta" em 1952, consiste numa única instrução destinada ao executante: cumpri-la é não a tocar. Tocando-a. Porque, defendeu o pioneiro da "indeterminação", "tudo o que fazemos é música". E se aí reside a genialidade do compositor americano do século XX, falecido em 1992, semelhante genialidade caberá ao pianista Pedro Burmester. Não porque seja capaz de manter-se inerte diante do piano. Mas porque tendo prometido, no rescaldo de todas as controvérsias que envolveram a Casa da Música, de que é actualmente director artístico, não voltar a tocar no Porto enquanto Rui Rio fosse presidente de Câmara, será capaz de o cumprir, não o cumprindo.
Burmester associa-se à cidade, à celebração do Porto Património Mundial, ao evento apartidário, mas não retira veracidade à afirmação proferida em 2004. No entanto, em 4'33 – gesto criativo considerado absolutamente inovador –, não há só silêncio. Originalmente, a peça pretendeu questionar a própria música enquanto conceito, dirigindo a nossa atenção para o contexto em que a música existe e para a forma como a ouvimos. O pianista – num gesto que há-de ser recordado como provocação – não deverá querer questionar a música. Sobra o contexto em que será ouvida. Ouça quem quiser. O que souber.
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