Começou a esquecê-lo no momento em que ele a deixou na estação de comboio, ao fim da tarde. Ainda mais de trinta graus e ela já subitamente cheia de frio, o coração irremediavelmente estilhaçado, as mãos a tremer como se tivesse parkinson. Uma espécie de choque térmico, mas por dentro. Ela toda ali a desabar num banco, que nem sequer era de jardim - não que ser de jardim atenuasse alguma coisa... Um banco de onde se via uma placa a dizer: Partidas. Estava ali prestes a partir partida. Aprendizagem difícil esquecer alguém. Não vem nos livros, não é lição que Coimbra possa ensinar, não há em lado nenhum nada escrito que se possa decorar e depois aplicar. Molhou dois cigarros antes de entrar na carruagem 23, lugar 118, enquanto apagava todos os vestígios dele no telemóvel, mais de cem mensagens, quase todas sabidas de cor à força de tanto as ter lido. Molhou o primeiro cigarro, desistiu dele. Acendeu o segundo, nada a fazer, teve que desistir também. Ele não sabe, não fuma, mas fumar cigarros húmidos não dá prazer nenhum. O corpo, o dela, ainda a cheirar ao dele, apesar do banho de água quase fria. E, no entanto, uma solidão como nunca tinha experimentado na vida. A garganta incapaz de engolir sem arder, como se estivesse inflamada. É como se ele tivesse sido a corrente de ar dela e ela tivesse ficado constipada. Estava ali quase capaz de pedir um abraço, como quem pede lume, ao primeiro estranho que se sentasse ao seu lado no banco. Um abraço lento, apertado, quentinho. Um abraço-casaco. Mas ninguém arriscou sentar-se ali.
quarta-feira, outubro 21, 2009
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