domingo, julho 29, 2007

Cuba: a fuga de Ernesto

[Foto: Jordi Burch]
Às vezes, há imagens assim, que deixam o corpo a crepitar por dentro, quase a fazer doer sem magoar. Que contam, sozinhas, uma história inteira através de um olhar que não é nosso, mas que o nosso coração grava para sempre, quase como se só ali pudesse ficar o que as mãos não podem guardar. É-me quase sempre difícil reprimir a exclamação diante das fotografias de Jordi Burch, o "menino dos olhos mágicos".
Às vezes, há textos maiores do que as palavras. Textos onde não é possível contabilizar as emoções, os sobressaltos, os arrebatamentos, a ternura. A primeira vez que li, a fungar, uma reportagem de Ana Sofia Fonseca, estava ela no Peru a relatar com invulgar perícia o trabalho infantil. Ontem, a torneira voltou a pingar com a raiva e a tentativa de Ernesto para libertar-se das amarras de Cuba. No Expresso.
Às vezes, é difícil escolher o destino de férias. Este ano, havia três opções: um insondável apelo vindo de África, a excitação de cumprir o que resta da Route 66 e, claro, a pressão de cheirar Cuba antes da morte de Fidel Castro. Acaba de ganhar Cuba.

quarta-feira, julho 25, 2007

Aimee Mann

22.47 horas. Antena 3 a recordar a todos os que não estão em Lisboa, que estão a perder o concerto de Aimee Mann, no Coliseu. Apetece-me chorar. Aparentemente, tudo indica que este ano, é o ano de todas as perdas musicais.
Its not what you thought
When you first began it
You got what you want
Now you can hardly stand it though
By now you know its not
Going to stop
Its not going to stop
Its not going to stop
til you wise up
Youre sure theres a cure
And you have finally found it
You think one drink
Will shrink you til
Youre underground and living down
But its not going to stop
Its not going to stop
Its not going to stop
til you wise up
Prepare a list of what you need
Before you sign away the deed
couse its not going to stop
Its not going to stop
Its not going to stop
til you wise up
No its not going to stop
til you wise up
Now its not going to stop
So just give up

sábado, julho 21, 2007

As Pontes de Madison County

É o filme da vida dele. E a ficção sonhada da vida dela. Como Michael Cashmore é o homem que ambos ouviram em repeat até à exaustão. Agora, estão os dois em "Doe Eyes". Foi ele quem pediu ao carteiro para lho entregar. Depressa e de bicicleta. [Carteiro de fim-de-semana a entregar pautas de amor? Há alguma coisa melhor?] Ela reconheceu logo o tema do filme. E já não conseguiu sair dali, daquele presente de açucar. Supostamente, só se haviam visto uma vez na vida. Duas, acrescentou ele. Há uma fotografia para o provar. De um tempo distante em que se viram se sem verem. Em que tropeçaram um no outro, sem que tenham sido atropelados um pelo outro. Quem quer saber das coincidências?!...

sexta-feira, julho 20, 2007

Ricardo Araújo Pereira


"A drª. Odete Santos dançou um tango e eu disse que era um privilégio raro podermos ver um deputado a suar. Fui admoestado, evidentemente. A piada era um pouco demagógica, e sabemos todos como os políticos detestam demagogia. Estava mesmo convencido de que era uma piada inocente e banal, mas afinal tratava-se de uma generalização perigosa para a democracia – e até, suponho, para a própria Humanidade. Mas, duas ou três semanas antes, 119 dos 230 deputados tinham faltado à Assembleia da República, antecipando a ponte da Páscoa e inviabilizando as votações por falta de quórum. Se os senhores deputados não gostam de generalizações, não deviam faltar generalizadamente."
Ricardo Araújo Pereira, Farpas JN

Paulo Cunha e Silva

"Há falta de imaginação no Porto para o que quer que seja. É uma cidade com o cérebro sequestrado. Sofreu uma lobotomia e parece que ninguém deu por nada. Não gosto da ideia de cargo, é muito pesada.
Paulo Cunha e Silva, Farpas JN

quinta-feira, julho 19, 2007

Eutanásia

[Foto: Nelson D'Aires]

Estavam ligados um ao outro como o coração de um velho ligado por fios e tubos a uma máquina que, artificialmente, lhe prolongava a vida. Podiam sobreviver assim mais um ano, dois, dez, acreditando que não há relações sem dependência, e nem sentir qualquer espécie de dor. Mas sabiam, também, embora não quisessem saber, que não sentiriam nunca o imenso resto que só pode existir fora do que é passível de ser manipulado. Há eutanásia para o amor?

Guillemots no Sudoeste


Todos os anos faço a mesma promessa: "desta vez, não vou ao Sudoeste". Acabo sempre por ir; acabo sempre por me queixar, mesmo quando vale a pena, por uma ou outra razão. Este ano não vou mesmo. Não vou estar cá. E só me apetece gritar!! Alguém disse que é castigo, e é bem possível que seja. Os Guillemots actuam no último dia da 11ª edição do festival e eu não vou estar lá para ver!!! Os James vão devolver a adolescência a quem agora se aproxima perigosamente dos 30 anos e eu não vou ser abrangida pelo flashback! Não é justo!!! Alguém pode trazer cá os Guillemots outra vez? Por favor?

quarta-feira, julho 18, 2007

La Palisse


Tratou-a por menina e por princesa. Por virgem de Botticelli e, de vez em quando, na terceira pessoa. Mas no fim repetiu sempre a mesma frase: "Não se deixe enganar: os únicos amores eternos são os impossíveis."

terça-feira, julho 17, 2007

João Pereira Coutinho



"A ‘Folha’ paga melhor. Quando o ‘Expresso’ subir a parada, começo a elogiar Portugal e os portugueses semana sim, semana sim."

João Pereira Coutinho, Farpas JN

segunda-feira, julho 16, 2007

José Miguel Júdice

"Os portugueses são uns vidrinhos. Eu fui vítima dos vidrecos. Portanto, estou sempre do lado daqueles que têm processos disciplinares por razões que têm a ver com a forma como falam ou deixam de falar."
José Miguel Júdice, Farpas JN

domingo, julho 15, 2007

Eleições intercalares de Lisboa

Claramente, a avaliar pela abstenção (62%), mas não só, ninguém estava interessado na eleições intercalares de Lisboa. Ninguém, a não ser os aparelhos dos partidos. A derrocada, sobretudo à Direita, não podia ter sido mais evidente. E mais catastrófica. Marques Mendes viu-se obrigado a convocar eleições antecipadas - e Menezes já deve estar a afiar os dentes; Paulo Portas, que acabou de chegar do exílio, lá ameaça mergulhar outra vez num período de reflexão; e Manuel Monteiro, o único a desconhecer que já morreu há muito tempo, ficou abaixo do próprio Bloco de Esquerda. Carmona Rodrigues continua a ser o bobo da corte. Foi escolhido por Mendes há dois anos, que depois o deixou cair, e agora acena-lhe com um segundo lugar. Soube-lhe a vitória. Inevitavemente, claro!

Aparentemente, o cenário volta a sorrir à Esquerda. O PS, que dificilmente conseguirá fazer alguma coisa que se veja em dois anos, mas também não terá tempo para chatear as hostes, não ganhou propriamente a Câmara de Lisboa. Ganhou, num percurso cumprido de forma inédita ao contrário, o que até agora não tinha: um candidato às eleições presidenciais. Não às próximas (2011), que voltarão a ser ganhas por Cavaco quando Costa estiver em velocidade de cruzeiro ao leme do segundo mandato em Lisboa. Mas às de 2016. Parece ainda um tempo muito distante, mas é já ali ao virar da esquina. O povo estará já cansado do governo socialista, Sócrates será alvo de chacota e de coisas piores, como é agora Guterres (a menos que emigre para a capa da Time), mas não será suficiente para beliscar as eleições.

Miguel Sousa Tavares


"Já tive algumas fãs psicopatas. Sim, mulheres. Tipo, aquele filme horrível, 'Atracção fatal'. Perseguiam-me de automóvel, faziam-me esperas nos sítios mais inesperados, às horas mais incríveis. Uma coisa tenebrosa."
Miguel Sousa Tavares, Farpas JN

terça-feira, julho 10, 2007

Bjork

i miss you
but i haven't met you yet
so special
but it hasn't happened yet
you are gorgeous
but i haven't met you yet
i remember
but it hasn't happened yet

and if you believe in dreams
or what is more important
that a dream can come true
i will meet you

i was peaking
but it hasn't happened yet
i haven't been given my best souvenir
i miss you
but i haven't met you yet
i know your habits
but wouldn't recognize you yet

and if you believe in dreams
or what is more important
that a dream can come true
i will meet you

i'm so impatient
i can't stand the wait
when will i get my cuddle?
who are you?
i know by now that you'll arrive
by the time i stop waiting

i miss you

domingo, julho 08, 2007

Da minha janela

Não há manuais de tolerância, livrinhos que nos ensinem a sermos melhores. Infelizmente. Porque a tolerância é um sinal de inteligência. Eu sou intolerante. Intolerante num grau muito perto do insuportável. Ontem, voltei a perceber isso. Nada de que me orgulhe; nada de novo. Não tenho a mais leve paciência para a sete maravilhas de Portugal (quase todas abaixo do Mondego - brilhante!); para a sete maravilhas do mundo (era possível serem mais previsíveis?); para o número 7 que quero lá saber o que quer dizer; ou para o concerto Life Earth que ocorreu em simultâneo em não sei quantas capitais.
As minhas sete maravilhas, vejo-as todas da janela do meu quarto. Como dizia Pessoa, "do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é. (E se soubessem quem é, o que saberiam?). Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres. Com a morte a por humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens. Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada."

sábado, julho 07, 2007

Críticos de teatro


Não tenho a certeza de que "Ricardo II", de Shakespeare, em cena até amanhã no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, seja a melhor encenação de Nuno Cardoso. Mas tenho a certeza de que nele - e nunca perdi uma peça -, o que não é superlativo continua a ser muito bom. Melhor do que a maioria, definitivamente. De tal forma, que a comparação entre o trabalho dele e o que se assina no resto do tecido teatral português será profundamente injusta. São campeonatos diferentes.
No entanto, há qualquer coisa de vagamente suspeito nos críticos de teatro, que parecem encarar alguns criadores como equipas de futebol. Sendo impossível gostar do Benfica e do Sporting ao mesmo tempo, ficamos claramente sem perceber o que os motiva, para além da peça, a escrever o que escrevem. Mas ficamos com a clara sensação de que não é, apenas, o objecto da avaliação. Será uma qualquer espécie de 'clubite' que escapa à maioria? Guerras pessoais?
Para Rui Pina Coelho, do Público, o encenador "cria algumas cenas e imagens magníficas" (...) transformando Ricardo II "num espectáculo forte no um-para-um e com um grande poder de drible. Remata bem com os dois pés e tem um bom poder de elevação - golo de Cardoso." Helena Osório, no Jornal de Letras, subscreve a ideia.
Pelo contrário, para Miguel Pedro Quadrio, do DN, a peça "é um jogo equívoco e falhado", onde "os figurinos futebolísticos são duma ironia exuberantemente pop, tão desnecessária quanto óbvia" e os actores "mais parecem rapazolas num recreio escolar." João Carneiro, no Expresso, segue-lhe as pisadas. "A elementaridade dos conceitos de encenação redimensionam a peça no sentido não exactamente da insignificância mas de uma lamentável banalidade." E o título? "Com as mãos sujas", nomeia o crítico. Para quem é o recado?
PS.: R2, ensaio sobre o ensaio de Shakespeare, com 14 rapazes e raparigas dos bairros do Zambujal e da Cova da Moura, que também termina amanhã, é um exercício absolutamente notável e comovente.

sexta-feira, julho 06, 2007

George Orwell


"Em época de mentiras universais, dizer a verdade é um acto revolucionário."

quinta-feira, julho 05, 2007

Runaway train

Varre o pó das estrelas quando bateres a porta. Cala, afasta o gato. Fecha a janela. Corre a cortina. Tapa a lua. Esconde o céu. Fala baixinho. Faz de conta. Não sorrias para não doer. Sedução hirta. As horas. Inverno inteiro de espera. Apaga o fogo antes de saíres. Dobra o corpo suado como um casaco. Cansado. Acende outro cigarro. Testa o colo. Enche o copo. Queima. É inesperado? Desliga a música, mesmo que seja Chopin. Embrulha o segredo. Alucina. Amortece o medo. Venda os olhos. Usa as mãos. Guarda o abraço no bolso de trás das calças. Recolhe o mel do sono. Amanhece sem nunca ter anoitecido. Cuidado com o que vais escrever. Deixa a câmara a gravar. Não vale chorar. Vale mentir? Rasga o mapa. Anestesia a memória. A pista é a rua. A dança o destino. Depressa. Escorrega no veludo da parede. Não há duas histórias iguais. Nem fadas na mesma paragem. Despe a noite, mas não corras. Quanto tempo falta? Se chover não faz mal. O nó já ninguém solta. Amanhã já ninguém lembra. Não há espaço. Vielas córneas entupidas. Falidas? A beleza não é um posto. Porto de abrigo. Procura debaixo da pele. Ouves o incenso a roer o chão? O odor pode enganar. Outro lanço de escadas. Desce devagar. Estranhos como antes. Londres a 25 euros. Ausentes como sempre. Não digas nada. Não olhes para trás. Táxi!

quarta-feira, julho 04, 2007

Arcade Fire


Não é Paredes de Coura. Não há um anfiteatro natural, relva à volta do altar, o rio ao fundo, o céu estrelado acima da cabeça, os amigos de sempre. E também não há aquele sopro frio de Verão que existe no Minho em Agosto. Mas os Arcade Fire voltaram a trazer com eles o cenário. A magia. E o resto. Encheram o Super Bock Super Rock. E pararam Lisboa. Memorável.
"Música rock emotiva, ordenada por entre o caos por nove músicos que empunham múltiplos instrumentos e trocam de posições entre si, com capacidade para ser compartilhada por uma multidão, sem perder integridade", escreve hoje, no Público, Victor Belanciano. Foi mais ou menos isso que aconteceu, ontem, no Parque Tejo. Contagiante.
"Black Mirror" a abrir; "Wake up" a fechar. Hora e meia de puro deleite com Win Butler e Régine Chassagne ao rubro. Imparáveis. Mesmo quem queria mais "Funeral" e menos "Neon Bible", não permitiu que o concerto descesse da apoteose permanente. Vinte mil, braços no ar, a trautear de cor, a prolongar os separadores das músicas. O fim de cada canção foi sempre prolongado pelo público com uma espécie de coro instrumental até à canção seguinte. Emoção colectiva.
Não houve encore. Um único. E quem esperava um daqueles momentos em que a banda canadiana faz incursões por outras paragens, como pelos Clash, também não teve sorte. Perfeito.