sábado, abril 29, 2006

Moonspell



Até poderiam ser mais, mas o número anunciado foi 666. 666 almas em transe durante quase duas horas no Hard Club, em Gaia, a assistir ao início da tournée dos Moonspell, banda nacional de heavy metal a apresentar o seu sétimo álbum, "Memorial". E eu lá no meio, em transe com o transe dos outros, a perguntar-me o que estava ali a fazer e depois timidamente rendida ao palco-altar diante do qual as almas citavam de cor, qual oração, a poesia de Fernando Pessoa.

Uma nuvem negra no chão de cabeças sincronizadíssimas como um baloiço para a frente e para trás, os braços erguidos ao deus-vocalista Fernando Ribeiro, que lhes dizia que sim, que eles são os maiores e que só por eles alteraram o alinhamento, que hão-de voltar a encontrar-se noutros palcos, noutros altares. E eles, os braços, a exibir códigos de rituais que só eles saberão, o peito e as mãos abertas a acolher as dádivas que perpetuarão na memória o momento: as baquetas do baterista, as punheiras deste, a t-shirt do outro. E no fim de tudo, da batalha musical repercutida com a força de uma bola de fogo disparada a toda a velocidade contra os corpos, eles saem, ordeiros, e deixam-se arder, talvez por dentro, em combustão lenta.

(Os amigos-amigos-mesmo não têm medo de nos levar; os amigos-amigos-mesmo fazem com que não tenhamos medo de ir; apresentam-nos ao inóspito de que julgamos não gostar só porque desconhecemos e enriquecem-nos.)

sexta-feira, abril 28, 2006

Scolari


Nunca o respeitei, mesmo quando me fez andar por aí aos saltos durante o Euro 2004. Raramente respeitei as equipas que escolheu há dois anos e nunca o perdoei por não ter escolhido o Vitor Baía. Hoje, foi a última gota. Não há nada pior do que as declarações de um treinador com medo de poder vir a não ser treinador de ninguém.

quinta-feira, abril 27, 2006

Spiralling



Se soubesse colocar som neste blogue, hoje partilharia Spiralling do álbum "I'm a bird now" de Antony and the Johnsons. Como não sei (e o Germano não me quis ensinar), aqui fica a letra. Importam-se de trazer cá o homem outra vez?


Well and I can and I die
I can, I die

Well and I'm freezing
I'm freezing

Well it's a sly curse
A sly curse

Well and I'm spiralling
I'm spiralling

In the broken heart game
I've got all my files

I've got all my ones to choose from
I gave waiting for you
Waiting for you

I'm ravage like a dog in heat
I'm gone, gone
???
I am, I'm undone
I am undone

Where go, where now
I can't standIf I can,
I can die
I'm freezingI
t's like us
I'm spiralling

In my cruel life God poisoned
I was born old
Not a girl and not a jewel
I am, I am some son
I am some bum

Where go, where now
I can't stand
If I can, I can die
I'm freezing
It's like us
I'm spiralling

quarta-feira, abril 26, 2006

A eternidade por 1500 euros

Em Rio Tinto discutem-se os direitos de ocupação do cemitério. A Junta de Freguesia oferece duas alternativas: sete anos com uma taxa de 35 euros renovável por duas vezes ou 1500 euros para alcançar a eternidade. Será o preço-privilégio para quem quer ter num terreno há muito lotado a morada eterna. Quem não tem dinheiro revolta-se. Acha que é uma perseguição aos pobres. Em Portugal, a casa dos mortos é tão importante como a casa dos vivos. As flores têm que estar frescas e viçosas; os afectos tanto faz. O cemitério está inundado de mulheres contratadas para tratar das campas dos outros.
O coveiro, que enterrou milhares de pessoas durante trinta anos e também a mulher, ri. Diz que ri para não dizer tudo o que já viu. E sentiu na pele desde que enviuvou. "Nunca um filho me enviou um tostão para comprar uma flor para a mãe", diz a apontar as mãos ao céu. Hoje é a mulher que lava as sepulturas dos outros que toma conta dele e dos seus 78 anos. Não se queixa. Construíu a casa, avaliada em 25 mil contos, com as gorjetas que ganhou nos funerais e assegura que tem muito mais do que 300 contos amealhados. Só não tem a mulher. Fica ali com a outra, os dois sentados nas escadas do cemitério a recordar os que partiram: os que pediram para ser sepultados na extremidade mais próxima de um café para poderem continuar a pedir copos ao empregado; os que imploraram para não ser enterrados no cemitério onde se dizia que andava o diabo; os que foram apanhados desprevenidos e novos demais. O coveiro continua a rir. Já não enterra mortos. "Cansei-me". Mas continua a vesti-los. "Medo?", volta a rir. "Medo é dos vivos e mesmo desses..."

terça-feira, abril 25, 2006

Nojo televisivo

Assisti à entrevista de Carlos Silvino (Bibi), no Jornal Nacional, na TVI, com o computador no colo. Curiosa com o discurso, queria ir escrevendo umas notas, segura de que também eu haveria de ser um desses milhares de portugueses que têm sempre uma laracha a acrescentar a qualquer assunto. Mas ao fim dos primeiros minutos fiquei estarrecida. De certa forma, acho que ainda estou. E só me ocorre dizer que foi um momento de puro nojo televisivo. E o que é pior, de puro nojo jornalístico. Puro nojo!!!

segunda-feira, abril 24, 2006

Amanhã


Amanhã já terá passado mais um dia. Catorze meses, oito dias e quantas horas? Contabilizo todas as vezes em que a dor me entrou nas veias como um soro letal. Todas as vezes que julguei que ficaria para sempre embrulhada no sangue a percorrer o corpo, contaminando impiedosamente todos os órgãos, enfranquecendo-os. Ou todas as vezes que sobrevivi e da dor nem a memória retalhada sobrou. Empurro para esse lugar que apaguei esta dor que insiste. Penso, amanhã já terá passado mais um dia. E a mancha negra começará a diminuir, a formar um ponto fino de luz até tornar-se invisível. Há quanto tempo faço este exercício? Há quanto tempo não acontece nada?

domingo, abril 23, 2006

CAMPEÕES


Palavras para quê?! Ganhamos outro campeonato e pronto!

sábado, abril 15, 2006

"Milagre de sábado à tarde"

Cumprimos o café prometido depois de um pingue-pongue obsessivo em que os pontos pareciam chegar sob a forma de mensagens. Quis chegar mais cedo, não sei porquê. Tu, pelos vistos, também. Enquanto esperei, pouco, quase nada, concluí que a expressão "tomar café" é uma das mais prodigiosas invenções da civilização. "Temos que tomar café", diz-se quando se quer despachar alguém para um dia sem data. "Temos que tomar café", diz-se quando se quer realmente estar com alguém a quem não conseguimos simplesmente dizer "quero estar contigo". Nenhum de nós sabia em qual das duas gavetas estava colocado. Demoramos três horas e quarenta e cinco minutos a "tomar café".

quarta-feira, abril 12, 2006

Importa-se de repetir?

"A Casa da Música não irá celebrar o primeiro aniversário com programação especial porque é Páscoa. E na Páscoa as pessoas têm outros hábitos culturais que não passam por assistir a concertos."
Paulo Sarmento e Cunha, Comissão Liquidatária da Casa da Música

segunda-feira, abril 10, 2006

Casa da Música soma e não segue



Soma, não segue e cansa.

Soma orçamento: já vai em 111,9 milhões de euros, incluindo os 2,5 milhões aprovados esta semana, supostamente para terminar a empreitada. É uma maneira de colocar as coisas. A verdade - e é só um exemplo -, é que a sala de baby-sitting está finalizada há algum tempo e não é funcional. Ou seja, haverá ajustes na Casa antes sequer de celebrar o primeiro aniversário.

Não segue: Não segue para fora do país; não sei sequer se anda a seguir para fora do Porto. Não há publicidade, não há marketing, não há programação que a distinga, não há quase nada. E se há, não se vê.

E cansa: cansa estar sempre a voltar à estaca zero. Cansa que nunca ninguém dê a voz e a cara pela Casa. Cansa o permanente "segredo de Estado" em que parece estar sempre mergulhada.

Asterisco


Estrela Serrano é uma senhora. E o que vou dizer é só um asterisco. Mas sendo só um asterisco tem que ser dito. Porque até as maiores senhoras têm direito aos seus deslizes, mas os deslizes não deixam de o ser por provirem de senhoras grandes.
Estrela Serrano esteve hoje na Universidade do Minho a convite do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade e do Projecto Mediascópio numa conferência sobre "a nova entidade reguladora no quadro das políticas de comunicação em Portugal". A ex-provedora do Diário de Notícias integra a Entidade Reguladora da Comunicação Social (sucessora da AACS) e participou no painel da tarde sobre a "Regulação, Auto-regulação e Empresas Mediáticas" ao qual não pude assistir. No entanto, de manhã, na ausência de Azeredo Lopes, presidente da dita entidade, representou-o para supostamente falar da passagem da AACS à ERC. Não teria havido problema (pelo contrário) se tivesse efectivamente falado. Porém, a sua intervenção foi mais ou menos isto: "O conselho regulador ainda não tomou posse. Estamos num quadro de alguma precariedade em termos legais - numa fase de instalação, estudo e reflexão, pelo que não posso dizer nada".
Se não pode dizer nada porque é integrou o painel?! Não é por maldade, mas foi mesmo ridículo!

P.S.: Vale sempre a pena ouvir o professor Moisés Martins que, já agora, é candidato à eleição para o cargo de Reitor da Universidade do Minho. E vale sempre a pena lê-lo. Enquanto durar a campanha, pode ser aqui.

sábado, abril 08, 2006

Sporting 0 - Porto 1


Vi o jogo no meio de seis sportinguistas. Há algum tempo que uma vitória não me sabia tão bem.

sexta-feira, abril 07, 2006

Basic Instinct II


Avisos à navegação: Se é pela pura expectativa do sexo é preferível ver "Uma história de violência", de David Cronemberg. Se é pela genuína vontade de assistir a um thriller, de completar o travo deixado por "Instinto Fatal I" ou de constatar que as mulheres de 40 e tal anos "sem plásticas" são enxutíssimas, desenganem-se.
"Instinto Fatal II" é completamente desprovido de sensualidade, de sexualidade, de tensão, de suspense, de credibilidade, de decente direcção de actores, de argumento, até de figurinos. São mais de duas horas de tédio absoluto que expõem Sharon Stone ao ridículo. Primeiro, porque ao fazer questão em exibir o corpo todo, exibe também o que negou sempre: as plásticas, o silicone, os ajustamentos. Segundo, porque nunca a sua prestação enquanto actriz foi tão pobre. E nunca um filme reuniu tantos actores tão maus.

terça-feira, abril 04, 2006

Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI)

Estive a fazer contas: uma pessoa que compre uma casa aos 20 anos e tenha a sorte de viver 80 anos, acaba por pagar quase uma casa e meia - uma casa inteira ao proprietário; meia casa à Câmara. Se pensarmos que o banco nos leva, em juros, cerca de um terço do valor da casa, no fim da vida pagamos praticamente duas casas. Se considerarmos ainda que, quem vier a seguir, há-de continuar a pagar o raio do IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis), ao fim de algum tempo (não consegui prolongar as contas) a casa custou mais do dobro do preço inicial. Ou seja, nunca chegamos a ser verdadeiramente proprietários de nada. Somos sempre inquilinos da autarquia.